Filho de costureira e zelador, CEO aposta no chão de fábrica para tentar salvar a Kodak
Jim Continenza lidera reestruturação da empresa centenária, marcada por dívidas e queda nas receitas, e aposta na retomada da indústria
A Eastman Kodak Company, símbolo da era de ouro da fotografia analógica, enfrenta um de seus momentos mais delicados desde a falência de 2012. Sob o comando de Jim Continenza, um executivo de origem humilde e discurso direto, a companhia tenta se reinventar mais uma vez --agora, apostando na força do chão de fábrica e em uma reestruturação voltada para negócios de alta tecnologia.
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Filho de uma costureira e de um zelador, Continenza construiu sua carreira longe dos gabinetes executivos tradicionais. Conhecido por percorrer linhas de produção e conversar com operários, ele defende que o futuro da Kodak depende da retomada de uma cultura industrial sólida, com foco em produtividade e proximidade entre chefia e funcionários. “Quanto pior está, mais calmo fico”, afirmou recentemente.
Desde que assumiu o cargo de CEO em 2019, o executivo conduz uma mudança estrutural na empresa. O plano de recuperação inclui redução de custos, venda de ativos, renegociação de dívidas e diversificação das frentes de atuação. A Kodak tenta deixar para trás a dependência de produtos que a tornaram famosa --câmeras e filmes fotográficos-- e se firmar em áreas como impressão industrial, materiais avançados e produtos químicos especializados, voltadas principalmente ao mercado corporativo.
De acordo com documentos divulgados pela companhia, a Kodak reconhece “incerteza substancial” sobre sua capacidade de continuar operando caso não consiga refinanciar dívidas que vencem ainda neste ano. As dificuldades de liquidez reacenderam memórias da crise de 2012, quando a empresa pediu proteção judicial contra falência nos Estados Unidos.
Apesar do cenário adverso, Continenza tenta se distanciar do pessimismo. Em entrevistas à imprensa norte-americana, tem afirmado que a Kodak “ainda é uma companhia viva, com tecnologia, história e pessoas talentosas”. A estratégia do CEO aposta em um modelo de gestão mais horizontal e transparente. Ele costuma circular entre os galpões de produção em Rochester, Nova York --cidade onde a empresa foi fundada há mais de um século-- e incentiva diretores e investidores a fazerem o mesmo.
A ênfase no trabalho de base e na valorização da equipe operacional tem também um peso simbólico: representa uma tentativa de reconectar a marca à sua essência industrial, em um momento em que empresas de tecnologia concentram esforços em inovação digital. Para Continenza, a reinvenção da Kodak não passa pela nostalgia, mas pela valorização do conhecimento técnico e da engenharia que a empresa ainda domina.
Analistas ouvidos pela Financial Time afirmam que o futuro da companhia permanece incerto. A Kodak ainda lida com custos previdenciários e dívidas elevadas, além de operar em um mercado competitivo que exige investimentos constantes em pesquisa e desenvolvimento. O tempo, dizem, é curto para que o plano de recuperação produza resultados concretos.
Fundada em 1888 por George Eastman, a Kodak revolucionou a fotografia ao torná-la acessível ao público. Durante o século 20, o slogan “Você aperta o botão, nós fazemos o resto” tornou-se sinônimo de inovação. Mas o avanço da fotografia digital, ignorado pela direção por quase duas décadas, levou à derrocada de um império avaliado em bilhões.
Hoje, a empresa busca provar que ainda há espaço para o nome que moldou a memória visual de gerações. Além das operações industriais, a Kodak mantém licenciamento da marca em produtos de consumo, como câmeras instantâneas e impressoras domésticas. Essas iniciativas ajudam a preservar o vínculo afetivo com o público, embora representem uma fatia modesta da receita global.