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Cidades

Morto aos 54, Elias Maluco foi personagem da crônica policial do Rio por mais de 20 anos

Elias Pereira da Silva ocupava o posto da gerência do tráfico no Complexo do Alemão quando Tim Lopes foi capturado por criminosos. Em 2005, traficante foi condenado a 28 anos e seis meses de prisão. Ele morreu nesta terça-feira em um presídio federal

23 set 2020 - 16h11
(atualizado às 16h49)
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RIO - Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, com o peito curvado quase 90 graus em relação à cintura, braços algemados nas costas, de bermuda, sem camisa e descalço, chegou olhando para o chão e escoltado por policiais civis da Coordenação de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil do Rio. Na sala, repórteres aguardavam, em um dia do fim de setembro de 2002, a "apresentação" do assassino do colega Tim Lopes, repórter da TV Globo que desaparecera no início de junho na Vila Cruzeiro, na Penha, zona norte do Rio.

Elias, apontado como responsável pelo crime, caíra após três meses de caçada. Ali, seria submetido ao que, ao ser preso em uma casa no Complexo do Alemão, pedira que não ocorresse, em frase que ficou famosa. "Perdi, chefia. Só não me esculacha, não", disse aos policiais.

A humilhação diante dos jornalistas marcou a prisão do traficante morto na última terça, 22, na cadeia federal de Catanduvas, Paraná. Era um personagem da crônica policial carioca desde os anos 90 do século passado, quando o crime no Rio tinha algo de espetáculo, com ações de cunho quase de sombria propaganda.

Elias tinha 54 anos e chegou a ser acusado da morte de quatro policiais militares na Praça Catolé do Rocha, em 1993, o que negava. O crime é considerado estopim da Chacina de Vigário Geral, um massacre de 21 moradores da comunidade, na madrugada de 29 de agosto de 1993. Foi cometido pelo grupo de extermínio Cavalos Corredores, formado por policiais militares, em represália contra a morte de colegas.

O traficante Elias era "gerente" do tráfico de drogas em Vigário Geral. Assumiu a chefia suprema do crime na comunidade depois da morte do homem conhecido como Flávio Negão, que até então comandava a quadrilha que dominava a região. Foi quando teria se tornado próximo de Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, da cúpula da facção. Quando Marcinho foi preso, Elias assumiu a gerência do tráfico no Alemão, com domínio sobre mais de 20 comunidades.

Ocupava esse "posto" quando Tim foi capturado por criminosos. O repórter, com uma micro-câmera oculta, tentava fazer imagens em um baile funk em que haveria exploração sexual infantil, em 2 de junho de 2002. O jornalista já tinha feito outras filmagens, sem problemas. Trabalhava sozinho.

Segundo a Polícia, Elias comandou e participou das torturas e do assassinato de Tim, na Favela de Grota, no Complexo do Alemão, para onde foi levado. O corpo do repórter foi esquartejado e queimado com gasolina, dentro de pneus. Restos carbonizados do cadáver foram descobertos em 12 de junho de 2002. O crime mudou a cobertura jornalística em comunidades no Rio de Janeiro. Desde então, foram adotadas regras de segurança mais rígidas, e o uso de equipamentos de segurança se generalizou.

Sentenciado em 2005 a 28 anos e seis meses de prisão, Elias Maluco tinha de cumprir penas que, somadas, eram de cerca de 60 anos de cadeia. Era acusado de tráfico de drogas e associação para o tráfico, homicídio triplamente qualificado, formação de quadrilha e ocultação de cadáver. Mesmo preso, foi considerado um dos responsáveis por ondas de terror que criminosos promoveram no Rio em 2006 e 2010. Reduzir sua influência sobre criminosos em liberdade era uma das alegações para mantê-lo preso em um presídio federal, em outro Estado. Foi lá que encerrou seus dias.

Estadão
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