Conheça o pithiviers, primo inexplorado do bife wellington
Em São Paulo, o chef Alain Poletto resgata a tradição do complicado folhado francês
Talvez sem o mesmo hype do wellington, mas o pithivers está voltando. Pela complicação, o clássico da cozinha francesa tinha caído no desuso. Sendo, quando muito, revisitado em provas do Top Chef França. Graças a essas revisitas, aliás, o vencedor da última temporada, Hugo Riboulet, acaba de abrir um restaurante em Paris dedicado a elas.
Um passinho em direção à glória, mas nada que tenha levado a receita às mesas bistronômicas: "Pouca gente faz porque tecnicamente é muito difícil, mas muito difícil. Depois, é demorada". A explicação é de Alain Poletto, que incluiu essa massa folhada recheada com codorna no menu de seu Bistrot de Paris, nos Jardins.
Ao que tudo indica, o pithiviers surgiu no século 16 e tinha como proteína outro tipo de passarinho, as "mauviettes" (cotovias). Diferente de um pâté en croûte (terrine embrulhada em massa de quiche), ele é servido quente e, em geral, feito com carne de caça. "Uso codorna do sul, porque você não acha aqui. O problema é que elas são um pouco magrinhas e não têm o sabor de um animal selvagem", confessa o chef que desossa as aves e deixa-as em marinada antes de cobri-las com pasta de cogumelos paris e envolver tudo com massa folhada caseira.
Quer dizer, as coxinhas, ainda com ossinho e tudo, ficam para fora, são confitadas em gordura de pato em baixa temperatura para manterem a suculência. Chegam ao prato molhadinhas, acopladas ao folhado e rodeadas por um brilhante demi-glace (molho consistente à base da carcaça retirada, legumes e muita redução).
Não bastasse o desafio da cocção das avezinhas, por estar em um país tropical, a tal massa exige "muito tempo de resfriamento para o amido da farinha relaxar e a manteiga se firmar o suficiente. Um processo de dois ou três dias", conta Alain.
Quando prontinha, o cozinheiro tinha por hábito abri-las com rolo de macarrão e paciência. No entanto, está testando um laminador manual japonês: "Continua totalmente artesanal, mas ganho uns minutinhos e aumento a produção, porque é a mesma base do bife wellington e se digo que tem wellington, não há o que chegue, então nem coloco no menu".
Cabe aqui diferenciar um preparo do outro. Ambos consistem em uma proteína coberta por duxelles (refogado de cogumelos, échalotte, manteiga, ervas e pimenta-do-reino) assada em massa folhada. Contudo, o wellington tem como protagonista o filé mignon, carne menos geniosa, que ainda por cima ganha a proteção de uma capa espinafre e crepe.
Já o pithiviers é cheio das pegadinhas: não usa folhas para isolar a cocção, tem uma espessura de massa em baixo e outra em cima e é toda "riscada" à mão, com gestos precisos: "Não tem manual, é a experiência, o cuidado com os detalhes. É a essência de um verdadeiro bistrô francês".
Mais do que uma receita, um pithiviers é um espetáculo que só se revela no momento do corte - para felicidade ou tragédia do cozinheiro: "É o melhor prato do menu e quem conhece, valoriza. Outro dia vi o Daniel Boulud e fiquei muito feliz - um francês fazendo pithiviers no Brasil, outro ao mesmo tempo fazendo em Nova York. Você sente que é um trabalho que compensa".
A saber, no cardápio do Bistrot de Paris, ele aparece entre um Bœuf Bourguignon e um Confit de Pato Mulard com a seguinte descrição: Pithiviers de Codorna, Aspargos Grelhados, Sauce Demi-Glace e Azeite Trufado (R$ 126).
Bistrot de Paris
R. Augusta, 2542, Loja 12, Jardins. Seg., das 12h às 15h30; ter. e qua., das 12h às 15h30 e das 19h às 23h30; qui., das 12h às 23h30; sex. e sáb., das 12h às 00h; dom., das 12h às 15h. Tel.: (11) 3063-1675