Além do futebol: Dnipro une Ucrânia em momento turbulento

Campanha histórica e heroica do clube ucraniano na Liga Europa mobilizou país, em guerra com a Rússia, para torcer junto

28 mai 2015 - 16h36

Há quem diga que futebol é apenas entretenimento. Em mais de uma ocasião, no entanto, o esporte provou ser mais do que uma distração popular. Capaz de mobilizar multidões, ele tem o poder de unir pessoas diferentes na torcida por um objetivo. Esse tipo de situação geralmente se aplica a seleções nacionais, pelo fato delas quebrarem as barreiras de clubismos e rivalidades. É raro que um time consiga cativar toda uma nação.

Torcida do Dnipro usou bandeira da Ucrânia como símbolo nas ruas de Varsóvia e no estádio da final
Torcida do Dnipro usou bandeira da Ucrânia como símbolo nas ruas de Varsóvia e no estádio da final
Foto: Jorge Guerrero / AFP

Em 2015, a Ucrânia presenciou esse desdobramento incomum: o país se sentir representado por uma equipe. O Dnipro Dnipropetrovsk foi o protagonista dessa história de heroísmo improvável. Clube da região leste do país, ele foi obrigado a jogar longe da sua cidade em mais de uma ocasião, pela com os conflitos em curso nas oblasts (províncias ucranianas) de Donetsk e Luhansk, vizinhas no território nacional.

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As regiões do leste ucraniano sofrem com uma intervenção militar russa que conta com rebeldes a seu favor. Ex-União Soviética, a nação tem um poderio bélico inferior ao da Rússia, de quem se separou em 1991.

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O Dnipro também não fazia parte das maiores forças da Liga Europa, tanto é que ficou perto de cair na fase de grupos, ficando apenas a um ponto do Qarabag (quem?!) do Azerbaijão. A equipe ucraniana não tinha favoritismo a seu favor, nem um histórico de sucesso em competições europeias. Suas melhores campanhas vieram nas Ligas dos Campeões de 1984/85 e 1989/90, quando chegaram até as quartas de final.

Enquanto o país sofre de uma crise social, política e econômica, o Dnipro mostrou um poder de superação inspirador para a população ucraniana, encarando adversários tidos como superiores e levando a melhor. O próprio técnico Myron Markevych admitiu que não botava fé na equipe nas fases eliminatórias, mas tudo mudou quando o clube deixou para trás o Olympiacos na primeira rodada após os grupos da Liga Europa.

“Eu não seria franco se dissesse que planejei jogar a final. Você ganha apetite quando você começa a comer. Após o jogo contra o Olympiakos, comecei a acreditar que poderíamos ir longe o suficiente”, assumiu o treinador em entrevista coletiva na última terça-feira.

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O Dnipro era azarão e também obrigado a jogar longe do seu torcedor, que compreensivelmente não encheu as arquibancadas do Estádio Olímpico da distante Kiev, localizada a mais de 400 km de Dnipropetrovsk. Com capacidade para mais de 70 mil espectadores, a arena teve públicos menores de 17 mil em todas as partidas mandadas pelo clube ucraniano até a semifinal do torneio, quando a campanha-conto de fadas envolveu a população do país, não só da cidade da equipe.

“Não é fácil jogar longe de casa. Temos viajado muito, inicialmente foi bem difícil. Poucos torcedores estavam vindo, estávamos jogando em estádios grandes. Isso estava nos suprimindo. Na semifinal contra o Napoli um número recorde de torcedores apareceu. Aquilo foi muito bem recebido pelos jogadores”, desabafou Markevych.

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Embalados pelos 62 mil ucranianos em Kiev, os jogadores do Dnipro eliminaram o favorito Napoli com vitória por 2 a 1 no placar agregado e garantiram o passaporte à final em Varsóvia. Mas não foi somente isso. O elenco sentiu a comoção criada pela campanha e se solidarizou com os problemas econômicos da torcida, pagando do próprio bolso a vinda de torcedores para a Polônia, conforme contou o capitão Ruslan Rotan na semana da final.

O que se viu dentro do Stadion Narodowy contra o Sevilla foi algo maior que o Dnipro nas arquibancadas. Enquanto os fãs do clube espanhol se vestiam com as cores do clube, na parte reservada aos torcedores da equipe ucraniana a bandeira do país era a principal representação. As cores não eram apenas o azul do Dnipro, mas o amarelo que também faz parte das cores da nação.

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Foto: Odd Andersen / AFP

Esse apoio todo não evitou a derrota na decisão, mas comoveu o elenco do Dnipro, que mostrou satisfação com o feito alcançado. “Foi uma campanha histórica para o clube, que nunca tinha chegado em uma final europeia. Queríamos muito conquistar esse título não só por nós, mas por todo o povo ucraniano, que todos sabem que está vivendo momentos difíceis. Recebemos o apoio de todos os ucranianos, não só dos nossos torcedores”, afirmou o brasileiro Douglas após a final.

Em um momento de caos interno na Ucrânia, o Dnipro Dnipropetrovsk mostrou que o esporte pode unir um país por uma causa, mesmo não sendo a seleção nacional entrando em campo.

Fonte: Terra
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