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De Bloco 50+ a Paolla Oliveira: por um Carnaval inclusivo e livre

É triste ver que muita gente abre mão de alguns prazeres, como dançar e se jogar no Carnaval, simplesmente porque envelheceu

15 fev 2023 - 15h10
(atualizado às 16h01)
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Em vídeo que viralizou nas redes sociais, a atriz Paolla Oliveira aborda as diferenças entre o tratamento dado aos corpos femininos e aos masculinos no período do Carnaval. A ideia do vídeo surgiu depois de uma foto, feita durante ensaio da Grande Rio, em que a atriz e rainha de bateria da escola foi indagada se estava grávida. "Nem toda barriga é de bebê", rebateu a atriz.  

No vídeo, Paolla devolve aos homens perguntas que frequentemente são feitas às mulheres famosas em época de Carnaval. A mais clássica delas indaga sobre o processo de preparação para a data que, na visão do entrevistador, certamente envolve uma rotina de treinos, dieta, suor, muito sacrifício e nenhum prazer. Tudo em nome de um corpo definido, sem gordura, para ser exibido assim que a folia começa. 

"Esse ano, eu decidi fazer diferente e quero me preparar para o carnaval de outra forma. Livre de julgamentos, feliz e conectada com cada parte potente que trazemos em nós", escreve a atriz no texto que acompanha o vídeo, num claro desejo de se libertar de algo comum no passado.  

Paolla foi até o Samba do Trabalhador, encontro tradicional de músicos que acontece todas às segundas-feiras, no bairro carioca do Andaraí, e ouviu respostas de sambistas que espelham a diferença de como o Carnaval parece ser mais divertido para eles do que para elas. Algumas respostas dadas à atriz são hilárias, como a do comentarista da TV Globo Milton Cunha, cuja dieta pré-carnavalesca consiste em se entregar ao álcool de "uma forma fabulosa". 

Os homens opinam também sobre qual o corpo ideal para sair no Carnaval. "Um corpo livre, leve, sem culpa", diz um dos entrevistados. "Um corpo em que a pessoa se sente bem" afirma outro sambista. São respostas que definitivamente convidam a uma reflexão. 

Qual é a nossa visão de um corpo de Carnaval? Um corpo que se movimenta sob o ritmo da alegria, que se diverte e dança alheio a qualquer julgamento? Ou seria um corpo exclusivamente jovem e magro? Prefiro pensar num corpo consciente de que diversão é um dos princípios mais democráticos e que se estende a qualquer idade. Quantas pessoas, à medida que envelhecem, deixam de fazer coisas que antes eram prazeirosas por se sentirem impedidas pela idade? É triste ver que muita gente abre mão de alguns prazeres, como dançar e se jogar no Carnaval, simplesmente porque envelheceu, porque se sente excluída numa festa predominantemente associada à juventude. 

Foi pensando nisso que um grupo de amigos com mais de 50 anos, todos fãs de um bom Carnaval de rua, decidiu organizar um bloco em São Paulo que representasse pessoas nesta faixa etária. O nome do grupo diz tudo: "Tia eh o Caraleo". Surgiu depois de um episódio que aconteceu a uma das fundadoras do bloco, a jornalista Sandra Schkolnick, 60 anos. 

Sandra Schkolnick entre os músicos do bloco
Sandra Schkolnick entre os músicos do bloco
Foto: Guilherme Bessa

Em 2018, Sandra estava na companhia de amigos se divertindo num bloco na região dos Jardins quando despencou o maior temporal. Correu para se abrigar da chuva e abriu a sombrinha que estava na bolsa. Veio um rapaz que perguntou se podia se abrigar sob a mesma sombrinha. De quebra, ainda chamou a namorada. “Vem que a tia é legal”, disse ele. Ouviu imediatamente de Sandra: “tia é o caralho”. Todo mundo que estava em volta caiu na risada e passou a gritar a frase como um refrão. Nascia ali a ideia de fazer um bloco de Carnaval mais inclusivo, liderado pelo grupo de amigos que, na época, tinha passado dos 50 anos e continuava amando se encontrar no Carnaval. "Daí caiu uma ficha também de que a gente estava dando voz a essa faixa dos 50+ que tem pouca representatividade na folia", conta Sandra. 

O nome é  uma espécie de brincadeira-manifesto que busca reafirmar que mulheres podem viver a maturidade cheias de energia, poderosas, produtivas, sem limitações e cobranças, muito longe do estereótipo da "tia" da terceira idade. A própria letra da marchinha do bloco, composta por Stanley Carvalho, um clarinetista famoso no meio do choro, fala sobre esta visão distorcida. "Não jogo baralho, nem ao bingo eu vou"/ "Eu vou pra academia e muito malho, tia eh o caraleo" são alguns dos versos da música. 

O bloco dos amigos 50+ se apresentou pela primeira vez no Carnaval de 2020. Mas daí veio a pandemia, todo mundo se recolheu e só neste ano voltou ao Carnaval de rua de São Paulo. 

O "Tia eh Caraleo" se apresenta no domingo(19/02) a partir das 11h00, na Praça Padre Arnaldo, na Vila Anastácio. Até o lugar escolhido oferece mais conveniência para quem quiser se juntar à folia. A praça é arborizada, tem bancos e está liberado levar a própria cadeira, avisa o texto de divulgação. O local fica longe do eixo Centro-Pinheiros, bairros que tradicionalmente concentram a maioria dos blocos da cidade. No meio de muita muvuca, até banheiro vira artigo de luxo, preocupação que sempre esteve no radar do bloco 50+. Vai ter banheiro público e também nos bares ao redor da praça.  

A novidade é que, além da banda formada por 9 músicos profissionais, o bloco vai ter uma bateria com 20 integrantes que se juntam para interpretar as marchinhas clássicas que fazem parte do repertório do grupo. "Mas não somos seletivas a ponto de permitir a participação apenas de quem é  50+. Eu acho que tem uma geração mais nova que está super aberta à inclusão, está mais atenta e dizendo não para tudo aquilo que nos limita", avalia Sandra.

Integrantes da bateria do Bloco "Tia eh o Caraleo"
Integrantes da bateria do Bloco "Tia eh o Caraleo"
Foto: Fabíola Rosa

A jornalista é uma das primeiras a recusar qualquer limitação. "O bom dessa idade é que a gente já liga aquele botão de não estar nem aí para muita coisa", diz Sandra. Ela adota como lema de vida uma frase que cai muito bem no Carnaval ou em qualquer outro dia do ano: diversão não tem idade. 

Boa folia para todo mundo. 

Fonte: Redação Nós
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