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Aviões são grandes vilões da poluição do ar; por que solução está longe?

Leis para menos poluição e combustíveis verdes ainda são realidade distante do mercado de aviação; no Brasil não há leis que limitem emissão

24 ago 2022 - 05h00
(atualizado às 10h16)
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Querosene é o combustível mais usado no aviões; sua queima libera diversos poluentes atmosféricos, incluindo o dióxido de carbono
Querosene é o combustível mais usado no aviões; sua queima libera diversos poluentes atmosféricos, incluindo o dióxido de carbono
Foto: ThePixelman / Pixabay

Não faz muito tempo que a empresa de marketing e sustentabilidade Yard, do Reino Unido, publicou um relatório de celebridades que mais emitem gases poluentes com seus jatinhos particulares. Nele, a cantora Taylor Swift figurava em primeiro lugar. Além dela, outros nomes como Kim Kardashian, Travis Scott, Jay Z e outros estavam na lista. Mesmo sabendo que os jatinhos dos famosos emitem muito carbono, a poluição causada pelos aviões vai muito além deles. 

Há uma cobrança nos últimos anos às empresas de aviação para se comprometerem com a sustentabilidade e a expectativa pela redução de carbono até 2050 pela Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo, da sigla em inglês). O setor tem analisado diversas alternativas para alcançar esses resultados, seja via propulsão elétrica, hidrogênio, baterias ou ainda biocombustíveis.

Mas é fato: o querosene ainda é o combustível mais usado, e sua queima libera diversos poluentes atmosféricos, incluindo o dióxido de carbono (CO2). A aviação seria responsável por 3,5% de todas as atividades humanas que impulsionam as mudanças climáticas, segundo uma pesquisa de 2020 da Universidade de Manchester (Reino Unido).

Leis brasileiras da emissão aérea de carbono 

Procurada por Byte, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) disse que fiscaliza emissões de carbono aéreas por meio do Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC) nº 38. O documento limita a existência de novos projetos de aeronave com emissão de CO2 maiores que as tecnologias atuais são capazes de realizar. 

O órgão admite, no entanto, que ainda não há no Brasil uma lei que limite as emissões aéreas. O mais próximo disse é o programa Combustível do Futuro, do Ministério de Minas e Energia (MME), que discute a implementação de um mandato de redução de emissões por meio do uso de SAFs (combustíveis de aviação sustentáveis, na sigla em inglês). Eles são produzidos a partir de biomassa, como etanol e biodiesel; também são chamados de bioquerosenes.

Por que aviões poluem tanto?

Segundo Bruno Yamanaka, engenheiro ambiental e especialista de conteúdos do Instituto Akatu, são vários os poluentes liberados nas viagens de avião: além do CO2, há hidrocarburetos gasosos e óxidos de nitrogênio.

"Esse último chega a ser bastante complicado, uma vez que seu surgimento se dá pela mistura de oxigênio e nitrogênio presentes do ar, graças à alta temperatura das câmaras de combustão dos motores. Ou seja, o controle dessa substância é muito mais complexo", explica.

Apesar disso, Yamanaka defende que há um avanço tecnológico que permite mais eficiência reduzindo as emissões e usando biocombustíveis. A aviação busca agir em quatro frentes:

  • Compensação de emissões de CO2 no curto prazo;
  • Desenvolvimento de aviões mais eficientes;
  • Mais investimentos em combustíveis sustentáveis, como os biocombustíveis;
  • Melhor eficiência de rotas. 

Caminho para mudanças ainda é longo

A poluição das aeronaves que fazem percursos intermediários diminuiu de 15% a 20% com relação a modelos mais antigos, de acordo com o que a Iata informou à agência de notícias AFP em 2019. A associação diz que um voo atual produz metade do CO2 que produzia em 1990.

São boas notícias, mas poderíamos fazer mais. Segundo um artigo da revista Nature de 2015, mudanças no design dos aviões, nas operações das companhias e no tráfego aéreo poderiam reduzir em até 50% o nível de emissão de carbono na atmosfera até 2050.

A Embraer, por exemplo, no final do ano passado, apresentou um novo conceito de aeronaves, denominado “Energia”, com quatro aviões movidos a hidrogênio e um avião flex, capaz de funcionar com hidrogênio líquido ou com SAFs.

Apesar de ter lançado a ideia, a empresa diz que ainda não está nem na fase de desenvolvimento dessas aeronaves que pretendem ser “zero carbono”. 

Para Pedro Gerber, pesquisador de engenharia química na Imperial College London, a fabricação de SafS pode ser até dez vezes mais cara que a dos combustíveis fósseis. “As outras possibilidades, como a eletrificação de aeronaves e o uso de hidrogênio, estão longe de se tornar realidade”, afirma o professor.

Produção de combustível aéreo não poluente ainda está aquém da necessidade e com preços não competitivos
Produção de combustível aéreo não poluente ainda está aquém da necessidade e com preços não competitivos
Foto: imagii / Pixabay

A Byte, a Anac disse que, embora os SAFs estejam sendo considerados, sua produção ainda está bem aquém da necessidade do mercado e com preços não competitivos. A organização diz não haver previsão de introdução de aeronaves elétricas e movidas a hidrogênio na frota.

Ricardo Fujii, coordenador em conservação da ONG ambiental WWF Brasil, diz que além do bioquerosene, temos à disposição combustíveis sintéticos feitos a partir da eletricidade ou mesmo do lixo. Mas todas essas opções ainda se encontram em fase experimental.

“Há também iniciativas para a eletrificação dos aviões, mas essa solução encontra enormes dificuldades para se viabilizar em voos de longa distância, como os intercontinentais, pela incapacidade das baterias armazenarem a quantidade de energia necessária”, complementa Fujii.

O consumidor é responsável por “escolher” a opção mais sustentável?

O que já estamos acompanhando por parte das empresas de aviação, no entanto, são algumas ações na hora da escolha do voo. Assim que você busca no Google Flights a data de viagem que você deseja, já vemos um alerta do lado direito: “x% a menos de emissões de carbono”, ou até “x% a mais de emissões de carbono”.

De acordo com Gerber, essa decisão nas mãos do consumidor pode também ser problemática, pois responsabiliza mais o indivíduo do que as empresas, instituições e governos que devem se mobilizar para efetivar a mudança.

“Isso está acontecendo em vários setores. Plásticos, por exemplo. Fala-se muito em reciclagem, como se o consumidor fosse responsável. Mas na verdade se recicla pouquíssimo. Na aviação é a mesma coisa, estão jogando a responsabilidade para o usuário”, explica Gerber.

Para especialista, deixar decisão ambiental nas mãos de quem compra passagem aérea pode ser problemática
Para especialista, deixar decisão ambiental nas mãos de quem compra passagem aérea pode ser problemática
Foto: Tobias Rehbein / Pixabay

Esperar que o consumidor pague a mais em prol do ambiente pode ser uma tarefa complexa. No entanto, o engenheiro químico e coordenador de relações públicas do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de São Paulo (Crea-SP), Érik Nunes Junqueira, diz que o custo da passagem está atrelado, em grande parte, ao preço do combustível.

Portanto, achar um material que polua menos pelo mesmo preço — ou mais barato — do que o atual combustível poluente é o grande desafio para este mercado. “As empresas aéreas estão empenhadas em reduzir este custo, afinal, isso implica em economia”, afirma Junqueira.

Fujii diz que uma solução provisória das companhias é compensar as emissões por meio do investimento em projetos que as absorvam, como por exemplo ações de reflorestamento. Essa medida, segundo o especialista da WWF Brasil, e “custa menos que um lanche a bordo" para os usuários. 

O problema é que não se tem certeza se uma "compensação" dessas absorverá de fato as emissões emitidas pelo voo: "As árvores, por exemplo, precisam de anos para crescer o suficiente para reabsorver o carbono do seu voo. E é difícil garantir que elas ficarão em pé o tempo suficiente para neutralizar as emissões do voo", afirma Yamanaka, do Instituto Akatu.

A Anac informou à reportagem que está em curso a regulamentação brasileira para o Corsia (Esquema de Compensação e Redução de Carbono para a Aviação Internacional, na sigla em inglês). É um programa da Organização da Aviação Civil Internacional (Oaci) para reduzir e compensar emissões de CO2 dos voos internacionais. Mas a entrada do Brasil no esquema está prevista apenas para 2027.

Fonte: Redação Byte
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