A viralização de um vídeo do youtuber Felca, que expôs a alarmante realidade da adultização e exploração infantil nas redes sociais e denunciou o influenciador Hytalo Santos, acendeu um alerta para um problema que, embora não seja novo, tem se intensificado na era digital. O questionamento é inevitável: estamos permitindo que a infância de nossas crianças seja roubada?
A cena se repete em inúmeros lares: meninas de 8 ou 9 anos preocupadas com maquiagem e danças sexualizadas, meninos imersos em jogos violentos e expostos a conteúdos pornográficos. Essa antecipação de preocupações e comportamentos adultos, conhecida como adultização infantil, tem se tornado a norma, trazendo consigo graves consequências para o desenvolvimento emocional, social e, principalmente, para a segurança das crianças.
Especialistas da área de pediatria e pedagogia têm expressado preocupação com os danos permanentes que essa exposição precoce pode causar. A busca por validação através de "likes" e "seguidores" afeta a autoestima, a ansiedade e a saúde mental, enquanto o acesso a conteúdos impróprios expõe as crianças a riscos de exploração e violência.
“A infância está sendo encurtada. A medicina evoluiu para que vivamos mais, mas a fase mais importante para o desenvolvimento humano continua tendo o mesmo tempo e está sendo corroída por conteúdos e pressões que não pertencem a ela”, alerta Dr. Paulo Telles pediatra, membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Segundo ele, os riscos incluem normalização de comportamentos sexualizados, ansiedade, depressão, baixa autoestima e dificuldade de formar relacionamentos saudáveis.
“O cérebro infantil ainda é imaturo para processar temas complexos e, quando exposto a esses estímulos, pode desenvolver sequelas duradouras”, acrescenta.
Dra. Anna Bohn, também pediatra da SBP, reforça que o impacto é social e emocional. “Temos uma geração permeada por ansiedade, depressão e com incapacidade de manter foco e atenção. As crianças perdem tempo de brincar, de explorar, de se relacionar, e internalizam padrões distorcidos de beleza, sexualidade e comportamento. Isso aumenta o risco de isolamento e de vínculos prejudiciais no futuro.”
Sinais de alerta e papel da família
Os pais devem ficar atentos a mudanças bruscas de comportamento, como agressividade, apatia, insônia, medo excessivo ou curiosidade precoce sobre sexualidade.
“Ninguém conhece melhor a criança do que seus cuidadores. Supervisão não é opcional, é obrigação. Deixar um filho sem acompanhamento nas redes é expô-lo a predadores e conteúdos nocivos”, reforça o Dr. Paulo.
A Dra. Anna recomenda adiar ao máximo o acesso a celulares próprios (após os 13 anos) e redes sociais (após os 16), além de criar espaços de diálogo.
“Quanto menos se fala, mais vulneráveis ficam nossas crianças. Precisamos falar sobre o que é seguro, o que não é, e criar confiança para que elas nos procurem quando algo fugir do adequado”, explica.
Para Mariana Ruske Pedagoga, fundadora da Senses Montessori School, a escola deve ser parceira no combate à adultização infantil, mas não substitui a responsabilidade familiar. “Podemos criar espaços de diálogo, oferecer oficinas e guias sobre segurança digital, mas quem protege é a família. Proteger não é proibir: é mediar, acompanhar e oferecer referências sólidas.”
Ela destaca que professores e funcionários precisam estar treinados para reconhecer sinais de exposição a conteúdos inapropriados, como vocabulário adulto, brincadeiras sexualizadas ou ansiedade com a própria aparência e acionar as medidas necessárias. “Estamos falando de um problema que envolve crime, saúde pública e educação. É preciso uma rede de proteção consistente.”
Para Mariana, a sociedade precisa tornar intolerável a exposição de crianças a conteúdos sexualizados. “A indústria da pornografia, do aliciamento e da monetização da atenção infantil movimenta bilhões de dólares e está moldando o cérebro das próximas gerações. O preço da inércia será pago por elas.”
Alerta e denúncia contra Hytalo Santos
Na última semana, Felca viralizou nas redes sociais ao revelar publicamente a "adultização" e a exploração de crianças e adolescentes na internet, trazendo à tona o caso do influenciador digital Hytalo Santos e o caso de exploração e sexualização de Kamylinha Santos, que trabalha com ele desde os 12 anos e tem 17.
Desde a última quarta-feira, 6, o vídeo que ele postou sobre o assunto já ultrapassou 26 milhões de visualizações e gerou discussões sobre os limites éticos na criação de conteúdo envolvendo menores de idade.