Investidores denunciam calote no mercado imobiliário no Rio Grande do Sul
Empreendimento na capital gaúcha está no centro de disputa que envolve milhares de investidores e compradores de imóveis
Um empreendimento no bairro Jardim do Salso, em Porto Alegre, está no centro de uma disputa que ameaça o mercado imobiliário do Rio Grande do Sul. De um lado, estão milhares de pessoas de todo o país, que investiram em um fundo que viabilizou a construção do edifício, além dos compradores dos apartamentos. De outro, a incorporadora que deveria ter repassado os recursos ao fundo, mas que embolsou os valores, gerando um imbróglio que chegou aos tribunais.
O caso envolve o edifício Life.co, erguido pela Infinita Incorporadora, que também é responsável pelos projetos Infinita Parque e Town.co. A empresa foi ao mercado buscar recursos para a construção dos empreendimentos. Para tanto, foram constituídos fundos imobiliários geridos pela securitizadora HabitaSec, que tem mais de 10 anos de atuação e mais de 250 operações como CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários).
Uma dessas operações, por meio da emissão de CRIs, viabilizou as obras da Infinita - com os imóveis sendo garantias para o financiamento, por meio de alienação fiduciária. Os valores das vendas das unidades deveriam ser depositados em uma conta centralizadora, como determina a legislação para o reembolso dos investidores - em sua maioria, pessoas físicas, poupadores e empreendedores. No entanto, vários dos apartamentos negociados tiveram os recursos desviados para outras contas, lesando quem investiu nos CRIs e, também, os adquirentes dos imóveis.
"A Infinita pegou o dinheiro dos investidores e dos compradores dos apartamentos - e colocou no bolso. E tem feito de tudo para não devolver os valores, lesando pessoas de todo o país que colocaram seu dinheiro nisso, seja para investir em um fundo imobiliário, seja para ter seu próprio imóvel", afirma Tiago Munoz, advogado que representa a HabitaSec.
A securitizadora vem tentando recuperar os recursos de acordo com o que está na lei, com a excussão extrajudicial das garantias - ou seja, a execução da dívida, uma vez que a Infinita não pagou o devido. Isso levou à autorização do leilão extrajudicial dos apartamentos do Life.co.
O certame deveria ter ocorrido em janeiro, mas foi suspenso por decisão de primeiro grau. A HabitaSec obteve efeito suspensivo junto a uma desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e, assim, o leilão foi remarcado para o dia 8 de agosto. No entanto, nova decisão da magistrada determinou que isso aconteça apenas quando o caso for julgado pelo colegiado da 17ª Câmara Cível do TJRS.
O advogado ressalta que a empresa não pretende prejudicar os compradores dos imóveis do Life.co. "Estamos seguindo o que diz a lei para recuperar os valores que nos são devidos. Os investidores e os compradores são vítimas dos atos da Infinita - e queremos somar forças para assegurar os direitos legais e contratuais de todos os afetados", enfatiza Tiago.
Ele esclarece que a HabitaSec não tem qualquer gestão sobre o empreendimento, que é de responsabilidade da Infinita. Inclusive, o prédio hoje tem sofrido com a falta de arrecadação para a manutenção do condomínio, prejudicando serviços essenciais como segurança e limpeza.
Caso aconteça o leilão, aqueles que quitaram os imóveis junto à conta centralizadora da operação não terão suas unidades envolvidas. Em relação aos promitentes que tiveram os recursos da venda desviados pela Infinita, estes deverão exigir da incorporadora a indenização do valor investido, uma vez que não foi seguido o que era previsto em contrato.
Tiago afirma que espera um resultado favorável para a HabitaSec no Judiciário, especialmente considerando um julgamento recente da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça. A turma reconheceu que a Súmula 308 da Corte, frequentemente usada em favor de eventuais terceiros que não efetuaram os pagamentos corretamente e tentam registrar os imóveis, não é aplicável para casos em que as unidades estão em garantia de financiamentos por meio de alienação fiduciária.
O advogado alerta ainda para o risco que esse imbróglio traz ao mercado imobiliário do Rio Grande do Sul. "É uma situação que traz uma enorme insegurança jurídica, que pode encarecer ou até mesmo afastar investimentos no Estado. Os CRIs são muito usados para financiar a construção de imóveis, mas temos este caso em que uma incorporadora desvia os valores que deveriam ser destinados aos investidores - e o tema se arrasta na Justiça. Ninguém quer financiar algo com esse nível de risco. Ao final, isso poderá encarecer os empreendimentos no RS", pontua.