Efeitos da crise na Venezuela não serão duradouros, diz analista

Nicholas Watson, especialista em Venezuela, diz que o Brasil não vai arriscar se envolver no conflito, mas que "Dilma se sente desconfortável com aspectos autoritários do Chavismo"

19 fev 2014 - 16h00
(atualizado às 17h34)
<p>"O objetivo de Maduro é a sobrevivência pura e simples", diz o analista</p>
"O objetivo de Maduro é a sobrevivência pura e simples", diz o analista
Foto: Reuters

Os efeitos dos protestos que tomam conta da Venezuela há uma semana não deverão ser vistos no Brasil, Nicolás Maduro luta para sobreviver politicamente após a morte de Hugo Chávez e a oposição do país encontra-se completamente dividida. As opiniões são de Nicholas Watson, especialista em Venezuela da consultoria Teneo, baseada na Colômbia.

Para Watson, o principal líder oposicionista no momento, Leopoldo López, tinha pouca alternativa senão se render às autoridades, como ocorreu nesta terça-feira, 18. Sobre o papel do Brasil, ele diz que o país não vai arriscar se envolver, mas que “Dilma se sente desconfortável com aspectos autoritários do Chavismo, especialmente com o envolvimento crescente dos militares na política”.

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Leia a entrevista completa abaixo:

Terra - Quem se beneficia com os protestos na Venezuela?

Nicholas Watson - Acredito que o governo se beneficia mais do que ninguém  porque ele precisa de um inimigo em meio à inflação, escassez de produtos e erros na área econômica. O ambiente de agitação e instabilidade serve para mascarar as próprias inadequações do governo. A estratégia de Capriles - candidato derrotado nas duas últimas eleições presidenciais - é a de esperar que os apoiadores do governo se afastem de Maduro rumo à oposição, enquanto o governo entra em colapso sob o peso de sua própria incompetência. López estava frustrado com essa abordagem “a passos de tartaruga”, especialmente depois da performance desapontadora da oposição nas eleições municipais de 2013. Creio que Capriles pode se beneficiar do erro de cálculo de López e poderá usar os eventos das últimas duas semanas para se restabelecer como o principal líder da oposição.

Terra - Quais são os objetivos de Maduro a dois meses da eleição presidencial?

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Watson - O objetivo de Maduro é a sobrevivência pura e simples. A longo prazo, ele gostaria de preservar o Chavismo após a morte de Hugo Chávez, mas não existe um plano coerente para alcançar este objetivo. Há pouca confiança na liderança de Maduro e tantas facções competindo dentro do Chavismo, que a prioridade de Maduro é sobreviver.

Para Watson, López tinha pouca alternativa senão se render às autoridades venezuelanas
Foto: Reuters

Terra - O que significam a ascensão e a prisão de Leopoldo López?

Watson - López sempre quis ser o principal líder da oposição, e eventualmente tornar-se presidente. Ele saiu do lado dos oposicionistas com Henrique Capriles antes das eleições presidenciais de 2012 porque sabia que não iriam vencer. Ele aceitou a liderança de Capriles, mas depois das eleições municipais de dezembro de 2013, e com a piora da situação econômica no começo de 2014, López parece ter decidido que a oposição precisa de uma mudança estratégica de direção e uma posição mais dura contra Maduro. Após os protestos da última semana, López tinha pouca alternativa senão se render às autoridades (aceitar o exílio seria aceitar a derrota). Agora, espero que ele tente transformar a sua causa em um problema político permanente para o 

governo Maduro. O problema para López é que os protestos nas ruas e a agitação só irão fortalecer Maduro. Para completar, muitos venezuelanos estão insatisfeitos com Maduro e com o Chavismo, mas eles ainda não estão preparados para a oposição. Capriles fez grande progresso ao ganhar este apoio, mas, para muitos, López é muito direitista e lembra muito a ordem estabelecida pré-Chávez, mesmo que seja jovem.

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Terra - Como estes protestos podem afetar a relação entre Venezuela e Brasil?

Watson - O Brasil tem sido relutante em parecer muito crítico à Venezuela, em parte por causa do forte relacionamento pessoal do ex-presidente Lula com Chávez. Para completar, os brasileiros aumentaram significantemente suas exportações para a Venezuela nos últimos anos, e o comércio bilateral favorece o Brasil. Obviamente, o Brasil não quer se arriscar. Entretanto, Dilma se sente desconfortável com aspectos autoritários do Chavismo, especialmente com o envolvimento crescente dos militares na política. Mas não vejo mudanças significativas entre Brasil e Venezuela a curto prazo.

Terra - A oposição da Venezuela está mesmo dividida?

Watson - Sim, está. A Mesa de Unidade Democrática (MUD) é uma coalizão heterogênea que tem a “velha guarda” dos partidos pré-Chávez, assim como antigos chavistas que romperam com o Chavismo. Então, há sempre um pouco de “tensão criativa” dentro da oposição. Capriles tem tido sucesso em controlar isso, e sua derrota apertada para Maduro em abril de 2013 (por uma margem de 1,48%) fortaleceu sua posição. Mas desde então, López e Machado ficaram ansiosos e frustrados. No melhor cenário para a oposição, Capriles fica com a liderança e o caso de López vira outro motivo para protesto pela oposição. No pior cenário, será impossível superar as divisões e entrar nas eleições legislativas de 2015 divididos.

Fonte: Terra
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