Empresas que integram a inteligência artificial de forma estratégica e orientada por resultados mensuráveis podem impulsionar produtividade, vantagem competitiva e retorno econômico, enquanto aquelas que hesitam ou focam em experimentos dispersos arriscam ficar para trás.
Empresas que tratam inteligência artificial como espetáculo enxergam apenas custo. Já aquelas que a estruturam como sistema, capturam produtividade, margem e vantagem competitiva. O jogo não é sobre experimentar, mas sobre transformar operações em resultados mensuráveis. Estimativas apontam investimentos de corporações em IA superiores a US$ 307 bilhões em 2025. Esse valor pode chegar a US$ 632 bilhões em 2028. A adoção se amplia, porém se arrasta. Em cerca de 78% das organizações que usam IA em ao menos uma função, mais de 80% não têm impacto tangível no EBIT da empresa inteira. Somente 1% descreve seus rollouts como maduros. O diagnóstico aponta falta de arquitetura operacional, processos verticalizados e métricas de captura de valor.
Apesar dos entraves, há sinais claros de valor. Cerca de 78% das empresas planejam aumentar o investimento em IA e um quarto já explora agentes autônomos para orquestrar processos complexos. Profissionais com competências em IA têm um prêmio salarial médio de 56%, indicador que evidencia tanto a escassez técnica quanto o potencial econômico. Outro vetor é o endpoint. Em 2025, mais de 100 milhões de PCs devem ser enviados com capacidade de IA integrada, o que representa 40% do total. Isso abre espaço para aplicações no dispositivo, com ganhos de privacidade e latência de economia de infraestrutura em nuvem.
Como capitalizar, então, com ambição e controle? Primeiramente, escolha os “pools de valor” por função com critério empresarial. Finanças, atendimento, operações e engenharia carregam casos com ciclo curto e efeito de margem. Traduza cada caso em objetivo de processo, indicador, janela de payback e contrafactual. Sem indicador, não existe gestão. Sem contrafactual, não existe atribuição de efeito.
A verdadeira transformação vem da arquitetura agêntica, que conecta IA ao trabalho real. Enquanto modelos apenas geram respostas, agentes entregam tarefas concluídas com intenção, ferramentas, memória e checagens. É aqui que a IA deixa de ser curiosidade e passa a ser produtividade mensurável. O desenho básico inclui camada de orquestração, catálogo de ferramentas corporativas com controles de acesso, memória vetorial com governança, malha de segurança e trilhas de auditoria. Avaliações contínuas entram como disciplina central, com testes sintéticos e dados reais anonimizados por processo. A referência estratégica é clara. Quase oito em dez empresas usaram genAI sem impacto relevante de última linha e apontam agentes como vetor para romper essa fricção ao ligar IA a processos e receita.
Trate dados como produto. Cada domínio de negócio precisa de contratos de dados, owner, SLO de qualidade, catálogo versionado e políticas de retenção. RAG, sigla em inglês para Geração Aumentada por Recuperação, deve operar como pipeline, e não como gambiarra. Fontes, limpeza, indexação, frescor, testes de regressão e governança de acesso formam a espinha, além do chunking, processo de quebrar um texto longo em partes menores para que um modelo de linguagem consiga processar essas partes de forma eficiente e com maior precisão. Sem chunking, a acurácia cai e com ela a confiabilidade do sistema, abrindo riscos jurídicos e financeiros.
Estruture uma estratégia de computação equilibrada. Treinar fora de casa e servir dentro, ou o oposto, depende de custo, confidencialidade e latência. A fronteira movediça de modelos exige planos dinâmicos de portabilidade, quantização, compressores e caches. On-device AI entra no portfólio com NPUs) em PCs, smartphones, maquininhas de pagamento e dispositivos de casa inteligente. O ganho inclui latência previsível, uso offline, economia de banda e privacidade por desenho. Defina critérios de alocação. Modelo grande no backend para tarefas de alta ambiguidade. Modelo compacto no endpoint para comandos frequentes, dados sensíveis ou tempo crítico.
Crie um sistema de risco e conformidade que libere, em vez de travar. Políticas claras de uso de dados, revisão de comandos de IA sensíveis, listas de negação, proteções contra injeção por comando, filtros de saída e rotas de resposta para exceções. Segurança acompanha a superfície de ataque da própria arquitetura agêntica. Considere telemetria transparente em cada chamada, logs invioláveis, além de criptografia em trânsito e em repouso. Da mesma forma, é importante fazer testes de conteúdo com métricas de segurança e de qualidade integradas ao ciclo de release.
Alinhamento financeiro e de portfólio: FinOps para IA mede custo por transação, por caso e por unidade de valor gerado. Sem isso, orçamento evapora em latência ociosa e completions redundantes. Combine governança de vendors com métricas de portabilidade. Evite prisões involuntárias. Exija SLAs por throughput, latência e confidencialidade, além de trilhas de auditoria e cláusulas de saída com dados entregues em formatos abertos.
Gente e desenho organizacional também: times de produto com responsabilidade ponta a ponta. Engenharia de comandos como competência documentada e versionada, em vez de artesanato oculto. Data product owners com metas de negócio. Chapter de avaliação para manter qualidade e segurança. Trilhas de capacitação com progressão. A evidência econômica sugere retorno real quando competências florescem, e a iminência de prêmio salarial reforça a urgência de formar, assim como reter especialistas.
Medição de valor como rotina executiva: adoção sem captura não interessa. Instale um painel com quatro quadrantes. Destaque receita nova por produto com IA. Reduza custo por processo com agente em produção. Mitigue risco por detecção e resposta automáticas. Aumente satisfação de usuário com cortes por segmento e canal. Faça revisão mensal com finanças e risco. Decida com base em evidência.
Além, elabore roteiro de endpoints inteligentes. PCs e dispositivos com NPU viabilizam copilotos locais para tarefas de escritório, atendimento de alta frequência, controles de fraude em terminais de pagamento e automações domésticas com privacidade. A massa crítica de hardware muda o jogo de distribuição. O número de remessas projeta efeito de rede ao desenvolvedor e ao integrador, com SDKs maduros e suporte a modelos compactos e quantizados no próprio dispositivo, o que reduz custo de inferência em nuvem e estabiliza experiência em regiões com banda limitada.
Por fim, a narrativa empresarial. IA não deve ser tratada como curiosidade. Ela é instrumento para resolver assimetrias de produtividade e criar margem adicional. Estratégias vencedoras rejeitam experimentos dispersos e focam processos nucleares, com dono definido, dado confiável e computação adequada. Executivos que estruturam agora sua arquitetura, governança, métricas e talentos entrarão em um ciclo virtuoso de aprendizado real, custo sob controle e impacto competitivo. Quem hesitar, provavelmente pagará o preço da inércia. Este é o momento de operar com convicção técnica e pragmatismo financeiro.
(*) Rodrigo Guercio é vice-presidente de Negócios Corporativos da Positivo Tecnologia.