PUBLICIDADE

Parabólica

Como funciona o câmbio semiautomático na Fórmula 1

Uma das maiores invenções da categoria é o câmbio “borboleta” usado nos dias atuais. Mas como ele surgiu?

19 jan 2022 - 08h30
Compartilhar
Exibir comentários
Cockpit do Red Bull de Sebastian Vettel
Cockpit do Red Bull de Sebastian Vettel
Foto: Cedrico Ramírez / Flickr

A F1 sempre teve inovações tecnológicas ao longo de sua história. Uma das mais importantes usadas por todas as equipes hoje em dia é o câmbio semiautomático. As mudanças ajudaram na questão de agilidade, já que os pilotos não precisam mais tirar a mão do volante para trocar a marcha, além de não se errar a marcha, o que muitas vezes poderia gerar a quebra do câmbio. Neste formato, o piloto troca as marchas por duas alavancas localizadas atrás do volante.

Para entender como funciona esse mecanismo, antes é preciso esclarecer que motores a combustão tem uma faixa de torque muito pequena. No caso de uma ligação direta com as rodas, o carro demoraria muito para chegar em uma velocidade onde estaria em uma faixa ideal de RPM (Rotações Por Minuto), fora que provavelmente não conseguiria subir uma elevação. Nesse sentido, para evitar que isso aconteça, existe a transmissão. 

A transmissão fica entre o motor e o eixo de transmissão,  controlando o torque e a velocidade que vão para as rodas motrizes. Ou seja, as rodas dão tração aos carros. No caso da F1, desde os anos 70, são permitidas apenas que as duas rodas traseiras cumpram essa função, sendo a tração 4x4 proibida.

Explicando basicamente o mecanismo de uma transmissão, o que ela faz é multiplicar a força nas primeiras marchas. Isso se estabelece por uma relação de um sistema de engrenagens: as primeiras marchas tem uma relação de transmissão de uma engrenagem menor para uma maior, sendo que com isso se diminui a velocidade da transmissão e se aumenta a força (torque) que vai para as rodas. Nas últimas marchas, a relação se inverte, priorizando mais a velocidade do que a força.

Mas para que exista a troca de marcha, é necessário que se interrompa o fluxo de potência do motor para a transmissão. Não seria um processo muito prático ter que desligar o motor para isso. Por isso existe a embreagem, que tem essa exata função. Obviamente, ela tem que ser acionada em todas as partidas e trocas de marcha. Mas e se não existisse essa necessidade?

A primeira equipe a trabalhar com algo neste tipo foi a Lotus, com seu modelo 76, que seria usado em 1975. O carro tinha dois pedais de embreagem: um para a elevação de marcas e outro para as reduções. Mas não deu muito certo, junto com o carro.

Um pouco depois, a Ferrari começou a desenvolver um sistema neste sentido em 1978, quando Mauro Forghieri estava à frente do departamento técnico do time. Alguns testes foram feitos em Fiorano com Gilles Villeneuve, mas a equipe chegou à conclusão que não existia tecnologia na época e o projeto ficou arquivado. Em 1986, o projetista da McLaren, John Barnard, pensou em um sistema que já era possível na época, em parceria com a empresa alemã Bosch, porém mais voltado para otimizar a aceleração.

Mas o britânico saiu da equipe e foi contratado pela Ferrari no fim de 1986. Em suas mãos, o projeto da marca italiana ressuscitou depois de nove anos arquivado. Barnard pensou em um sistema onde o piloto só usaria a embreagem quando acelerasse a partir do repouso. Dali em diante, nas mudanças de marchas o sistema deveria fazer isso sozinho. A ideia era que o piloto ganhasse tempo com isso, focando somente na pilotagem. Ele queria que isso fosse implementado nos carros de 1988. Mas foi convencido que a inovação só iria para a pista em 1989, quando os motores mudariam de turbo para aspirados.

Foi um ano de desenvolvimento e o engenheiro ainda queria se livrar do espaço que o câmbio ocupava no cockpit, para melhorar a aerodinâmica. Foi por conta disso que se chegou ao sistema das alavancas atrás do volante. Além de atingir sua finalidade, tornaria o sistema muito mais ágil, além do piloto não precisar tirar a mão do volante. Eram três alavancas: uma para subir a marcha, outra para reduzir e outra que seria a da embreagem, só usada para dar partida.

Durante os testes, foi usado um carro híbrido de desenvolvimento, chamado de Ferrari 639, que já usava o motor 3.5 V12 que seria implementado no modelo de 1989. Os pilotos de teste foram o brasileiro Roberto Moreno e o italiano Dario Benuzzi.

A Ferrari finalmente apresentou o modelo 640 para a temporada 1989.Com a vinda de Nigel Mansell da Williams e mantendo Gerhard Berger, a equipe achava que poderia lutar pelo campeonato naquele ano, acabando com o jejum que na época durava 10 anos sem títulos de pilotos.

Gerhard Berger com a Ferrari 640 no GP da Bélgica de 1989
Gerhard Berger com a Ferrari 640 no GP da Bélgica de 1989
Foto: Wikimedia Commons

Os testes em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, onde acontecia parte da pré-temporada, não foram animadores: o sistema quebrava muito, além de problemas no motor, que era pouco potente. Mansell já estava desconfiado que as coisas não dariam certo. Mas para a surpresa dele e de todos na Ferrari, na primeira corrida, o GP do Brasil, Mansell, que largara em sexto, levou o carro até o final e conseguiu a vitória..

Apesar do início animador, a sequência não foi nada boa: foram 19 abandonos entre Mansell e Berger em 16 etapas, muitas delas causadas pelo câmbio semiautomático. Parte desses problemas só foram resolvidos na metade da temporada, quando a Ferrari identificou problemas nas baterias que alimentavam o sistema.

Apesar disso, a ideia ganhou adeptos: em 1991, a Williams também apareceu com o mesmo sistema, porém em uma versão mais compacta, mais parecida com o que é usado hoje em dia. A inovação ganhou espaço: em 1993, quase todas as equipes do grid já tinham um sistema do tipo. A última vitória de um carro com câmbio manual foi em 1992, com Michael Schumacher no GP da Bélgica e a última vez que o sistema manual foi usado, foi em 1995, pela equipe italiana Forti.

Nos modelos de rua, o sistema que é também chamado de paddle shift, é usado em todos os carros esportivos da atualidade e em muitos modelos mais básicos. Realmente, esta é uma das boas histórias de aplicações tecnologias da F1 em carros de rua.

Parabólica
Compartilhar
Publicidade
Publicidade