Script = https://s1.trrsf.com/update-1765224309/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

A inveja nossa de cada dia

Aristóteles, quem diria, ajuda a explicar este vil pecado tão comum em nossa rotina

6 jun 2023 - 06h00
Compartilhar
Exibir comentários
Foto: Adobe Stock

Salve, salve!!! Salve-se quem puder.

Quem nunca invejou alguém que atire a primeira pedra. A Inveja é um sentimento que ninguém gosta de falar. Travestido de admiração, ela corrói a alma, penetra nos ossos, afia nossas línguas e cospe impropérios infindáveis contra aquele ou aquela.

Ah, a grama do vizinho...

Schadenfreude

Na definição clássica, a inveja é “a tristeza pelo bem de outra pessoa”. O invejoso se sente mal vendo o outro se dando bem, não consegue ficar feliz ao ver o sucesso alheio.

O seu oposto é a caridade, o desapego e até mesmo o altruísmo.

A língua alemã tem uma palavra específica para isso: Schadenfreude. É o prazer e a satisfação com a desgraça e a derrota alheia. O famoso “bem feito”.

É como se a vitória de alguém significasse uma punhalada nas costas ou uma derrota pessoal do invejoso. Assim, a inveja é a dor experimentada pela boa sorte ou o prazer pela infelicidade dos outros.

Na Bíblia temos o primeiro homicídio relatado: “Caim matou o próprio irmão Abel porque Deus gostou mais dos sacrifícios deste.”

Em Pedro 2:1, há uma advertência sobre a inveja: “Livrem-se, pois, de toda maldade e de todo engano, hipocrisia, inveja e toda espécie de maledicência.”

Outra menção a Inveja pode ser encontrada em Gálatas 5:26: “Não sejamos presunçosos, provocando uns aos outros e tendo inveja uns dos outros.”

Aquele seu colega de trabalho, um pantola completo, é promovido após seis meses na empresa e você ali, ralando há três anos, e nada.

O bar está lotado. O sujeito lá da frente pega dois chopes reluzentes e passa por você com um sorriso colgate, salivando de alegria.

Um Porsche 911 Targa impecável rasga a avenida da cidade com um ronco sensual chamando a atenção de todos. Você quase tem torcicolo ao olhar e se  pergunta quem é aquele sortudo.

Só porque o bestunto na sua frente subiu as escadas um pouquinho mais rápido e conseguiu pegar as portas do metrô fechando a tempo de entrar no vagão, você fica ali, parado na plataforma, vendo o trem sumir no horizonte e só imaginando o sorriso de sarcasmo e satisfação do elemento.

É a última coxinha da bandeja e aquela tia robusta, parruda, uma bruzundunga, aparentemente lenta, aérea e desligada, que num movimento de ninjago enfia o braço roliço por baixo do suvaco do garçom e sequestra a derradeira iguaria antes de você. Sua vontade é de esganar a desgraçada, mas ao olhar para o lado, diplomaticamente você tenta se concentrar no solo de “Do you wanna dance”. No fundo, deseja com todas as suas forças que a tiazona tropece em algo se espatifando na pista de dança. De preferência com a coxinha alojada em sua testa.

Este sentimento tão poderoso e presente no nosso dia a dia, quer você queira ou não, é a Inveja!!!

Aristóteles

No artigo “What is Envy?” publicado por Brett & Kate McKay, percebemos que apesar da inveja ser um sentimento comum, ninguém gosta de falar sobre ela.

Raramente alguém admite “estou realmente frustrado e triste pois aquela pessoa tem algo que eu não tenho”. Isso nos diminui e nos faz sentir menores em relação àquela pessoa.

Existem poucos livros sobre o assunto. Os filósofos Nietzsche e Kierkegaard escreveram muito sobre a inveja e seu papel na vida humana, bem como Kant e Bacon. Mas foi Aristóteles quem dedicou mais tempo e energia à inveja em seu livro “Retórica”.

A clássica definição do filósofo grego para o nobre pecado é: “A inveja é a dor pela boa sorte dos outros.”

Saber quem nós invejamos também é importante. Segundo o grego fodão estudioso, temos essa emoção vil em relação aos nossos pares. Não invejamos Elon Musk ou Jeff Bezos, apesar de serem milhões de vezes mais ricos do que nós, mas sim aquele colega de trabalho ou o vizinho do 602, aquele nerd da escola que hoje é o CEO de uma corretora de criptomoedas. São nossos pares os alvos do infâme pecado.

Mesmo se o cara tiver um padrão de vida semelhante ao seu, mas segue outra carreira, você não o inveja. Digamos que você é um escritor em busca da primeira publicação. Um conhecido é dono de restaurante e acaba de ser premiado como o melhor da cidade em sua categoria. Você fica genuinamente feliz por ele já que não compete contigo.

Porém, se aquele ex-colega de faculdade, jornalista mediano, blogueirinho salafrário, consegue um contrato com uma editora para publicar seu primeiro livro, você vai se corroer de inveja até sobrar só o pó.

Pra fechar, e de novo segundo Aristóteles, o motivo pelo qual sentimos inveja apenas em relação aos nossos iguais próximos é que isso nos faz pensar: “Poderia ter sido eu!” Você olha para o cara que se deu bem e pensa: “Eu sou como aquele cara. Se ele teve sucesso, arrebentou a boca do balão, eu também deveria ter!” Mas você não tem, e isso dói pra cacete!!!

Então meus caros, muito cuidado ao sentir inveja de alguém por qualquer motivo que seja. Olhe-se no espelho, aprecie a bela Vida ao seu redor, seja grato pelo que tem e busque o suficiente para viver com dignidade e conforto.

É um sentimento que te corrói por dentro e não te leva a lugar algum.

A inveja é uma merda!!!

Para ler, ver e ouvir

Livro: Mal Secreto (1998) de Zuenir Ventura. “A inveja é inconfessável, mas ninguém se livra dela, por mais que se disfarce. É o pecado mais antigo da Humanidade”.

Assim o mestre Zuenir define o pecado capital mais comum e conhecido nos levando ao universo misterioso e impenetrável da Inveja.

Mistura de relatos pessoais e ficção, segundo o autor devido ao fato que ninguém realmente admite ser invejoso, o livro passeia por livrarias em Paris, revela uma série de entrevistas, vai a psicanalistas, igrejas e terreiros diversos até se deparar com Kátia, jovem estonteante da Baixada Fluminense.

Filme: Amadeus (1984) de Milos Forman, a celebrada e hoje esquecida cinebiografia do gênio compositor austríaco Wolfgang Amadeus Mozart.

Salieri, seu maestro e mentor, logo percebeu o imenso e precoce talento do garoto de Salzburg. O professor viu que o menino era um prodígio ao analisar suas partituras quando ainda era um adolescente. Percebendo que seria impossível competir com tamanha força da natureza, Salieri foi aos poucos controlando, influenciando e sabotando o gênio da música clássica.

Reza a lenda, não comprovada, que Salieri envenenou e matou Wolfgang. Fato é que ao voltar de Praga o músico estava muito doente e ficou hospedado na casa de seu mentor. Este teria se desdobrado em cuidados ao pupilo. Tudo fachada para eliminar a fonte de tanta inveja.

Música: Bike, a banda de rock psicodélico de São José dos Campos conquista o mundo e a inveja de seus pares.

O recém lançado quinto álbum de estúdio “Arte Bruta” só confirma o talento desta banda fundada em 2015 e formada por Julito Cavalcante (voz, guitarra e violões), Diego Xavier (voz, guitarra, baixo e violões), Daniel Fumega (bateria) e João Gouvea (baixo).

(*) Pedro Silva é engenheiro mecânico pela PUC/MG, PhD em Materiais pelo Max Planck Institut (MPIe) de Düsseldorf, vive em Viena na Áustria, detesta os invejosos e escreve semanalmente a newsletter Alea Iacta Est.

Homework Homework
Compartilhar
Publicidade

Conheça nossos produtos

Seu Terra












Publicidade