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Política

Juízo político ou jurídico? De Delcídio a Aécio, senadores mudam de posição sobre decisão do STF de afastar congressista

BBC Brasil compara votação do Senado que manteve Delcídio do Amaral preso, em 2015, com a que devolveu mandato a Aécio Neves (PSDB), na noite de terça; ao todo, 55 senadores participaram das duas votações.

18 out 2017 - 08h48
(atualizado às 09h24)
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Muitos senadores que votaram por manter prisão de Delcídio defenderam Aécio na terça.
Muitos senadores que votaram por manter prisão de Delcídio defenderam Aécio na terça.
Foto: BBC News Brasil

Passava pouco das 6h da manhã quando o ex-senador Delcídio do Amaral (então filiado ao PT) foi preso em um quarto do hotel Golden Tulip em Brasília, a poucos quilômetros do Palácio da Alvorada. Na tarde do mesmo dia, em novembro de 2015, os colegas do ex-petista no Senado decidiram mantê-lo preso.

O placar foi motivo de frustração para o futuro delator da Lava Jato. Só 13 senadores votaram por tirá-lo da cadeia, e 59 decidiram mantê-lo preso na superintendência da Polícia Federal. Até alguns colegas do PT votaram contra ele.

A BBC Brasil comparou a votação que manteve Delcídio preso com a que anulou as medidas tomadas pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG), na noite de terça-feira. Ao todo, 55 senadores participaram de ambas as decisões.

A maioria mudou conforme as cores partidárias do colega em apuros: 35 senadores mudaram de voto. Integrantes de legendas como o PSDB, PMDB e DEM votaram contra Delcídio do Amaral e a favor de Aécio Neves, enquanto senadores do PT fizeram o caminho inverso.

Um dos que mudou de posição foi o tucano Paulo Bauer (SC). Ele se sentiu mal durante um almoço da bancada de seu partido, e foi hospitalizado no começo da tarde. Mas voltou ao Senado no começo da noite desta terça-feira para votar a favor de Aécio. Em 2015, o tucano votou por manter o petista Delcídio na cadeia.

Juízo político ou jurídico?

Ironicamente, petistas que defenderam Delcídio do Amaral, em 2015, bradaram contra o "corporativismo" ao votar pelo afastamento de Aécio. Enquanto isso, tucanos que votaram pela manutenção da prisão do petista enxergaram "exageros" nas medidas tomadas contra o senador do PSDB.

O juízo sobre a "gravidade" dos feitos de Delcídio e Aécio também variou conforme o partido de quem fazia a avaliação. Para o senador petista Humberto Costa (PT-PE), por exemplo, as acusações contra o tucano são "mais graves".

"Nós não estamos aqui movidos pelo ódio (ao votar contra Aécio), mas não podemos estar também movidos pelo corporativismo ou pelo partidarismo. E falamos isso com a coragem de quem - nós, a bancada do PT e mais alguns companheiros, João Alberto (Souza), Roberto (Rocha, do PSB-MA) - votou contra a prisão de Delcídio", disse ele ao votar pelo afastamento do senador do PSDB.

Já o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que votou pela prisão de Delcídio do Amaral, não viu necessidade de afastar Aécio Neves.

Lindbergh Farias e Humberto Costa, ambos do PT, votaram a favor de Delcídio, mas contra Aécio.
Lindbergh Farias e Humberto Costa, ambos do PT, votaram a favor de Delcídio, mas contra Aécio.
Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

"O Senado precisa ficar de pé, o Senado tem de ter a grandeza de entender este momento. Quero dizer aos senhores e às senhoras: eu vou votar 'não'. Dizer 'não' hoje é a responsabilidade de quem tem um mandato popular, para fazer justiça", disse.

Delcídio do Amaral foi preso preventivamente em 2015 acusado de atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato. Em uma gravação, ele apareceu oferecendo R$ 50 mil mensais à família de Nestor Cerveró para tentar convencer o ex-diretor da área internacional da Petrobras a não fechar um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF).

Na época, Delcídio ainda não havia sido denunciado. Por sua vez, Aécio foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos crimes de obstrução de Justiça e organização criminosa.

Segundo a PGR, o tucano pediu e recebeu R$ 2 milhões da JBS como propina e atuou em conjunto com o presidente Michel Temer para obstruir as investigações da Lava Jato. Os dois negam as acusações.

Pau que dá em Chico, dá em Francisco...

Senador Ronaldo Caiado foi de cadeira de rodas ao Senado votar.
Senador Ronaldo Caiado foi de cadeira de rodas ao Senado votar.
Foto: Agência Senado

Ao mesmo tempo, 20 senadores votaram da mesma forma tanto no caso de Delcídio quanto no de Aécio. Destes, 16 defenderam a prisão de Delcídio e o afastamento de Aécio.

Foi o que fez outro senador com problemas de saúde, Ronaldo Caiado (DEM-GO). Fazendeiro, Caiado estava afastado do Senado desde a última sexta-feira (13).

Ele se acidentou enquanto tentava amansar uma mula em sua fazenda, no município de Mara Rosa, em Goiás. Fraturou o ombro. Em uma cadeira de rodas e usando tipoia, Caiado apareceu no Senado para votar contra Aécio.

Também votaram contra o ex-petista e o tucano os senadores Acir Gurgacz (PDT-RO); Ana Amélia (PP-RS); Lasier Martins (PSD-RS); Lídice da Mata (PSB-BA); Paulo Paim (PT-RS); Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Roberto Requião (PMDB-PR), Romário (PSB-RJ) e outros.

Salve geral

Ao mesmo tempo, há um grupo de quatro senadores que votou contra a prisão de Delcídio em 2015 e contra o afastamento de Aécio imposto pelo STF, nesta terça.

Um deles é o presidente do Conselho de Ética do Senado, João Alberto Souza (PMDB-MA). Cabe ao peemedebista dar andamento às investigações contra colegas acusados de quebrar o decoro parlamentar, e analisar representações contra senadores.

Além de João Alberto e Roberto Rocha, também votaram a favor de Delcídio e de Aécio os senadores Telmário Mota (PTB-RR) e Fernando Collor de Mello (PTC-AL), ex-presidente da República.

Partidos

Assim como aconteceu com os senadores individualmente, a maior parte das siglas mudou de orientação nos dois casos. De dez legendas que participaram das duas votações, só três orientaram os parlamentares da mesma forma nos dois casos. As outras sete mudaram de posicionamento.

Foi o caso do PT e do PSDB: tucanos e petistas defenderam os respectivos filiados, e pediram a cabeça do senador da sigla adversária. O PRB orientou da mesma forma que os tucanos nas duas ocasiões.

Já o PMDB, maior partido do Senado (com 22 representantes), orientou seus senadores a votar a favor do tucano de Minas Gerais. No caso de Delcídio, o PMDB tinha liberado seus senadores.

DEM e PSD, que tinham pedido expressamente a cabeça de Delcídio, fizeram o caminho contrário e liberaram seus congressistas para votar como quisessem no caso de Aécio.

Somente PSB, Rede e PSC orientaram seus parlamentares a votar contra os colegas em 2015 e nesta terça-feira.

*Colaborou Nathalia Passarinho, da BBC Brasil em Londres

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