Um encontro com o líder ambientalista Chico Mendes (1944-1988) no Rio de Janeiro, em maio de 1988, marcou profundamente a trajetória da atriz Lucélia Santos, de 68 anos, na militância ambiental, social e política. Internacionalmente conhecida pelo papel principal na telenovela Escrava Isaura (1978), a atriz transformou essa marca em engajamento: há mais de 40 anos, dedica-se ativamente a causas sociais e ambientais.
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Lucélia, que é uma das fundadoras do Partido Verde (PV), teve a oportunidade de acompanhar Chico Mendes durante o último ano de sua vida. A convite do seringueiro, ela conheceu de perto a realidade dos trabalhadores da floresta do Acre que, naquela época, travavam uma luta ferrênea contra fazendeiros e grileiros.
"A gente tinha um trabalho mais criativo e investigativo dentro do PV. E, de repente, o Chico Mendes cai de paraquedas naquele contexto urbano. Quando ele começou a falar, explicar como uma reserva extrativista deveria ser construída, qual era a relação entre a União e o latifúndio, a terra, o território, e como tudo isso beneficiaria os povos que vivem do extrativismo, eu pensei: 'Epa, para tudo'", contou em entrevista ao Terra.
A atriz, que está em Belém (PA onde acompanha a Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP30), relatou que o discurso de Chico abriu seus olhos para uma outra realidade. "Comentei isso com meus companheiros: se a gente quer fazer movimento ambiental e ecológico no Brasil, a gente tem que seguir esse cara. Ele é quem está apontando a direção. E o Chico teve a mesma empatia por mim", afirmou.
De acordo com Lucélia, Chico a convidou naquele mesmo dia para que ela fosse ao Acre, especificamente para as cidades de Rio Branco e Xapuri, para conhecer a luta dos seringueiros da região.
"Ele me convidou para participar do primeiro encontro nacional das mulheres seringueiras e para eu declarar apoio à reeleieção dele no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri. Foi assim que tudo aconteceu", relatou, emocionada.
Desde então, o ativismo ambiental, social e político da atriz tem ganhado as páginas de jornais nacionais e internacionais. Questionada pelo Terra sobre o que ela pensa em relação a ser rotulada como "ecochata", Lucélia explicou que, qualquer pessoa que se proponha a agir pelo meio ambiente é chamada assim.
"Gente, sou ecochata há 40 anos. Isso é assim desde sempre. Todo mundo que resolve ir a campo defender a natureza vira ecochato, porque você mexe com os interesses explícitos do capital. Foi o capitalismo que deu esse apelido aos ambientalistas".
A atriz ressaltou ainda que o "título" não é um demérito, pelo contrário. "Qualquer ambientalista que questiona uma licença ambiental para destruir um rio, uma floresta, um território quilombola ou indígena vira ecochato. Isso é assim desde tempos sem princípio. Ou a gente convive com isso, ou não vai adiante", completou.
Em meio à COP30, Lucélia trouxe o espetáculo Vozes da Floresta - Chico Mendes Vive para a capital paraense no último fim de semana. A peça foi criada durante a pandemia, quando Lucélia transformou antigos registros de seu primeiro encontro com Chico Mendes em um roteiro.
O espetáculo é uma viagem à história da luta ambientalista no Acre, onde Lucélia interpreta Valdiza Alencar, Cecília Mendes e ela mesma. Na trama, as mulheres contam suas histórias ao lado de Chico Mendes para um jornalista, interpretado pelo ator João Signorelli, de 68 anos.
Ao final do espetáculo, ela foi ovacionada por cerca de cinco minutos pela plateia do Teatro Margarida Schivasappa, e aproveitou a ocasião para chamar ao palco a ativista Ângela Mendes, filha de Chico Mendes. Emocionadas, as duas encerraram com chave de ouro a apresentação.
*Essa reportagem foi produzida como parte da Climate Change Media Partnership 2025, uma bolsa de jornalismo organizada pela Earth Journalism Network, da Internews, e pelo Stanley Center for Peace and Security.