Celular na mochila: o que diz o decreto de Lula sobre o armazenamento dos aparelhos
Regulamentação da lei foi publicada nesta quarta, mas deixa decisão para Conselho Nacional de Educação, que pretende divulgar normas nos próximos dias
O decreto que regulamenta a lei que proíbe celulares nas escolas foi publicado nesta quarta, 19, no Diário Oficial da União, mas avança pouco em relação às dúvidas quanto a implementação da lei sancionada em janeiro.
Umas das questões indefinidas é o local onde os aparelhos devem ficar enquanto os estudantes estão em aulas. Muitas redes e escolas particulares têm permitido que eles permaneçam nas mochilas, enquanto alguns especialistas defendem que haja um armazenamento próprio, como armários ou caixas, que deixem o celular inacessível ao aluno.
O texto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) diz que "a forma de guarda dos aparelhos eletrônicos portáteis pessoais, para evitar que os estudantes os utilizem durante a aula, o recreio ou os intervalos entre as aulas" deverá seguir "as normas complementares e as orientações emitidas pelo Conselho Nacional de Educação".
O órgão, que tem um papel consultivo ao Ministério da Educação (MEC), deve divulgar até o fim da semana definições sobre o assunto. O Estadão teve acesso ao documento preliminar que foi apresentado no CNE na semana passada e fica clara que a posição é a de deixar a decisão sobre onde armazenar os celulares a critério das escolas.
"A gente não consegue visualizar toda a diversidade, todas as particularidades das escolas brasileiras, então fica difícil a gente estabelecer que a escola tem que guardar o celular na portaria ou que tem que ficar com o professor, ou na mochila. A gente compreende que cada região tem a sua realidade", disse ao Estadão membro do CNE e relator das normas sobre o assunto, Israel Batista. O texto ainda está recebendo contribuições e deve ser votado no CNE nesta quinta-feira, 20.
Estudos mostram que a mera presença próxima do smartphone pode reduzir a capacidade cognitiva dos alunos, prejudicando a aprendizagem, e fazer com que os alunos sintam necessidade de checar novas notificações. O celular na mochila também deixaria para os professores a função de fiscalizar o tempo todo se o aluno está burlando ou não a proibição, argumentam especialistas.
Por outro lado, diretores de escola mencionam a dificuldade logística de ter um espaço para os celulares, em especial em escolas com muitos alunos, e ainda com a garantia de que eles serão guardados em segurança.
Em São Paulo, a lei estadual menciona de forma clara que eles devem ficar em um lugar sem possibilidade de acesso. A deputada estadual Marina Helou (Rede), uma das autoras da legislação, entrou com representação no Ministério Público para que haja uma "correta implementação da lei" nas escolas públicas e particulares de São Paulo. Para ela, as que estão permitindo que os alunos deixem os aparelhos nas mochilas estão descumprindo a legislação.
"Ficar na mochila não traz a totalidade dos benefícios para a aprendizagem e para a capacidade de atenção dos alunos porque eles podem tentar ver uma mensagem, uma atualização, já que estão perto do celular", diz Marina. "A lei fala explicitamente que precisa ficar em um lugar sem possibilidade de acesso. A mochila é claramente um lugar acessível." A lei paulista foi sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) em dezembro.
Pode usar na hora da saída?
Outro assunto que deve estar presente nas normas do CNE é a permissão ou não do uso durante horário de saída. Como mostrou o Estadão, por causa de procedimentos comuns no fim do horário escolar, como chamar um carro de aplicativo, combinar com os pais sobre onde os filhos serão buscados ou sobre mudanças de planos, algumas escolas passaram a permitir a utilização de celulares em locais específicos.
Um colégio na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, criou um espaço só para recados rápidos aos pais na entrada e na saída, chamado de Mobile Zone, que já é comparado aos antigos fumódromos - ou "celulódromos".
A hora da saída também não foi mencionada no decreto de regulamentação assinado pelo presidente Lula. Segundo Batista, as normas do CNE devem autorizar que o uso seja, sim, permitido nesse momento dentro da escola, desde que as atividades pedagógicas já tenham se encerrado.
Saúde mental e educação midiática
O decreto de regulamentação, por outro lado, detalha melhor as exigências sobre medidas que as escolas particulares e redes de ensino devem implementar sobre saúde mental e educação midiática.
Afirma que as ações de conscientização sobre os riscos do uso dos aparelhos devem ser tema do "planejamento pedagógico anual".
E ainda que os professores devem receber formação sobre "educação digital para o uso seguro, responsével e equilibrado de aparelhos" e para saber identificar "sinais de sofrimento psíquico em estudantes" decorrente do uso dos celulares.
A regulamentação diz também as escolas precisam "promover espaços de escuta e garantir acolhimento aos estudantes, às professoras, aos professores e aos profissionais atuantes no estabelecimento de ensino que apresentem sinais de sofrimento psíquico relacionado ao uso de dispositivos digitais e às ofensas on-line".
Em caso de problemas de saúde mental, a escola poderá, segundo o decreto, recomendar o atendimento por profissional externo a estudantes e professores.
