PUBLICIDADE

Floresta Amazônica: da Conquista à Integração (Parte II)

A busca da integração

10 set 2019 - 09h00
Compartilhar
Exibir comentários

“De fato, todo o vale amazônico, no seu conjunto, a parte visível, é imperturbavelmente idêntica a si mesmo, visto embora de varias latitudes.”

Vianna Moog, 1936

Foto: Reprodução

Há uma permanente preocupação das autoridades brasileiras, especialmente dos militares, de que se o Brasil não conseguir povoar e integrar economicamente a região amazônica, poderosos interesses estrangeiros tratarão de nos desqualificar da tarefa de guardá-la e resguardá-la. Imaginam ser possível sua internacionalização futura. A Amazônia poderia vir a ser “desnacionalizada” e dividida entre várias grandes corporações com interesse em explorá-la, basicamente em sua riqueza mineral. Outros cogitam dela transformar-se num “protetorado” da ONU.

Esse receio, da “perda” da Amazônia, parece-nos infundado visto que nos dias de hoje não dominam, entre as potências, idéias colonialistas ou  usurpadoras de apropriação direta de territórios. Além disso, a legislação brasileira permite a livre instalação e exploração de empresas estrangeiras. Porque elas haveriam de mobilizar expedições militares colonialistas se conseguem obter o que querem amparadas juridicamente nas concessões brasileiras? Também não se encontram entre os projetos da ONU nenhuma referência à organização internacional  assumir o controle da região amazonense num futuro próximo ou remoto. Militarmente a Amazônia é inconquistável, são milhões de km2 de florestas e de rios espantosos e com milhões de anticorpos que podem por fim a qualquer instalação que se proponha a se perpetuar.

De 1920 a 1960, pode-se dizer que a região amazônica, passada a fase da borracha, manteve-se ao largo do desenvolvimento do restante do país, reduzida a um estado de letargia econômica, um imenso Jardim do Paleozóico, como disse Euclides. Um acontecimento espetacular, porém, voltou a colocá-la  no cenário econômico e político nacional:  a fundação, em 21 de  abril de 1960, de Brasília, nova capital inaugurada no final do governo do Presidente Juscelino Kubischek. Com a mudança da sede do governo brasileiro para o interior do sertão brasileiro criou-se  uma vasta rede de rodovias ligando a nova capital com as demais partes da nação. Essa foi a razão de ser da Belém-Brasília, aberta entre 1958-1964, com, 1.604 km.,  a primeira ligação terrestre do Centro do país com a Amazônia. Posteriormente, no apogeu do regime militar, em 1972, em razão da política de integração nacional, cortou-se a região, no sentido leste-oeste, com uma estrada transversal, a Transamazônica, com 4.233 km, e outra no sentido sul-norte ligando Cuiabá a Santarém, com 3.467 km ( inconclusa). 

Políticas especiais de colonização, povoamento e eletrificação foram estimuladas pela SUDAM ( Superintendência da Amazônia), a partir de 1967, aceitando-se inclusive, na fronteira do Pará com o Amapá, a instalação do projeto Jari (um imenso complexo de produção de celulose) de propriedade do plutocrata americano Daniel Ludwig. Os resultados demorados estimularam a que se formasse uma Zona Franca em Manaus, usufruindo de isenção alfandegária para atrair indústrias e consumidores. A ZF de Manaus tornou-se uma reduzida ilha fabril e comercial cercada pela selva de todos os lados.

A facilitação na aquisição de terras para o gado gerou conflitos especialmente no Estado do Pará. Ao expandir a criação, os fazendeiros adotam as queimadas e a derrubada de arvores essenciais aos “povos da floresta”. Atritos entre garimpeiros e indígenas dão-se paralelos, desde então, aos ocorridos entre criadores e seringueiros, os quais conduziram ao assassinato do sindicalista Chico Mendes, em 1988, um internacionalmente reconhecido líder sertanejo defensor da floresta.

O Teatro Amazonas, em Manaus
O Teatro Amazonas, em Manaus
Foto: Reprodução

Além disso, particularmente no Pará, por décadas multiplicam-se os desacertos e crimes violentos que atingem os sem-terras mobilizados pela ação do MST, que terminam por enfrentar os pistoleiros de aluguel e as próprias autoridades policiais a serviço dos grandes proprietários.

Uma das maiores falácias a respeito da Amazônia é a da sua enorme riqueza agrária. Com algumas  exceções, o solo da região é classificado, em sua maior extensão, como laterítico. Removido o manto vegetal, sobra uma couraça ferruginosa de escasso valor agrícola. A vegetação luxuriante e variada é enganadora. Esconde o fato de que suas raízes enterram-se em areias. A floresta é alimentada pela água das chuvas tropicais e dela mesma, do seu húmus, da degradação das folhas e ramos que dela desprendem. Naturalmente que o mesmo não se aplica às estimativas das suas reservas minerais em ouro manganês, cassiterita, alumínio e ferro, especialmente como ocorre na Serra dos Carajás. Enquanto isto a Amazônia luta, tendo ao seu lado as poderosíssimas forças inerciais da natureza, por permanecer à margem da História quando num repente ela é colocada na ordem do dia por um motivo de política ambiental.

Bibliografia

Azevedo, Aroldo de (dir.) - Brasil, a terra e o homem. Cia. Editora Nacional, São Paulo, 1972, 2 vols. 2ª ed.  

Cardoso, Armando Levy - Toponímica brasílica. Biblioteca do Exército Editora, Rio de Janeiro, 1961

Costa, Craveiro – A conquista do deserto ocidental. São Paulo: Editora Nacional, 1940.

Cruls, Gastão -  Hiléia Amazônica. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1955;

Cunha, Euclides - A Margem da História. Editora Lello, Porto, 1967

Furtado, Celso – A Formação Econômica do Brasil. São Paulo: IBEP-Nacional, 2003.

Goodland, Robert e Irwin, Howard - A  Selva Amazônia: do inferno verde ao deserto vermelho? Editora Itatiaia, Belo Horizonte, 1975.

Hollanda, Sérgio Buarque (org.) História Geral da Civilização Brasileira; A Época Colonial, vol. 1, Difel, S.Paulo, 1972

Hollanda, Sérgio - Visão do Paraíso. Editora Nacional, São Paulo, 1969, 2ª ed.

IBGE - Tipos e aspectos do Brasil: excertos da Revista Brasileira de Geografia. Fundação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 1975

Moraes, Raymundo - O Amphitheatro Amazônico. Editora Melhoramentos, São Paulo, s/d.

Leite S.J., Serafim - História da Companhia de Jesus. Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, tomo III, 1943.

Reis, Arhtur Cezar Ferreira –  Limites e demarcações na Amazônia Brasileira. Belém: SECULT, 1993, 2 v.

Ribeiro, Darcy - Os índios e a Civilização. Editora Vozes, Petrópolis -RJ, 1977

Spix e Martius - Viagens pelo Brasil ( 1807-1820). Editora Melhoramentos, São Paulo, 1961, 2 vols. 

Soublin, Jean – História da Amazônia. Rio de Janeiro: Biblioteca Editora do Exército, 2003.

Tocantins, Leandro – O rio comanda a vida: uma interpretação da Amazonia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1983

Tocantins, Leandro – Euclides da Cunha e o Paraíso Perdido. Rio de Janeiro: Gráfica Record Editora, 1968.

Viana, Hélio - História das fronteiras do Brasil. Edição da Biblioteca Militar, Rio de Janeiro, 1948

Veja também

O drama da mulher em uma busca mundial por doador de células-tronco:
Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade
Publicidade