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Julgamento do Mensalão

Barroso critica sistema penal e pede para Brasil 'virar página' do mensalão

Novo ministro do Supremo Tribunal Federal garantiu que a presidente Dilma Rousseff não tocou neste assunto nas conversas antes de sua indicação

7 jun 2013 - 19h02
(atualizado às 19h48)
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<p>"Gostaria que o País virasse rapidamente essa página", disse novo ministro do STF, Luís Roberto Barroso, sobre o julgamento do processo do mensalão</p>
"Gostaria que o País virasse rapidamente essa página", disse novo ministro do STF, Luís Roberto Barroso, sobre o julgamento do processo do mensalão
Foto: Eugenio Novaes / Divulgação

O novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou nesta sexta-feira que o País precisa superar a discussão sobre o mensalão. Com sua posse marcada para o dia 26 de junho, Barroso reuniu um grupo de jornalistas em seu escritório em Brasília para dizer, entre outras coisas, que há assuntos mais relevantes a serem enfrentados pelo Judiciário do que o escândalo de corrupção que resultou na condenação de 25 pessoas ligadas ao governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

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“Eu não estou indo para o Supremo para julgar o mensalão. Se pudesse escolher, escolheria ir logo depois do julgamento. O STF discute inúmeras questões mais importantes para a vida das pessoas. Gostaria que o País virasse rapidamente essa página”, disse o novo ministro.

Durante sua sabatina no Senado, no início da semana, Barroso reafirmou uma declaração dada no final do ano passado, quando disse que o julgamento feito pelo Supremo tinha sido um “ponto fora da curva”. Questionado se a declaração havia sido uma crítica, o ministro disse se tratar de uma análise descritiva do fato e que a opinião é compartilhada até por outros ministros do Supremo.

“De fato, disse que o Supremo foi mais duro ao julgar o mensalão do que havia em sua média histórica. Disse, e por dever de honestidade, não posso desmentir. Mas o comentário não foi crítico, foi descritivo de um fato que, a meu ver, é observável a olho nu. E essa opinião é também de outros ministros”, afirmou.

Até mesmo por ter observado mudanças na jurisprudência do Supremo no caso específico do mensalão, Barroso afirmou que vai passar os próximos dois meses estudando a fundo o caso. Seguro de que não discutirá teses já exauridas durante o julgamento, o novo ministro vai se ater à participação na discussão dos embargos declaratórios e infringentes que podem modificar as penas aplicadas aos crimes de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Foro privilegiado

Ciente de que a carga de trabalho no STF será grande - são mais de 8 mil processo à sua espera -, Barroso também defende mudanças na definição do foro privilegiado. Para o novo ministro, os tribunais superiores não estão estruturados para funcionar como instância ordinária, colhendo provas, ouvindo testemunhas e fazendo perícias.

“Acho que (os tribunais superiores) devem decidir questões de direito, e não de fato. De modo que sou, sim, a favor de uma redução drástica do foro. Essa não é uma competência do Supremo, é do Congresso. Mas acho que deveria reduzir o número de pessoas que tem direito a foro privilegiado”, disse Barroso, ressaltando que alguma autoridades, especialmente o presidente da República e ministros, precisam de proteção institucional, justamente porque são muito visadas.

Desigualdades no sistema penal

Barroso disse ainda que não é um especialista em direito penal, mas não deixou de eleger justamente o sistema punitivo como um dos maiores problemas do Judiciário brasileiro. Para o novo ministro, a justiça penal é “desarrumada” e “estratificada por classes”.

“Fato real é que somos punitivos seletivamente. Na justiça penal, a estratificação de classes é muito evidente. O sistema punitivo tem quatro estações: a polícia, o Ministério Público, a magistratura e o sistema penitenciário. O MP e a magistratura vivem, a meu ver, um bom momento institucional. Mas a porta de entrada, que é a polícia, e a de saída, que é o sistema penitenciário, vivem momentos difíceis”, analisa o novo ministro do Supremo.

Para Barroso, a melhoria na eficiência do sistema punitivo passa por uma maior valorização da polícia, especialmente com salários mais dignos e mais investimento em equipamentos, e das penitenciárias, consideradas por ele como um “universo de degradação humana”.

“O sistema penitenciário não realiza, como regra geral, um de seus papéis mais importantes que é a ressocialização dos presos. Pelo contrário. Quem entra no sistema, como regra feral, sai bem pior de quando entrou. Esta circunstância contribui também para o sentimento de impunidade que a sociedade brasileira tem. Isso porque muitas vezes os juízes buscam qualquer saída razoável para não mandar uma pessoa para o sistema, porque sabe que isso significará a destruição de uma vida”, explicou.

Como alternativa à superlotação dos presídios e à falta de investimento do governo no aumento do número de vagas no sistema penitenciário, Barroso sugere a adoção de prisões domiciliares com monitoramento eletrônico nos crimes de menor potencial ofensivo. Até por conta do déficit de vagas, e por não acreditar na ressocialização dos presos diante do atual sistema, Barroso sinaliza contrariedade à ideia da redução da maioridade penal. Ele apenas não dá uma resposta incisiva por acreditar que a discussão acabará no Supremo.

O mensalão do PT

Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson. Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas. A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão.

Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.

No dia 17 de dezembro de 2012, após mais de quatro meses de trabalho, os ministros do STF encerraram o julgamento do mensalão. Dos 37 réus, 25 foram condenados, entre eles Marcos Valério (40 anos e 2 meses), José Dirceu (10 anos e 10 meses), José Genoino (6 anos e 11 meses) e Delúbio Soares (8 anos e 11 meses). A Suprema Corte ainda precisa publicar o acórdão do processo e julgar os recursos que devem ser impetrados pelas defesas dos réus. Só depois de transitado em julgado os condenados devem ser presos.

Fonte: Terra
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