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Com US$ 1 bilhão da Microsoft, laboratório quer simular o cérebro

Objetivo é que Open AI persiga a ideia de uma inteligência artificial parecida com a de humanos

4 ago 2019 - 05h07
(atualizado às 11h12)
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Quando a garçonete se aproximou da mesa, Sam Altman levantou o telefone. Isso tornou mais fácil mostrar o valor em dólares digitado no contrato de investimento que ele passou negociando com a Microsoft nos últimos 30 dias.

"US$ 1.000.000.000", era o que se lia.

O investimento da Microsoft, firmado no início de julho, sinaliza uma nova direção para o laboratório de pesquisa da Altman.

Em março, Altman deixou suas funções diárias como chefe da Y Combinator, a aceleradora de startups que o catapultou para a elite do Vale do Silício. Agora, aos 34 anos, ele é o diretor executivo do OpenAI, o laboratório de inteligência artificial que ele ajudou a criar em 2015 com Elon Musk, o bilionário e presidente executivo da fabricante de carros elétricos Tesla.

Musk deixou o laboratório no ano passado para se concentrar em suas próprias ambições de inteligência artificial na Tesla. Desde então, a Altman reformulou a OpenAI, fundada como uma organização sem fins lucrativos, tornando-a uma empresa com fins lucrativos, para que pudesse buscar financiamento de forma mais agressiva. Agora, ele conseguiu um importante investidor para ajudá-lo a perseguir um objetivo absurdamente elevado.

Ele e sua equipe de pesquisadores esperam construir inteligência geral artificial, ou AGI, uma máquina que poderá fazer qualquer coisa que o cérebro humano faça.

A AGI ainda tem ares de ficção científica. Mas em seu acordo, a Microsoft e a OpenAI falam que ela pode ser aplicada a qualquer outra tecnologia, seja um serviço de computação em nuvem ou um novo tipo de braço robótico.

"Minha meta com o funcionamento da OpenAI é criar com sucesso uma AGI amplamente benéfica", disse Altman em uma entrevista recente. "E essa parceria é o marco mais importante até agora nesse caminho."

A corrida pela inteligência artificial

Nos últimos anos, uma pequena, mas fervorosa comunidade de pesquisadores de inteligência artificial voltou suas atenções para a AGI e conta com o apoio de algumas das empresas mais ricas do mundo. DeepMind, um dos principais laboratórios da empresa controladora do Google, diz que está perseguindo o mesmo objetivo.

A maioria dos especialistas acredita que a AGI não será alcançada por décadas ou mesmo séculos - se é que chegará a ser alcançada. Mesmo Altman admite que a OpenAI pode nunca chegar lá. Mas a corrida continua, mesmo assim.

Em uma entrevista conjunta por telefone com Altman, o presidente executivo da Microsoft, Satya Nadella, mais tarde comparou a AGI aos esforços de sua empresa para construir um computador quântico, uma máquina que seria exponencialmente mais rápida do que as máquinas de hoje. "Quer seja a nossa busca pela computação quântica ou uma busca pela AGI, acho que você precisa dessas estrelas guia de alta ambição", disse ele.

A empresa de 100 funcionários da Altman criou recentemente um sistema que poderia bater os melhores jogadores do mundo em um videogame chamado Dota 2. Há alguns anos, esse tipo de coisa não parecia possível.

A OpenAI dominou o game graças a uma técnica matemática chamada aprendizado por reforço, que permite que as máquinas aprendam tarefas por meio de tentativas e erros extremos. Ao jogar o jogo repetidas vezes, peças automatizadas de software, chamadas agentes, aprenderam quais estratégias são bem-sucedidas.

Os agentes aprenderam essas habilidades ao longo de vários meses, acumulando o equivalente a mais de 45 mil anos de jogo. Isso exigiu enormes quantidades de poder computacional bruto. A OpenAI gastou milhões de dólares alugando acesso a dezenas de milhares de chips de computador dentro dos serviços de computação em nuvem administrados por empresas como Google e Amazon.

No final, acreditam Altman e seus colegas, eles poderão construir a AGI de maneira similar. Se eles conseguirem coletar dados suficientes para descrever tudo aquilo que os humanos lidam diariamente - e se eles tiverem poder computacional suficiente para analisar todos esses dados - eles acreditam que podem reconstruir a inteligência humana.

Altman pintou o acordo com a Microsoft como um passo nessa direção. À medida que a Microsoft investe no OpenAI, a gigante de tecnologia também trabalhará na construção de novos tipos de sistemas computacionais que poderão ajudar o laboratório a analisar quantidades cada vez maiores de informações.

"Trata-se de ter realmente esse estreito ciclo de feedback entre uma busca ambiciosa pela AGI e aquele que é o nosso core business, que é construir o computador do mundo", disse Nadella.

Esse trabalho provavelmente incluirá chips de computador projetados especificamente para o treinamento de sistemas de inteligência artificial. Como o Google, a Amazon e dezenas de startups em todo o mundo, a Microsoft já está explorando esse novo tipo de chip.

Para onde vai o bilhão

A maior parte desse US$ 1 bilhão, segundo Altman, será investida no poder de computação que a OpenAI precisa para atingir suas ambições. E sob os termos do novo contrato, a Microsoft se tornará a única fonte de poder computacional do laboratório.

Nadella disse que a Microsoft não investirá necessariamente US$ 1 bilhão de uma só vez. Poderia ser distribuído ao longo de uma década ou mais. A Microsoft está investindo dólares que serão realimentados em seu próprio negócio, já que a OpenAI adquire poder de computação da gigante do software, e a colaboração entre as duas empresas pode render uma ampla gama de tecnologias.

Como a AGI ainda não é possível, a OpenAI está começando com projetos mais restritos. Construiu um sistema recentemente que tenta compreender a linguagem natural. A tecnologia poderia alimentar de tudo, desde assistentes digitais como Alexa e Google Home até software que analisa automaticamente documentos dentro de escritórios de advocacia, hospitais e outras empresas.

O acordo também é uma maneira de essas duas empresas se promoverem. A OpenAI precisa de poder de computação para atingir suas ambições, mas também deve atrair os principais pesquisadores do mundo, o que é difícil de fazer no mercado atual de talentos. A Microsoft está competindo com Google e Amazon na computação em nuvem, onde os recursos de inteligência artificial são cada vez mais importantes.

Busca pode ser impossível

A dúvida é saber até que ponto devemos levar seriamente a ideia da inteligência geral artificial. Como outros na indústria de tecnologia, Altman frequentemente fala como se seu futuro fosse inevitável.

"Acho que a AGI será o desenvolvimento tecnológico mais importante da história humana", disse ele durante a entrevista com Nadella. Altman aludiu às preocupações de pessoas como Musk que a AGI poderia sair fora de nosso controle. "Descobrir uma maneira de fazer isso vai ser um dos desafios sociais mais importantes que já enfrentamos."

Geoffrey Hinton, o pesquisador do Google que recentemente ganhou o Prêmio Turing - muitas vezes chamado de Prêmio Nobel da computação - por suas contribuições à inteligência artificial nos últimos anos, foi questionado recentemente sobre a corrida para a AGI.

"É um problema dos grandes", disse ele. "Eu preferiria focar em algo em que você pudesse saber como você poderia resolvê-lo". A outra dúvida em relação à AGI, ele acrescentou, é: por que precisamos disso?/ TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO

Estadão
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