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"Celular é arma de defesa e ataque contra democracia", diz autora

Em novo livro, jornalista Neuza Sanches discute o impacto dos dispositivos móveis na política

4 jul 2022 - 05h10
(atualizado às 07h27)
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Neuza Sanches discute o impacto do smartphone na democracia 
Neuza Sanches discute o impacto do smartphone na democracia
Foto: Divulgação / Estadão

As imagens capturadas e compartilhadas por dispositivos móveis pautaram o debate e os rumos da política global nos últimos anos. Os exemplos de evento são variados, desde os registros de hospitais lotados na pandemia até o discurso de inspiração nazista do ex-secretário de cultura Roberto Alvim.

Com uma longa carreira nos principais veículos do País, entre eles o Estadão, a jornalista Neuza Sanches observou esses acontecimentos para tentar determinar como os smartphones transformaram a relação dos cidadãos com as instituições democráticas — para o bem ou para o mal. As conclusões estão em "Celular: democrático ou autoritário" (ed. Contexto, R$ 35).

No trabalho, Neuza conta com a participação de figuras que vivenciaram esses espaços de perto, como o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim, o ex-ministro da comunicação Thomas Traumann e o ex-presidente do Banco Central Pérsio Arida, além de jornalistas e profissionais da iniciativa privada.

Diferentemente de outras obras recentes, que focam nas gigantes da tecnologia ou no poder dos algoritmos, Neuza escolheu estudar diretamente o smartphone, mensurando os impactos da mobilidade, da conexão e da possibilidade de produzir conteúdo. A autora também mergulha profundamente nas particularidades do Brasil em relação ao celular, como os planos pré-pagos e os subempregos gerados pelos aplicativos de plataformas.

A conclusão da autora é que o celular é uma arma: concede poder aos usuários para a defesa (como nos registros de violência policial) ou ataque (como as fake news) às instituições democráticas. Com a chegada de novas tecnologias, como o 5G, nada indica que o poder do celular irá perder força. O que Neuza pede é sabedoria e moderação no uso desse instrumento.

Em conversa com o Estadão, a autora falou sobre os impactos dos celulares e o que esperar para as próximas eleições.

Como funciona a metáfora do celular como arma?

É uma arma de defesa ou ataque às instituições democráticas. Um exemplo é a organização de manifestações, contra ou a favor do governo, sem a participação de instituições como partidos ou sindicatos. Também é usada em gravações denunciando a violência urbana, caso da procuradora surrada pelo colega e do Genivaldo, morto por asfixia pela Polícia Rodoviária Federal (PRF); denunciando o preconceito racial; e a desobediência cívica. Não há semana em que não existam denúncias de todos os tipos. Tudo isso em defesa da cidadania e contra preconceitos. Ou não.

Por que o foco do livro é no celular?

O celular virou mais do que um aparelho de comunicação, embora seja um meio. Ele proporcionou trabalho de empreendedorismo, pelo uso do Instagram ou outras redes, e gerou subemprego pelos apps de entrega e de comércio eletrônico. Seu uso se tornou tão diversificado que mexeu na economia do País ao ponto de surgirem bancos que nasceram justamente devido ao uso e disseminação do celular.

Quais são as particularidades do Brasil?

O Brasil criou o celular pré-pago. Um conjunto de fatores fez com que os brasileiros estejam sempre nos primeiros lugares nos rankings de uso do celular. São eles: a privatização das telecomunicações nos anos 1990 no governo FHC, a tecnologia da fibra que conseguiu superar as dificuldades topográficas do País e o próprio acesso e barateamento do celular por conta principalmente do sistema pré-pago.

Novo livro de Neuza Sanches contou com participações de Fernando Henrique Cardoso e Nelson Jobim
Novo livro de Neuza Sanches contou com participações de Fernando Henrique Cardoso e Nelson Jobim
Foto: Divulgação / Estadão

O que podemos esperar para as próximas eleições?

Disseminação de desinformação como jamais se viu por causa da produção desenfreada de conteúdo e a sua velocidade de disseminação. Veremos as autoridades correndo atrás, enxugando gelo.

A legislação atual para combater a desinformação é bem sucedida?

Não. Trata-se de ações paliativas. A desinformação só é desinformação depois de publicada ou divulgada. Criar leis de inibição a priori pode se tornar censura. A saída é a educação nas escolas sobre o poder do celular, a conscientização do uso das redes sociais e dos apps e o incentivo à leitura de livros e jornais para o desenvolvimento do senso crítico. O próprio jornalismo pode ser mais eficiente do que a criação de leis. Isso não se faz da noite para o dia. As leis até podem amenizar de alguma forma, mas serão na prática limitadas e paliativas. E podem criar outro problema: a censura.

Com o 5G e promessas de metaverso, o que podemos esperar?

Uma velocidade ainda maior das transformações de comportamento dos brasileiros. O livro é apenas o início dessa reflexão. Estamos vendo todos os dias essas transformações sob o ponto de vista da sociologia, da política e da economia. O Pix, os bancos digitais, os subempregos em função dos app são exemplos dos primeiros passos dessas transformações na vida dos brasileiros.

Estadão
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