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81 anos de CLT: a legislação brasileira acompanhou as mudanças nas relações de trabalho?

Normas existem desde 1943 e seguem sendo um principais instrumentos para garantia dos direitos do trabalhador no Brasil

1 mai 2024 - 05h00
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81 anos de CLT: como a legislação brasileira tem acompanhado as mudanças nos modos de trabalho
81 anos de CLT: como a legislação brasileira tem acompanhado as mudanças nos modos de trabalho
Foto: Reprodução/Getty Images

O Dia do Trabalhador é celebrado nesta quarta-feira, 1º de maio. Além do feriado, a data também marca a criação de uma das normas mais conhecidas do Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mais de 80 anos após a sua assinatura, o conjunto de leis segue essencial para o trabalhador brasileiro, mas é constantemente alvo de discussões. 

Assim como aprendemos na escola, a CLT (Decreto-Lei 5.452) é um dos frutos da Era Vargas e foi assinada no dia 1º de maio de 1943 pelo então presidente Getúlio Vargas. Segundo os especialistas entrevistados pelo Terra, a criação do conjunto de normas foi uma resposta a uma discussão que já ocorria no mundo todo e que fervia nas fábricas e sindicatos: melhores condições de trabalho. 

A ideia principal era reunir as leis trabalhistas existentes da época, bem como as que viessem no futuro. Além disso, o conjunto de normas buscava conter a diferença de classes e apostar no crescimento das indústrias, para diminuir a ocorrência de greves e insatisfação dos operários.

De acordo com o advogado Thiago Dória, também mestre em Direito, Governança e Políticas Públicas, a consolidação das normas foi e é vista como um grande avanço. 

"Getúlio Vargas, em 1943, concentra essa proteção e também inova ao transformar a Justiça do Trabalho em um órgão judicial, que até a década de 1930 era um órgão administrativo. Naquele momento, foi um documento pensado para as fábricas, para o trabalhador urbano industrial, e isso se reflete nas interpretações e até como olhamos para a CLT hoje", explica.

Apesar do foco inicial, com o passar dos anos a CLT aumentou seu alcance para todos os tipos de trabalhadores, conforme estabelecido no artigo 3º. O texto ressalta ainda que não há distinções quanto à espécie de emprego ou às condições do trabalho, seja intelectual, técnico ou manual. 

Junto com elas, há a garantia de diversos direitos. Alguns foram acrescentados com o passar dos anos, sendo os principais: 

  • Carteira de Trabalho: documento físico ou digital, que registra a trajetória profissional do trabalhador e garante acesso aos direitos já previstos na CLT; 
  • Jornada de trabalho: garantia de uma duração fixa de até 8 horas diárias do período de trabalho. Passado este tempo, é considerado hora extra, sendo elas não obrigatórias e deixando a critério do trabalhador aceitar ou não; 
  • Férias: direito de 30 dias de descanso remunerados após um ano de trabalho com carteira assinada;
  • Décimo terceiro salário: pagamento de gratificação em até duas parcelas da remuneração do trabalhador ao fim do ano; 
  • Seguro-desemprego: garantia de assistência financeira temporária igual ou equiparada ao salário anterior ao que recebia o trabalhador dispensado involuntariamente (sem justa causa); 
  • Licença-maternidade: direito à licença de 120 dias, sem prejuízo do emprego e do salário para pessoas gestantes;
  • Vale-transporte: garantia de despesas de deslocamento residência-trabalho e vice-versa;
  • FGTS: retirada de 8% do salário bruto do trabalhador, depositado pela empresa, com o intuito de garantir uma reserva de dinheiro e que pode ser resgatado pelo cidadão em momentos e períodos específicos, como demissões e doenças, entre outros. 

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Reforma Trabalhista de 2017

Em 81 anos de vigência, a CLT passou por algumas modificações, especialmente em 2017. Naquele ano, foi promulgada a Reforma Trabalhista, considerada a maior alteração feita à Consolidação das Leis do Trabalho, por ser a que gerou mais impactos. Na época, as novas normas tinham o intuito de flexibilizar o mercado e simplificar algumas relações entre trabalhador e empregado. 

Entre as mudanças, se destacam os acordos coletivos, que poderiam prever condições de serviços; jornadas de trabalho mais longa, além de oito horas, desde que respeitadas as 220 horas mensais; diferentes graus de insalubridade do ambiente de trabalho; e férias parceladas em até três vezes, entre outros. 

"A CLT tem vários dispositivos que poderiam ter sido atualizados e não foram, porque não houve um processo de atualização das normas de trabalho de uma maneira estruturada. Houve ali uma série de demandas de várias representações do campo político, mas que não posso dizer que foram debatidas e discutidas ou instruídas da melhor forma possível", avalia Thiago Dória. 

No ponto de vista do professor Rodolfo Mário Veiga Pamplona Filho, que também é juiz da 32ª Vara do Trabalho de Salvador, o conjunto de modificações tinham como intuito atualizar e reformular a CLT, mas isso ocorreu de forma precipitada. 

"É algo que a gente não pode fechar os olhos. Algumas dessas modificações foram feitas de forma muito rápida, sem ter tido tempo de um aperfeiçoamento e um aprofundamento. E vemos, nos últimos anos, uma sequência de trechos da reforma trabalhista que serão declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, a questão dos danos extrapatrimoniais, a gratuidade judiciária. Há nesse ponto uma postura que é preciso maturar e continuar o aperfeiçoamento", comenta. 

Normas existem desde 1943 e segue sendo um principais instrumentos para garantia dos direitos do trabalhador no Brasil
Normas existem desde 1943 e segue sendo um principais instrumentos para garantia dos direitos do trabalhador no Brasil
Foto: Reprodução/Getty Images

81 anos depois, ainda estamos avançando? 

Apesar de promulgada em 1943, é por causa das contínuas alterações que especialistas ouvidos pelo Terra consideram atual e necessária para o mercado de trabalho. Paradoxalmente, no entanto, essa mesma legislação tem sido desvalorizada.

"As pessoas vêm falando justamente que a legislação trabalhista está ultrapassada diante do mercado de trabalho atual, mas isso não se sustenta no meu entendimento. [...] Hoje é muito relevante destacarmos a preocupação dos próprios trabalhadores que dizem às vezes que não querem ser CLT como se o CLT trouxesse um aprisionamento dessas pessoas a determinado empregador ou contratante. Quando, na verdade, vemos que essas pessoas estão aprisionadas de forma muito pior", destaca a presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luciana Paula Conforti. 

Conforti se refere ao crescente número de brasileiros que têm buscado o sustento principal fora dos padrões da CLT, como o trabalho por meio de aplicativos, atuação como pessoa jurídica e vários tipos de "bicos". Segundo ela, a legislação reconhece a necessidade dessas pessoas, contudo, também observa que essas pessoas se submetem a longas jornadas, sem folgas ou horários de almoço definidos. Além disso, também não possuem direitos trabalhistas como o décimo terceiro, férias ou a garantia de uma previdência. 

De acordo com dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através do módulo Teletrabalho e Trabalho por Meio de Plataformas Digitais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, em 2022, o Brasil tinha 1,5 milhão de pessoas que trabalhavam por meio de plataformas digitais e aplicativos de serviços, o equivalente a 1,7% da população ocupada no setor privado.

Deste número, cerca de 52,2% (ou 778 mil) exerciam o trabalho principal por meio de aplicativos de transporte de passageiros e 39,5% (ou 589 mil) eram trabalhadores de aplicativos de entrega de comida, produtos etc. Os trabalhadores de aplicativos de prestação de serviços somavam 13,2% (197 mil).

Desse total, a maioria é do sexo masculino e com níveis de escolaridade intermediário. Mais de 70% deles trabalhavam por conta própria e 9,3% eram empregados do setor privado sem carteira assinada.

"Apesar dos 81 anos da CLT valorizarem os direitos trabalhistas, vejo que também temos que continuar defendendo um trabalho digno e decente, independente de qualquer coisa. É muito importante que a gente volte a saber quais eram as reivindicações e por que as leis vieram: para acalmar o mercado de trabalho e as empresas conseguirem produzir para que nós cresçamos enquanto país. E agora vemos uma justificativa totalmente oposta, de que essas proteções trazem retrocesso ou atraso, o que é uma questão que não encontra nenhum fundamento", defende Luciana Paula Conforti, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). 

A pauta tem sido discutida pelo governo federal, que tenta regulamentar direitos trabalhistas dos motoristas de aplicativos, mas vem enfrentando uma série de críticas por representantes da classe. O Projeto de Lei Complementar 12/2024, também chamada de PL dos Aplicativos, tem como principais pilares a garantia de ganho mínimo de R$ 32; transparência quanto ao que foi pago em cada corrida pelo passageiro e a divisão entre empresa e motorista; e definição de 12 horas diárias de trabalho, entre outros.

Caso aprovado pelo Congresso Nacional, os trabalhadores entrarão na categoria "trabalhador autônomo por plataforma". 

Fonte: Redação Terra
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