PUBLICIDADE

Política

Governo centraliza entregas do PAC 2 e é acusado de fazer campanha no PR

Eventos centralizados causam transtornos a prefeituras do interior do PR. Líder do PPS na Câmara vê campanha eleitoral antecipada

28 set 2013 - 08h58
(atualizado às 08h58)
Compartilhar
Exibir comentários
Entusiasta da candidatura da ministra Gleisi, a prefeita de Campo Mourão, Regina Dubay, posa ao lado de máquinas que não serão destinadas a seu município
Entusiasta da candidatura da ministra Gleisi, a prefeita de Campo Mourão, Regina Dubay, posa ao lado de máquinas que não serão destinadas a seu município
Foto: Ascom/Prefeitura de Campo Mourão / Divulgação

No inicio de outubro, o prefeito Milton Paizani (PSDB), de Rio Negro - município localizado a 112 quilômetros de Curitiba -, será obrigado a se deslocar 482 quilômetros até o município de Campo Mourão, na região centro-oeste do Paraná, para receber as chaves de uma motoniveladora, prevista para ser entregue em uma solenidade da segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), com data ainda não definida oficialmente. Dois meses antes, Paizani tinha cumprido agenda semelhante a 132 quilômetros de sua cidade. Em julho, em Campo Largo, na região metropolitana de Curitiba, ele recebeu as chaves de uma retroescavadeira ofertada pelo mesmo programa do governo federal. Paizani, que administra um pequeno município de 30 mil habitantes, na divisa entre Paraná e Santa Catarina, está preocupado com o custo do transporte da máquina até Rio Negro. "Ainda estamos cotando, mas vai sair muito caro", prevê.

Ao contrário de Paizani, a viagem do prefeito de Mamborê, Nei Calori (PPS), será bem mais curta. Para obter a motoniveladora, ele vai precisar percorrer 35 quilômetros até Campo Mourão. Em agosto, porém, Calori viajou até Toledo, a 188 quilômetros de sua cidade, para receber a retroescavadeira do PAC 2 em evento com a presença da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann (PT), apontada como candidata ao governo do Estado em 2014, que ganhou destaque na imprensa paranaense pelo tom de campanha eleitoral adotado pelo ex-senador do Paraná e atual vice-presidente de Agronegócios do Banco do Brasil, Osmar Dias (PDT), cotado para ser vice na chapa de Gleisi.

Durante a entrega das máquinas, Dias fez severas críticas ao atual governo de Beto Richa (PSDB) e sentenciou: "permaneci três anos calado, mas agora vou abrir a cartilha e falar". Calori que estava entre os demais prefeitos do Estado no local, não conseguiu prestar atenção no discurso. A preocupação dele era com o valor do transporte da máquina até Mamborê. "Tivemos que gastar R$ 2 mil", revela.

Em Rio Negro, o prefeito demonstra estar conformado com a situação. "É a questão política. Querem reunir os prefeitos numa cidade só, e talvez vá estar lá até a presidente, eu não sei como é que é. Mas nós temos que ficar satisfeitos de receber, não é? Nós temos que nos virar...". Paizani acredita ser "um erro" do governo federal a entrega das máquinas pesadas distantes dos municípios beneficiados. "Poderiam regionalizar e fazer a entrega próximo dos municípios", afirma ele. Em Mamborê, Calori também discorda da logística de entrega do PAC 2. "Creio que sairia mais barato enviar as máquinas direto para os municípios. Se quisessem fazer um evento político, poderiam chamar somente os prefeitos e fazer a entrega simbólica das chaves. Mas não tem como discutir isso. A decisão vem de cima", diz ele.

Em Brasília, o líder do PPS na Câmara, deputado federal Rubens Bueno, que tem sua origem política e base eleitoral em Campo Mourão, acusa o governo federal de fazer campanha antecipada utilizando investimentos do PAC 2. "Isto é comprovadamente campanha eleitoral antecipada. O governo Dilma está em campanha para a reeleição e tem utilizado sistematicamente eventos oficiais para isso. O objetivo é beneficiar os candidatos apoiados pelo governo. É um grande comício pago com o dinheiro dos cofres públicos para a campanha da Dilma e  da ministra Gleisi, no caso do Paraná. O PAC 2 não é obra exclusiva do governo Dilma, que necessitou de apoio do Congresso para ser aprovado. É irresponsabilidade utilizar o programa para tentar persuadir os eleitores antes do período eleitoral", diz Bueno.

Coincidências

As entregas de máquinas do PAC 2 já realizadas em Campo Largo e Toledo e a que está prevista para Campo Mourão são marcadas por coincidências. As três cidades, sede das entregas, não foram contempladas com os equipamentos do programa do governo federal, que tem como alvo municípios de até 50 mil habitantes, fora de regiões metropolitanas. Além disso, as prefeituras anfitriãs são comandadas por aliados do governo federal.

Em Campo Largo, o prefeito Affonso Portugal Guimarães pertence aos quadros do Partido dos Trabalhadores (PT). Em Toledo, o prefeito Beto Lunitti (PMDB) foi eleito por uma coligação que teve o PT como integrante e a ministra da Casa Civil como uma das principais apoiadoras. O mesmo ocorre em Campo Mourão, onde a prefeita Regina Dubay (PR) defende publicamente a candidatura de Gleisi e faz oposição ao governo Beto Richa (PSDB). Mesmo sem seu município ter direito às máquinas, Regina chegou a posar para fotos em cima de uma carreta que fazia o transporte de motoniveladoras. A prefeita aguarda ansiosa a visita da ministra da Casa Civil e a anunciada presença de Dilma. Em julho, ela já havia anunciado a presença das duas na Festa Nacional do Carneiro no Buraco. As manifestações de ruas ocorridas naquele mês, no entanto, acabaram cancelando a visita.

Na carona do evento que vai entregar 179 equipamentos (103 motoniveladoras, 32 caminhões caçamba e 44 retroescavadeiras) para 154 prefeituras paranaenses a um custo estimado de quase R$ 56 milhões, políticos ligados ao governo federal distribuem informações não confirmadas e gerando dúvidas para as prefeituras. O prefeito de Rio Negro diz ter sido comunicado pela assessoria do senador Sergio Souza (PMDB-PR) que o evento será realizado no dia 1º de outubro.

A mesma informação foi transmitida pelo deputado Zeca Dirceu (PT) durante entrevista uma emissora de rádio do município de Tibagi, a 310 quilômetros de Campo Mourão. Na entrevista gravada e adicionada a seu site, o filho do ex-ministro Zé Dirceu diz que "Tibagi estará recebendo sua patrola, com certeza, das mãos da ministra Gleisi Hoffmann" e anunciou a provável presença de Dilma no evento.

A assessoria do vice-presidente da Câmara Federal, deputado André Vargas (PT), também tem enviado notas à imprensa anunciando a entrega dos equipamentos para o primeiro dia de outubro. Em comum, os três políticos marcaram presença em todas as solenidades de entrega das máquinas no Estado e já confirmaram presença em Campo Mourão ao lado da ministra Gleisi.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), responsável pela distribuição das máquinas do PAC 2, não confirma a data anunciada pelos políticos. Em e-mail encaminhado ao Terra, a assessoria do ministro Pepe Vargas, informa que a data "prevista" é 4 de outubro, mas a programação não consta ainda da agenda do ministro porque depende do cronograma da chegada das máquinas em Campo Mourão. A assessoria do MDA também não confirmou a presença da presidente Dilma no evento. De acordo com o e-mail, o PAC 2 vai entregar no total 1.101 equipamentos no Paraná (367 retroescavadeiras, 367 motoniveladoras e 367 caminhões caçamba) em investimento total previsto para o estado de R$ 292,8 milhões.

Campo Mourão e as demais cidades que sediaram as entregas foram escolhidas pelos critérios de "infraestrutura, logística e distribuição", segundo resposta do MDA. A assessoria informa que as entregas dos equipamentos para as prefeituras não ocorrem no mesmo evento "porque as licitações para compra dos equipamentos são realizadas em datas diferentes, por lotes, com percentuais mensais de entrega e as empresas que fabricam as retroescavadeiras não são necessariamente as mesmas que fabricam as motoniveladoras e os caminhões".

Na entrega prevista para Campo Mourão, as retroescavadeiras e motoniveladoras são fornecidas pela mesma empresa: a fabricante Caterpillar. Parte das máquinas é produzida em Campo Largo - que sediou as entregas de julho - e as demais em Piracicaba, no interior de São Paulo. Sem definição da data de entrega, as máquinas estão paradas no parque de exposições Getúlio Ferrari há quase 20 dias.

"Vai chegar um pouco tarde para readequação de algumas estradas rurais neste ano. Estamos quase no inicio do plantio da safra e os produtores preferem que a prefeitura trabalhe no período de inverno. Algumas vezes temos que entrar com as máquinas nas propriedades e, durante o plantio, os proprietários impedem para evitar danos na área. Mesmo assim, será bem vinda", diz o prefeito Nei Calori, que aguarda a motoniveladora estacionada tão próxima de seu município.

"Bizarrice"

Para o cientista político Luiz Domingos Costa, pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e mestre em Ciências Políticas do grupo Uninter, a entrega de equipamentos do PAC 2 da forma como está sendo realizada pode se configurar claramente em campanha eleitoral antecipada. "Isto é uma bizarrice. Seria mais lógico, ágil e econômico a entrega direta aos municípios, mas como as máquinas não têm placas de grande visibilidade, não atende aos interesses eleitorais. Esses eventos mascaram, na verdade, a oportunidade dos políticos e futuros candidatos de estarem próximos das pessoas para fazer o corpo-a-corpo eleitoral e influenciar lideranças."

Costa diz que a prática é comum no Nordeste e está sendo implantada no Paraná, centralizando em grandes eventos a entrega de obras do governo federal. "O PT conhece o poder do PSDB no Estado e tem que alavancar a provável candidatura da ministra Gleisi. Sem contar com a entrega de grandes obras, o governo utiliza esses eventos para tentar impressionar o eleitor, vendendo o grande espetáculo. A procura por cidades administradas por aliados no interior está focada na imagem destas lideranças locais, já que, ao contrário das grandes metrópoles, onde a disputa é polarizada entre siglas partidárias, nas cidades menores o voto é motivado por pessoas com identificação com o eleitor. Não acredito, porém, que a tática tenha sucesso, pois o voto focado na pessoa não está ligado a uma transferência de popularidade para outros. Mas pode convencer alguns, especialmente líderes que acreditem que possam obter benefícios para seus municípios ao presenciar a presença de tantas pessoas nestes grandes eventos. A prática, porém, não é privilégio apenas do governo federal", diz o cientista político.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade
Publicidade