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Reajuste real de medicamentos pode ser muito superior ao índice anunciado, diz Idec; entenda

Aumento é aplicável aos valores máximos que as drogarias podem cobrar nos produtos, mas que geralmente não são praticados; com isso, há margem para reajustes além do índice teto

1 abr 2024 - 19h55
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Uma análise feita pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) aponta que o reajuste no preço dos medicamentos que entrou em vigor nesta segunda-feira, 1º, no País pode, na prática, ser muito superior ao índice de 4,5% definido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), órgão federal encarregado de regular e fiscalizar os preços dos medicamentos no Brasil. Isso porque o percentual de aumento é aplicável sobre o Preço Máximo ao Consumidor (PMC), ou seja, o valor máximo que as farmácias podem cobrar dos clientes em cada medicamento.

As farmácias, no entanto, dificilmente chegam a esse valor. O estudo do Idec mostra que, na prática, as drogarias costumam cobrar um valor muito menor do que o PMC nos produtos e, por isso, sempre têm margem para aumentos fora do índice de reajuste anual estabelecido - que geralmente está vinculado à inflação do período.

Diante do cenário, mesmo com a limitação de um teto de reajuste, esse índice não consegue impedir aumentos abusivos caso as drogarias queiram elevar os preços até o limite do PMC. De acordo com o levantamento do Idec no qual foram analisados os preços de 20 medicamentos nas três maiores redes de farmácias do País, o valor de um remédio de marca pode aumentar em mais de 70% sem que isso viole o teto. No caso dos genéricos, esse aumento pode passar dos 100%.

De acordo com o instituto, os números mostram que os valores de remédios definidos pelo órgão governamental estão descolados das práticas de mercado, o que deixa o consumidor vulnerável a práticas abusivas.

Consumidores mais vulneráveis, especialmente aqueles com problemas de saúde, são os mais afetados, afirma Idec
Consumidores mais vulneráveis, especialmente aqueles com problemas de saúde, são os mais afetados, afirma Idec
Foto: ESTADAO / Estadão

"A pesquisa tem diversos resultados interessantes, mas o principal deles é a constatação, mais uma vez, de que a regulação de preços de medicamentos não consegue proteger os consumidores na prática. Na média, os preços máximos permitidos pela regulação são muito descolados da realidade do mercado, e isso abre margem para que as farmácias adotem uma série de práticas abusivas", afirmou Marina Magalhães, pesquisadora do programa de Saúde do Idec.

Marina, que é uma das responsáveis pelo estudo, cita o antibiótico Amoxicilina + Clavulanato de Potássio como exemplo. Embora o preço máximo permitido para ele seja de R$ 404,65, nas farmácias ele é encontrado, em média, por R$ 180,30. "No entanto, o reajuste será aplicado sobre o preço máximo. Portanto, se o fabricante e as farmácias dobrarem o preço desse remédio da noite para o dia, o consumidor não terá a quem recorrer", destacou a pesquisadora.

Os resultados revelam que, entre os medicamentos de marca, a diferença média entre os preços atuais praticados nas farmácias e o valor máximo estipulado pela regulação foi de 37,82%. Em termos absolutos, a maior diferença encontrada foi de R$ 224,35, relacionada ao antibiótico Clavulin. Já entre os genéricos, a diferença média foi de 20,89%. Nesse caso, o Aciclovir, antiviral usado para o tratamento de infecções causadas pelo vírus do herpes, destacou-se com uma discrepância de R$ 65,94.

Descontos com CPF

Quando considerados os descontos concedidos quando o cliente informa o CPF, a diferença entre a média de mercado e os preços máximos é ainda maior. Nos medicamentos de marca, essa discrepância quase dobra, crescendo de 37,82% sem desconto para 71,63% com desconto.

Já no caso dos genéricos com desconto fornecido mediante concessão de dados pessoais, a diferença entre a realidade do mercado e os limites estabelecidos pela CMED mais que quintuplica, saltando de 20,89% para 115,52%.

"Em pelo menos oito dos vinte medicamentos pesquisados, nós percebemos que o preço cheio cobrado pelas farmácias coincidia com o preço-teto da CMED. Porém, com a concessão do CPF, eram aplicados descontos que variavam, em média, de 20% a 77% do valor final do remédio. O que podemos interpretar disso é que, frequentemente, as farmácias inflacionam o preço para, na hora da compra, poderem coagir o consumidor a compartilhar seus dados pessoais em troca de descontos artificiais", disse Marina.

Regulação

O Idec destaca que os resultados evidenciam a necessidade de uma revisão na regulação do mercado farmacêutico. "Discrepâncias tão significativas apontam para uma clara defasagem entre as normativas em vigor e as práticas comerciais, o que compromete sua efetividade e prejudica a concretização de seus objetivos. Os consumidores mais vulneráveis serão os mais afetados, especialmente aqueles com problemas de saúde que dependem de medicamentos essenciais para a sua qualidade de vida", ressaltou Marina.

O estudo também apresenta sugestões para aprimorar a regulamentação. De acordo com o Idec, é necessário atualizar as normas para garantir maior transparência nos custos de produção e comercialização de medicamentos, estabelecer critérios de precificação mais alinhados com a realidade nacional, conceder à Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) a prerrogativa de ajustar os preços conforme a dinâmica do mercado, promover a harmonização regulatória e envolver a sociedade no processo de definição de preços dos medicamentos.

Todas essas propostas fazem parte da Campanha "Remédio a Preço Justo", que endossa a aprovação do Projeto de Lei 5591/20. Este projeto visa alterar as normas para a definição dos preços de novos medicamentos no mercado brasileiro e estabelecer novos requisitos de transparência para as empresas do setor. No entanto, o PL, atualmente sob relatoria do senador Ciro Nogueira, está parado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, sem avanços significativos há quase um ano.

Estadão
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