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Paquera x assédio: Saiba como flertar de forma bacana

Combinação entre festas, bebida e multidão no Carnaval aumenta casos de assédio verbal e sexual

22 fev 2019 - 14h37
(atualizado às 19h53)
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Ao mesmo tempo em que se preparam para curtir os bloquinhos e toda a folia envolvida pelo carnaval, outra preocupação passa pela cabeça das mulheres: assédio.

De acordo com um estudo da ONG ActionAid, 53% das mulheres brasileiras entre 14 e 21 anos convivem diariamente com o medo de serem assediadas.

Blocos de carnaval ocupam algumas ruas do Rio de Janeiro
Blocos de carnaval ocupam algumas ruas do Rio de Janeiro
Foto: Fernanda Dias / Agência O Dia / Estadão

A porcentagem é mais que o dobro quando comparada a de países como Quênia (24%), Índia (16%) e Reino Unido (14%). Além disso, 78% das entrevistadas disseram ter sofrido assédio nos últimos seis meses.

Os números assustam ainda mais quando nos aproximamos de eventos como o carnaval, em que a combinação de bebida, festas e multidão aumenta os casos de assédio contra mulheres.

Uma iniciativa da Amaro para esse carnaval, por exemplo, reforça a importância de esclarecer que a culpa não é da vítima, muito menos da roupa que ela está usando. Em parceria com o coletivo feminista Não é Não, a marca lançou uma tatuagem temporária com a frase 'Minha roupa não é um convite'. Serão dez mil tattoos distribuídas gratuitamente para evitar casos de assédio no carnaval.

Não é não

"Quando fui perceber, já estava no chão sendo chutada e agredida. Bati minha cabeça no chão, chutavam minha barriga e meu rosto. Quando meus amigos me tiraram daquela situação, logo percebi que além de ser espancada, tinham levado meu celular novinho".

O relato de Julia Serra, de 16 anos, ilustra o que acontece com milhares de vítimas espalhadas pelo Brasil quando se recusam a ficar com algum homem. Como parte da campanha #Nãoénão, contra o assédio no carnaval em 2018, ela publicou o depoimento em sua conta no Facebook e recebeu milhares de curtidas e comentários.

Quando tinha 19 anos, a estudante Amanda Verniano foi assediada durante uma viagem de carnaval ao Rio de Janeiro. Ela usava um cropped (blusa que deixa parte da barriga à mostra) para desfilar em um bloquinho de rua quando foi surpreendida por um "homem bêbado de 20 e poucos anos" abrindo o zíper de sua blusa.

"Tentei bater nele e a única menina do grupo deles veio defendê-lo. Eu disse chorando de nervoso: 'você é mulher, você sabe o que ele fez, você não pode defender isso'. Quando eu disse isso, acho que ela percebeu e se afastou com os meninos, que continuavam rindo e achando engraçado ter aberto a minha roupa. Eu fiquei tão nervosa que infelizmente não consegui reagir contra o cara da maneira que eu gostaria", recordou.

Carina**, de 20 anos, também passou por momentos de tensão no carnaval há três anos. Ela conta que estava na Vila Madalena, bairro paulistano conhecido pelos barzinhos e agitado durante o carnaval, quando sofreu assédio por parte de um amigo de escola.

"Ele disse que havia algo no meu olho e pediu pra fechar os olhos que tiraria pra mim. Quando fechei, ele tentou me beijar e agarrar e eu o empurrei assim que ele segurou minha cabeça", explicou, acrescentando que sofreu uma segunda tentativa de assédio poucos minutos após o ocorrido, dessa vez por outro homem.

Mulheres relataram terem sido insultadas com palavras de baixo calão ao recusarem e, até mesmo, serem presas contra a parede pelo abusador. Outras disseram que, quando afirmam ter namorado ou namorada, os homens costumam perguntar onde está a aliança ou pedem desculpas ao parceiro, quando na verdade é a mulher que merece as desculpas pelo inconveniente.

É paquera ou assédio?

Em tempos de feminismo e empoderamento, muitos homens podem se sentir, de certa forma, "perdidos" na hora de iniciar uma conversa com uma mulher com o intuito de ficar com ela. Para esclarecer o que pode ou não nesse jogo da conquista, conversamos com as youtubers Luci Gonçalves e Maíra Medeiros, que produzem conteúdo sobre empoderamento e auxiliam mulheres a alcançarem seu espaço na sociedade. Ao apresentar sete hipóteses, pedimos para que dissessem: é paquera ou assédio?

O homem me abraça enquanto estamos 'trocando ideia' no bloquinho:

Luci Gonçalves: "Se ele não tem intimidade com você, é assédio".

Maíra Medeiros: "Se a mulher não quiser ser abraçada, ela tentar se soltar e o cara insistir é assédio. Se ela retribuir o abraço, não é".

O homem puxa meu cabelo como forma de chamar minha atenção:

Luci Gonçalves: "Assédio. Seu corpo é seu e isso é um ato muito violento".

Maíra Medeiros: "Assédio e violência contra a mulher".

O homem pega pela cintura como forma de chamar minha atenção:

Luci Gonçalves: "Assédio. Bem característico. Não precisa tocar pra chamar atenção de ninguém".

Maíra Medeiros: "Assédio".

O homem pega na minha mão enquanto estamos conversando:

Luci Gonçalves: "Assédio. Não tem necessidade de encostar sem antes perguntar se pode".

Maíra Medeiros: "Se a mulher não retirar a mão e não evitar o toque, não é assédio".

O homem pede meu telefone enquanto estamos conversando:

Luci Gonçalves: "Ótima forma de avançar na paquera e ter chances de se estender para outros bloquinhos ou quem sabe para depois do carnaval".

Maíra Medeiros: "Não é assédio".

O homem tenta colocar a mão por baixo da minha roupa enquanto conversamos:

Luci Gonçalves: "Assédio. Não tem nem desculpa, errou feio, errou rude!".

Maíra Medeiros: "É assédio e tentativa de estupro, inclusive".

O homem puxou assunto por causa da minha fantasia:

Luci Gonçalves: "Se ele não sexualiza seu corpo, pode ser um ótimo jeito de começar uma paquera".

Maíra Medeiros: "Se ele não estiver de alguma forma tentando usar a fantasia da mulher pra justificar que ela deve ser 'fácil' ou qualquer coisa assim, não é assédio".

Respeito à mulher: como flertar de forma bacana no carnaval?

"Uma das formas mais legais é brincar! Carnaval é sobre se divertir e chegar em alguém pode ser muito divertido. Elogie, de forma educada, a fantasia, o bloco que estão, ou reclame da marchinha machista que insistem em tocar. Faça algo para os dois rirem da situação", sugere a youtuber Luci Gonçalves, dona de um canal sobre beleza, estilo de vida e empoderamento que acumula mais de 250 mil inscritos.

Ela também indica a boa e velha conversa: "Chegue perto dos amigos, pergunte se a amiga é solteira e se há alguma possibilidade de uma conversa", sugestão apontada também por Maíra Medeiros, criadora do canal Nunca Te Pedi Nada. "Troca de olhares, troca de sorrisos e chegar perguntando o nome são os primeiros passos de uma abordagem saudável e muito respeitosa", completa.

Outra questão que pode pairar na cabeça dos homens é acreditar que as mulheres estão fazendo charme quando dizem 'não'. Para contornar essa situação e, principalmente, quebrar esse tabu, Maíra diz: "Sejam bem diretas no 'não'. Não sorria, não mude o timbre de voz, porque muitos caras acham que isso é o famoso charme. Tudo isso mostra que muito da responsabilidade do assédio ainda recai sobre as mulheres, enquanto ninguém se preocupa em orientar os homens", reflete.

Assédio sexual: como reagir?

Por segurança, Maíra sempre aconselha que as mulheres pulem carnaval em grupos de três ou mais pessoas, "para que nunca uma fique em alguma 'emboscada' ou encurralada por algum cara que não entende que não é não". Outra possibilidade é levar um apito pendurado no pescoço: em caso de abordagem violenta, o barulho pode chamar a atenção das suas amigas e de outras pessoas do local, assim como assustar o abusador.

Uma parceria entre o Google e a ONG feminista Think Olga também pode ajudar em casos de assédio. Ao falar "Ok Google, como reportar assédio sexual" para o Google Assistente, o celular traz os contatos da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (180) e da Polícia Militar (190), além de indicar o site da Think Olga para mais informações sobre o tema. No site da ONG, as pessoas podem descobrir mais sobre os exemplos de conduta de assédio sexual, como acolher as vítimas dessa violência, como denunciar e suas implicações jurídicas.

Desconstrução do machismo

Acumulando mais de 1,4 milhões de inscritos no YouTube, a dupla Edson Castro e Leonardo Filomeno tocam o canal Manual do Homem Moderno. O bate papo entre homens transita de forma descontraída entre temas como relacionamento, moda, sexo e universo masculino, sem deixar de lado a importância da desconstrução do machismo nos dias atuais.

Com uma resposta didática e clara, Edson expõe a melhor maneira de paquerar uma mulher sem ser invasivo: "O Carnaval por si só já é uma data onde as pessoas estão mais abertas para conhecer, conversar e se divertir. Porém, isso não dá a ninguém a autorização de chegar pegando, agarrando ou beijando. O segredo está na boa e velha comunicação não-verbal. Troca de olhares, sorrisos e até mesmo a dança, são boas portas de entrada para puxar um papo, fazer um elogio e, até mesmo, lançar um 'quebra gelo'. Se houver um 'mínimo' sinal de interesse, a outra parte vai ser bem receptiva. A minha dica principal vem do filme Hitch, O Conselheiro Amoroso. Nele, o personagem do Will Smith dá uma dica de ouro: "O segredo do beijo é avançar 90% do caminho". Viu a garota, rolou um clima e puxou um papo legal? Você pode tomar a iniciativa e ver se ela entra no jogo também. Caso role uma negativa, hora de seguir com o bloco".

* Estagiária sob supervisão de Charlise Morais

** Nome fictício a pedido da entrevistada

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Estadão
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