Bourbon Street mostra uma nova face do blues em três noites

Terrie Odabi, The Cinelli Brothers e Little Joe McLerran chegam para um raro festival em Moema, que estreia hoje (13)

13 mar 2019 - 03h10

O Bourbon Street Music Club, casa de blues, jazz, funk, soul e música brasileira de Moema, na zona sul de São Paulo, começa hoje um ato de resistência: um festival de blues. Eles são cada vez menos visíveis, os festivais e as bandas de blues, mas a casa, inaugurada e adotada por BB King desde que abriu as portas, em dezembro de 1993 (BB tocou onze vezes naquele palco), parece prestar um serviço público ao pai do rock.

O Blues Festival, mesmo sem patrocínio, faz um retrato interessante nas três noites espaçadas em três semanas. Hoje (13) será a vez da cantora norte-americana Terrie Odabi, jovem e já em destaque em suas terras, que canta tendo como base a banda Alabama Johnny. Na quarta que vem (20), a noite será do Cinelli Brothers, dois irmãos italianos radicados em Londres que serão acompanhados por um grupo brasileiro. E dia 3 de abril, o gaitista Flávio Guimarães vai se apresentar com o cantor e guitarrista Little Joe McLerran e a banda The Simi Brothers. Um guitarrista e cantor brasileiro, Gui Cicarelli, especialista em sons do lendário Stevie Ray Vaughan, será o que a direção do festival chama de host, um mestre de cerimônias para abrir as noites. Gui tem atraído um público jovem e vibrante quando faz shows na casa, uma conquista de território.

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O show de hoje mostra a escola viva de Etta James na voz de Terrie. Cantora de voz cheia de vigor que nunca veio ao Brasil, ela já começa a ganhar títulos como o de diva do blues de San Francisco. O grande prêmio do meio, o Blues Music Award de 2017, a indicou em duas categorias: Melhor Artista Feminina de Soul Blues e Melhor Álbum de Artistas Emergentes. Isso tudo pelo álbum My Blue Soul, considerado um dos 50 melhores de blues do ano de 2016.

Sua banda brasileira precisa trabalhar com o mesmo vigor, já que é assim que Terrie tem se dado bem em shows nos Estados Unidos. É para torcer que entre em seu set list I'd Rather Go Blind, quando seu vulcão entra em atividade. Os músicos que estarão a seu lado em sua passagem pelo Brasil são Flavio Naves (piano), Fred Sunwalk (guitarra), Denilson Martins (sax), Bruno Falcão (baixo) e Fred Barley (bateria).

A noite seguinte terá o grupo italiano, que prefere ser chamado de londrino, Cinelli Brothers. Os irmãos Cinelli, jovens e bonitos, radicados em Londres, surgem também com uma base brasileira na passagem pelo Brasil. Marco Cinelli, cantor e guitarrista, encontrou uma voz que rasga as melodias do blues rock, como os vocalistas dos anos 1970. Alessandro, seu irmão, é o baterista, que chega com um set de instrumento surpreendentemente simples e de pegada leve. E eis uma marca do blues rock da nova geração. Os volumes não precisam estar acima do dez para que o som chegue gordo, cheio. Não há vocais gritados nem exageros de solo. Não seria estranho classificá-los de indie blues.

Edgard Radesca, sócio do Bourbon Street e diretor do festival, é contra a ideia de que o blues esteja respirando por aparelhos. "Uma geração saiu de cena, mas há novos nomes muito interessantes. Acho Gary Clark Jr um deles." Se apostaria em abrir uma casa voltada exclusivamente ao blues em São Paulo, Radesca diz que não. "Isso depende do tamanho da casa, na verdade. Casas maiores não podem trabalhar com um ritmo só."

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As ondas do blues se erguem de tempos em tempos, motivadas por algum revival. O que pode ser um desafio aos festivais de hoje diz respeito ao comportamento. Como fazer com que o blues passe por um processo de rejuvenescimento como tem vivido o jazz e a música instrumental no Brasil e no mundo? Como fazer com que as bandas de blues voltem a chamar público para casas médias, como nos anos 1990 e começo dos 2000? Um festival pode ser importante para isso. "Quando as atrações estão sob um guarda-chuvas de um festival, o caráter é outro", diz Radesca. Terrie Odabi e Cinelli Brothers têm sustança para andarem sozinhos, mas juntos mostram o quanto Muddy Waters ainda tem força.

Host pode atrair mais público

O jovem guitarrista Gui Cicarelli vai atuar em todas as noites; casas precisam repensar suas programações

Gui Cicarelli, um jovem guitarrista que já fez apresentações no Bourbon Street, pode funcionar como um catalisador de novas plateias. É o que pensa o sócio da casa, e diretor do projeto, Edgard Radesca. Ter a figura de um host não é comum em festivais no País. A plateia que o acompanha está na casa dos 30 anos e tem se mostrado fiel.

O blues brasileiro não tem mais o mesmo circuito de outros anos, sobretudo na segunda metade dos anos 90. Novos grupos, no entanto, seguem surgindo. Radesca conta que a programação do festival foi feita das conexões que os brasileiros que vão se apresentar já tinham com as atrações de fora. A curadoria foi sugerida pelos músicos, um formato que pode render outros festivais.

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Há um desafio aos programadores de casa de shows levantado por projetos como esse. Grupos em grupo, mostram as experiências, valem mais. Assim, trazer atrações em bloco e juntá-las sob um mesmo guarda-chuvas pode ser mais caro a quem realiza, mas tem grandes chances de render mais.

As efemérides também podem gerar projetos valiosos sem custos estratosféricos. Juntar músicos para tocar o repertório de Nat King Cole seria fantástico para o próximo domingo, em algum clube de jazz de São Paulo. Ao mesmo tempo em que mostraria o talento dos novos desta cena, atrairia um público apaixonado por Nat e que raramente pode ouvir suas canções ao vivo. Mas, infelizmente, ninguém vai se lembrar de que Nat faria, nesta data, 100 anos de idade. / J.M.

BLUES FESTIVAL

Bourbon. Rua Dos Chanés, 127. Terrie Odabi: hoje, 22h; The Cinelli Brothers: dia 20, 22h; Little Joe McLerran: 3/4, 22h. R$ 60

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