Após incêndio na Boate Kiss, nova regra obriga divulgação de alvarás

25 set 2013 - 12h13
(atualizado às 12h37)

Oito meses após o incêndio da Boate Kiss em Santa Maria (RS), que levou à morte 242 pessoas, o Ministério da Justiça publicou nesta quarta-feira uma portaria que obriga a transparência maior de estabelecimento de lazer, cultura e entretenimento ao consumidor. Em 90 dias, shows, festas e eventos deverão apresentar em seus ingressos, nos sites e em qualquer material de divulgação o número e a validade do alvará de funcionamento.

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"Hoje o alvará está na gaveta de alguém, se existe", afirmou a secretaria nacional de defesa do consumidor do Ministério da Justiça, Juliana Pereira. Além da impressão nos ingressos, as informações também deverão ser expostas de maneira clara na entrada dos estabelecimentos, assim como a capacidade máxima do local.

"O que podemos regulamentar é que o consumidor brasileiro tenha o direito de ter em seu ingresso, no site o número e a validade do alvará. Isso assegura a obrigação de dar a transparência", explicou asecretária. Juliana afirmou que o ministério contou com o apoio da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul para a elaboração da nova regra.

"Desde que todos os brasileiros viram o que lamentavelmente aconteceu no Rio Grande do Sul, no início do ano, a área de defesa do consumidor começou a ver o que poderia ser feito para a prevenção", disse.

O estabelecimento que descumprir a nova regra será punido nos termos do Código de Defesa do Consumidor. A multa pode chegar a R$ 6 milhões.

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Sistema de Informações de Acidentes de Consumo

Passa a valer, em quatro meses, o Sistema de Informações de Acidentes de Consumo (Siac), que vai armazenar registros sobre acidentes graves ou fatais ligados a produtos com potencial de risco ao consumidor. Profissionais de saúde serão obrigados a fazer as notificações, quando identificadas.

"Acreditamos que com essa portaria com a instituição desse banco de dados nacional, vamos constituir num prazo muito curto o maior banco de dados e de redução de impacto à saúde de produtos de consumo", afirmou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, pouco após assinar uma portaria interministerial com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.

De acordo com o Ministério da Justiça, as informações coletadas serão fundamentais para a identificação de riscos em produtos queestão no mercado de consumo e subsidiarão ações voltadas à proteção da saúde e segurança do consumidor. "Além de permitirmos medidas concretas, permite dados com mais qualidade, planejamento maior do conjunto de políticas públicas", acrescentou Padilha.

Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou 242 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A associação foi criada com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Indiciamentos

Em 22 de março, a Polícia Civil indiciou criminalmente 16 pessoas e responsabilizou outras 12 pelas mortes na Boate Kiss. Entre os responsabilizados no âmbito administrativo, estava o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). A investigação policial concluiu que o fogo teve início por volta das 3h do dia 27 de janeiro, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), por meio de uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) lançada por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

O inquérito também constatou que o extintor de incêndio não funcionou no momento do início do fogo, que a Boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás, que o local estava superlotado e que a espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular. Além disso, segundo a polícia, as grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas, a boate tinha apenas uma porta de entrada e saída e não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência - as portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário e não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Já no dia 2 de abril, o Ministério Público denunciou à Justiça oito pessoas - quatro por homicídios dolosos duplamente qualificados e tentativas de homicídio, e outras quatro por fraude e falso testemunho. A Promotoria apontou como responsáveis diretos pelas mortes os dois sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, e dois dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

Por fraude processual, foram denunciados o major Gerson da Rosa Pereira, chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros, e o sargento Renan Severo Berleze, que atuava no 4º CRB. Por falso testemunho, o MP denunciou o empresário Elton Cristiano Uroda, ex-sócio da Kiss, e o contador Volmir Astor Panzer, da GP Pneus, empresa da família de Elissando - este último não havia sido indiciado pela Polícia Civil.

Os promotores também pediram que novas diligências fossem realizadas para investigar mais profundamente o envolvimento de outras quatro pessoas que haviam sido indiciadas. São elas: Miguel Caetano Passini, secretário municipal de Mobilidade Urbana; Belloyannes Orengo Júnior, chefe da Fiscalização da secretaria de Mobilidade Urbana; Ângela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko; e Marlene Teresinha Callegaro, mãe dele - as duas fazem parte da sociedade da casa noturna.

 

Fonte: Terra
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