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Brasileiro Série C

Santa Cruz fecha 2013 com chave de ouro e sonha com acesso no centenário

2 dez 2013 - 07h32
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Jesus Tricolor é um dos torcedores mais conhecidos do Santa Cruz
Jesus Tricolor é um dos torcedores mais conhecidos do Santa Cruz
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

O Santa Cruz tem 99 anos. Os torcedores do tricolor pernambucano vão viver o seu centenário no próximo dia 3 de fevereiro podendo finalmente colocar uma estrela nacional acima do escudo. E não questione o fato de que é um título de terceira divisão. Eles colocaram um basta em uma dúvida que durou quase sete anos. O “mais querido” vai voltar a ser um time de elite, essa é a certeza que a grande maioria dos torcedores do clube teve após o a conquista do título da Série C, com a vitória por 2 a 1 sobre o bravo Sampaio Corrêa, no Arruda. Foi a cobertura, de uma receita que vem se construindo nos últimos anos para o time voltar a ser grande e que deixa um gostinho de quero mais na torcida. Falta apenas a cereja do bolo.

Nas sociais do Arruda e no caminho para o estádio, a reportagem do Terra foi conversar antes, durante e depois da final com a parte mais importante de um clube de massas: a sua apaixonada torcida. A missão era encontrar personagens que contassem essa trajetória dura que eles, que são o mais rico patrimônio do clube, passaram e que esperam nunca mais viver como torcedores. No último domingo, no Arruda, com gols de Dedé e Flávio Caça-Rato e participação de alguns personagens fantasiados, foi protagonizado mais um espetáculo da virada na história do clube quase centenário. 

O universitário Pedro Luna quando está no meio da torcida do Santa Cruz também pode ser chamado de Jesus Tricolor. Desde 2010 ele se veste com as roupas de Cristo e promete não mudar nunca - não é praticante de nenhuma religião, mas se considera religioso. Para ele, abandonar o personagem poderia significar a volta do inferno que teve início em 2006. Por isso, enfrenta até mesmo olhares de lado e é obrigado a ouvir de vez em quando alguém dizendo que “isso é pecado”, como presenciou a reportagem antes de Dedé começar a festa na decisão da Série C.

Em 2010, Jesus Tricolor começou a aparecer nas sociais do Arruda e viu seu time conquistar a Copa Pernambuco. Ele vê aquele título no torneio de aspirantes como um início da retomada e garante “se eu peguei a Série D, onde eu viajei o país inteiro para ver jogos em campos parecidos com os de pelada não vou abandonar o time nunca”. 

<p><span style="color: rgb(0, 0, 0); font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: xx-small; line-height: normal; text-align: center;">Pedro Luna incorpora o Jesus Tricolor, mas as vezes não consegue conter o sorriso</span></p>
Pedro Luna incorpora o Jesus Tricolor, mas as vezes não consegue conter o sorriso
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

Em 2011, o Santa teve de disputar vaga para a Série D, mas acabou conseguindo participar do Brasileiro, iniciar a série do atual tricampeonato Pernambucano e de quebra interromper a sequência que teria levado ao hexacampeonato o rival Sport. Naquela época o Jesus chegou a levar para as arquibancadas um cartaz escrito “Respeitem a nossa religião”, era um grito de quem ainda acreditava que seu time podia nunca mais voltar a ser grande. “Desde que eu criei o personagem só tenho guardado boas lembranças”, desconversa, apesar das oscilações do time de Zé Teodoro e do ex-zagueiro Sandro Barbosa, que no início da recuperação do clube era auxiliar e depois foi técnico do time. 

O Santa Cruz de Zé Teodoro conseguiu os títulos estaduais de 2011 e 2012 e o acesso à Série C no mesmo ano, mas perdeu a decisão do título nacional para o Tupi e no ano seguinte não conseguiu dar continuidade à campanha que tinha como objetivo chegar à elite do Brasileiro a tempo do centenário. A esperança de Pedro é que o título neste ano dê mais embalo para no ano do centenário o clube conquistar o tetra Estadual e o acesso à Série A.

<p><span style="color: rgb(0, 0, 0); font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: xx-small; line-height: normal; text-align: center;">Durante os quase sete anos de crise, muitos personagens que hoje são vistos em todos os jogos do Santa Cruz foram criados</span></p>
Durante os quase sete anos de crise, muitos personagens que hoje são vistos em todos os jogos do Santa Cruz foram criados
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

Jesus Tricolor passa a maior parte dos 90 minutos sem mudar muito a expressão, faz pose, parece estar por cima do sentimento, incorpora o personagem e assiste aos jogos misturando o papel de ator com o de torcedor. Mas se o time começou a sair do fundo do poço com a fantasia no imaginário do torcedor, Pedro Luna acredita que em 2013 “a ressurreição foi a chegada de Vica, que deu a cara de guerreiros que o time do Santa Cruz deve ter. Nas finais sempre Caça-Rato decide, mas milagroso mesmo é Tiago Cardoso”, previa o personagem antes de Caça-Rato marcar o segundo gol, e o goleiro garantir o título após a reação do Sampaio Corrêa.

Bacalhau comemora e cobra alternativa para torcedores carentes

Caça Rato imita Van Damme e desafia Cristiano Ronaldo:

Aos 74 anos, Bacalhau espera fazer mais duas vezes pedalando o trajeto de 232 quilômetros entre sua casa no município de Garanhuns e o Recife. O mais folclórico e um dos mais conhecidos torcedores do Santa Cruz costuma pintar tudo na sua vida de vermelho, preto e branco. Na sua paramentada bicicleta tricolor ele espera completar 40 vezes o caminho. Para isso, deve vir para mais um jogo e para festa do Morro da Conceição.Se ele terá folego para completar a promessa que fez, ninguém sabe, mas Bacalhau finalmente viu seu time campeão nacional.

“É um título que o time tem (quase) 100 anos e não tinha e é uma satisfação enorme ver o clube ganhar pela primeira vez uma taça da CBF. Essa torcida sofre, mas morre junto”, comemorava, ainda antes do apito final. Mas o torcedor deixou transparecer sua crítica. “Hoje esse estádio não está cheio, porque o nosso torcedor pobre não pode pagar R$ 50 (R$ 25 foi o preço nas gerais) para vir ao jogo”. A final entre Santa Cruz e Sampaio Corrêa teve 33.887 pagantes, metade do registrado no jogo do acesso, mas para Bacalhau muita gente não pôde ir a campo pela interrupção do programa Todos com a Nota e pelos ingressos caros

<p><span style="color: rgb(0, 0, 0); font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: xx-small; line-height: normal; text-align: center;">Bacalhau comemora o título da Série C, mas queria ver o Arruda lotado</span></p>
Bacalhau comemora o título da Série C, mas queria ver o Arruda lotado
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

O presidente do clube, Antonio Luiz Neto, não conseguiu chegar a um acordo com o Governo do Estado para transferir algum jogo do time para a Arena Pernambuco. E como existe uma lei estadual que exige que para participar do programa que em troca de notas fiscais distribui ingressos gratuitamente o time precisa levar partidas na sede pernambucana do Mundial de 2014, o clube (e principalmente o torcedor carente) acabou não sendo beneficiado justamente na final.

Frequentador das arquibancadas do Arruda desde os 12 anos, no entanto, Bacalhau propõe que o clube baixe os valores e cobre R$ 15 para os ingressos mais baratos. E lembra que se o time for jogar na Arena Pernambuco, para voltar a participar do Todos com a Nota, é preciso evitar os jogos noturnos. Assim como Bacalhau teme a segurança ao vir de bicicleta de Garanhuns até Recife, também acha perigoso os jogos em São Lourenço da Mata (20 km do Recife). "É muito difícil um torcedor humilde do Santa Cruz sair de Olinda para ir assistir um jogo à noite no outro lado da cidade", acredita ele, que é um exemplo do torcedor que curte e teria dificuldade de deixar de frequentar o Arruda, mesmo que fosse para seu time atuar em um estádio mais moderno.

Um longo calvário que abre espaço para o Carnaval do centenário

Ela assistia a festa com uma bandeira, olhando por cima do muro da sua casa na Avenida Norte. Fã do meio-campista Renatinho, formado nas divisões de base do Arruda, Sonia Maria Miranda conta que deixou de ir ao Arruda há seis anos, mas que continua fanática mesmo que agora assista na TV ou ouça os jogos pelo rádio.

Torcedores do Sampaio Corrêa enfrentaram a estrada para ir ao Arruda
Torcedores do Sampaio Corrêa enfrentaram a estrada para ir ao Arruda
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

Um ano antes, após perder a final do Estadual para o Sport, o time fez péssima campanha e foi rebaixado da Série A. Era justamente o início de um longo calvário. Nos anos seguintes, o Santa Cruz caiu mais dois degraus no futebol, primeiro foi rebaixado da Série B e depois não conseguiu ficar entre os 20 que disputaram a reformulada Série C de 2009. Assim, a torcida tricolor teve a tristeza de inaugurar a famigerada Série D do Brasileiro e viu o time ser eliminado na 1ª fase.

Assim como Sônia, que deixou de frequentar as arquibancadas, muitas crianças chegaram a mudar de time. Outras voltaram a torcer pelo Santa Cruz apenas quando o clube iniciou a trajetória de recuperação, com o primeiro título do tricampeonato Pernambucano. Mas agora a torcida do Santa Cruz, mesmo  sem esquecer o sofrimento, só quer saber do Carnaval que começou antes mesmo do título da Série C. Para a torcida tricolor, a festa começou desde 3 de novembro, mais precisamente quando Flávio Caça-Rato já nos minutos finais da partida decisiva marcou 2 a 1, numa cabeçada esquisita e ao mesmo tempo fantástica que deu a vitória sobre o Betim e garantiu a vaga na Serie B para os pernambucanos.

Vestido de cabloco de lança, Manuel Arruda costuma assistir os jogos ao lado do amigo Alex José da Silva, que se veste de cangaceiro da paz. Antes do jogo, os dois lembravam que a queda para a Série D foi o momento mais triste desses anos de sofrimento. “Não dá nem pra lembrar isso, mas o Santa Cruz pode ir até pra Série Z que nós vamos estar lá”, brinca Alex.

Aos 68 anos, Sonia Maria Miranda deixou de ir ao Arruda há seis anos, no início da crise e agora assiste de casa e discute futebol com os vizinhos
Aos 68 anos, Sonia Maria Miranda deixou de ir ao Arruda há seis anos, no início da crise e agora assiste de casa e discute futebol com os vizinhos
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

Desde 2006, muita gente passou a ir para as arquibancadas do Arruda vestindo fantasias. Alguns deles ficaram famosos como os dois amigos, que costumam ter de parar de vez em quando para tirar fotos com outros torcedores. Outros deixaram de frequentar o estádio do Arruda, como Dona Sonia, que já não se sente segura para sair de sua casa e ir até o local. Mas a verdade é que resistência, mesmo longe das arquibancadas, deixou uma tatuagem para o torcedor do Santa Cruz como prova do amor e dedicação que ajudaram o time a continuar a ser grande. Resta agora tentar repetir um ano perfeito e conquistar o tetra Pernambucano e o acesso à elite do Brasileiro em 2014. É o sonho de quem começou o Carnaval desde novembro em Pernambuco.

Fonte: Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra
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