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Diretor da OEA repudia "narrativa da fraude" nas eleições

Para Gerardo de Icaza, a palavra 'fraude' contamina a confiança no processo de escolha dos representantes

25 set 2018 - 07h50
(atualizado às 09h47)
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A palavra "fraude" é a mais contagiosa a ser dita durante o período eleitoral e contamina a confiança no processo de escolha dos representantes. A avaliação é de Gerardo de Icaza, diretor do Departamento de Cooperação e Observação Eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA).

"Infelizmente é um discurso que chega a ouvidos que depois duvidam do processo", disse o especialista em direito eleitoral, que vê a existência da "narrativa da fraude" em países da região. "Há candidatos que antes, durante e depois do processo eleitoral dizem que houve fraude", afirma Icaza, que defende que é necessário separar o que é uma acusação fundamentada em dados e a "narrativa da fraude" usada politicamente.

Urna eletrônica brasileira
Urna eletrônica brasileira
Foto: Willian Moreira / Futura Press

Em seu gabinete no prédio da OEA, em Washington, Icaza explicou ao "Estado" como será a missão do organismo que vai observar as eleições brasileiras pela primeira vez neste ano e disse que, nesse momento, não há uma preocupação com a segurança das urnas eletrônicas brasileiras. No final de agosto, ele esteve no Brasil para uma visita da chefia da missão a autoridades brasileiras e teve uma explicação "no detalhe" sobre o funcionamento da urna eletrônica. "O Brasil tem que valorizar os avanços democráticos que já teve", afirmou o diretor, que já liderou cerca de 50 missões de observação em mais de 20 países.

O que significa o convite do Brasil à OEA para observar as eleições de 2018?

Do nosso ponto de vista, é uma amostra de maturidade democrática, uma prova de transparência no processo eleitoral e também de abertura. Nós achamos isso muito positivo e para a OEA é uma missão histórica.

Há uma avaliação sobre qual modelo de voto é ideal para evitar fraudes?

O melhor sistema é o que dá confiança para o eleitor, o que possibilita que todos que devem votar possam votar e que possibilite a expressão da vontade popular. Não fazemos uma avaliação se o sistema eletrônico ou em papel é melhor.

A eleição presidencial de 2014 foi questionada no TSE. Recentemente, um dos candidatos na corrida presidencial de 2018 falou em risco de fraude na eleição. Qual a sua avaliação sobre a segurança do sistema eleitoral brasileiro?

Depois de 2014, houve uma auditoria no Brasil e a auditoria se saiu bem. Então existe a possibilidade de investigar os resultados e isso é positivo em qualquer democracia. Em segundo lugar, sobre as acusações, entendo que não há uma acusação concreta ou formal sobre um tema específico da urna. Temos que diferenciar entre as denúncias que são específicas, concretas, técnicas e as denúncias políticas. E há denúncias políticas de fraude em todos os processos da região.Há candidatos que dizem antes, depois, durante o processo eleitoral que houve fraude, inclusive existe a expressão da "narrativa de fraude". Falamos disso aqui nos Estados Unidos, mas também no Equador, em muitos lugares. Quando fomos na visita preliminar no Brasil, tivemos uma demonstração da urna muito longa, de várias horas, com a equipe especializada na urna no TSE, conseguimos usar a urna, o sistema. A explicação foi ao total e absoluto detalhe. Neste momento, não temos uma preocupação sobre a segurança da urna

A "narrativa de fraude", como você chama, afeta os sistemas eleitorais?

Temos que fazer uma diferenciação entre uma narrativa de fraude e uma acusação séria quando há evidência de fraude. Não podemos dizer que nunca nenhuma acusação tem fundamentos, mas deve ser uma acusação que vem com provas, com elementos técnicos. Mas "fraude" é a palavra mais contagiosa numa eleição e infelizmente é um discurso que chega a ouvidos que depois duvidam do processo. Isso é negativo, porque todo processo eleitoral tem um elemento de confiança.

Quais sinais vê na democracia brasileira?

A democracia brasileira tem elementos fortes que, às vezes, estando no País, os brasileiros talvez não percebam ou não valorizem tanto como deveriam. Há uma liberdade de imprensa muito marcada, há uma divisão de poderes das mais fortes claramente da América Latina e uma justiça e sistema eleitoral também fortes que, durante muitos anos, têm dado resultados para a população brasileira. Minha mensagem seria que o Brasil tem que valorizar os avanços democráticos que já tiveram e continuar cuidando dessa democracia.

A observação da OEA dá respaldo à eleição no Brasil?

Há uma tríade da transparência eleitoral, que é observação eleitoral nacional e internacional; meios de comunicação e imprensa com livre acesso ao sistema eleitoral; e a fiscalização pelos partidos políticos, que se controlam uns aos outros.Essa tríade dá garantias ao processo eleitoral. Inclusive, há demonstrações da urna eletrônica (brasileira) para jornalistas. Há demonstrações aos partidos políticos. Os partidos políticos têm direito a ter técnicos e engenheiros deles tendo acesso à apresentação da urna eletrônica e eles são os que devem decidir se a urna é segura ou não.

O que exatamente é verificado na missão?

A informação da missão vem de duas fontes: dos observadores e de um grupo de especialistas, que analisam áreas temáticas. No Brasil vamos analisar a organização eleitoral, a tecnologia eleitoral, a equidade de gênero na eleição, as condições de minorias afrodescendentes e indígenas, o financiamento eleitoral e levaremos também uma especialista em liberdade de expressão. Nós observamos o processo total e a finalidade é fazer recomendações para o processo melhorar.

Adotar as recomendações depende, então, do próprio país?

Sim. Mas há um relatório feito pela universidade de Harvard sobre a efetividade das nossas missões e na verdade cerca de 50% das recomendações são implementadas em um/ período curto de, se não me engano, 4 anos. É muito positivo.

A OEA pretende se manifestar em alguma dessas análises sobre a tentativa de candidatura do ex-presidente Lula, como fez órgão da ONU?

Não vamos falar de outro organismo, inclusive porque se apresentou uma série de recursos à ONU, o que não é o caso da OEA, e não nos cabe fazer julgamentos sobre decisões da justiça eleitoral brasileira. Nós respeitamos a justiça eleitoral e a justiça brasileira. Veremos todo o processo do registro de candidaturas, não só de um candidato ou de outro.

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