Disputas dos EUA com Brasil e Índia empurraram tarifas para cima, diz diretora do FMI
Taxa tarifária ponderada pelo comércio dos EUA caiu de 23% em abril para 17,5%, mas continua em patamar muito elevado, afirma Kristalina Georgieva
NOVA YORK - A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, avaliou que o choque tarifário não foi tão grande quanto o anunciado, mas disputas entre os Estados Unidos e países como o Brasil e a Índia estão empurrando as alíquotas para cima.
A taxa tarifária ponderada pelo comércio dos EUA caiu de 23% em abril para 17,5%, mas ainda está em um patamar muito mais alto do que antes, conforme ela. Além disso, supera o nível global, cuja alíquota se manteve relativamente estável este ano, com muito poucos casos de retaliação, disse.
"O mundo evitou revidar na mesma moeda e gerar uma guerra comercial — até agora. Mas a abertura ainda assim sofreu um grande golpe", disse Georgieva.
Ela alertou que a questão tarifária ainda não acabou, com as taxas cobradas pelos EUA a parceiros comerciais ainda sofrendo alterações. "Acordos comerciais com o Reino Unido, a UE, o Japão e em breve a Coreia do Sul empurraram algumas taxas para baixo, enquanto disputas com o Brasil e a Índia empurraram outras para cima", exemplificou.
A diretora-geral do FMI afirmou ainda que os países devem preservar o comércio como um "motor de crescimento".
Reorganização das cadeias
Georgieva destacou o papel do setor privado para a resiliência da economia mundial, a despeito de múltiplos choques. "As empresas têm antecipado pedidos de importação antes dos aumentos tarifários e reorganizado suas cadeias de suprimentos", disse ela, em discurso de abre-alas das reuniões anuais do Fundo, que acontecem em Washington, nos Estados Unidos, na semana que vem.
De acordo com Georgieva, os balanços corporativos estão fortes após anos de lucros robustos. A inteligência artificial (IA) está se tornando "mainstream", e a mudança é enfrentada como um "desafio e abraçada como uma oportunidade", disse. "Impulsionados pelo otimismo sobre o potencial de aumento de produtividade da IA, os preços das ações globais estão em alta", avaliou.
Segundo ela, em muitas economias, a produtividade do setor privado está envolta de burocracia, o que dificulta o crescimento de empresas novas (startups). Apesar disso, Georgieva avaliou que a concorrência é fundamental, e a regulamentação não deve "tolerar ou criar vantagem injusta".
"Um crescimento duradouro exige maior produtividade do setor privado", alertou, cobrando que os governos devem estimular os livres mercados, regulação adequada, forte supervisão do setor financeiro, com instituições independentes, mas responsáveis.
Mercado emergentes
A diretora-geral do FMI enfatizou o melhor desempenho dos mercados emergentes no contexto atual. "As economias de mercado emergentes, especialmente, melhoraram significativamente seus quadros de política e instituições", disse.
Estudos do FMI divulgados nesta semana mostram que, após enfrentar sucessivas ondas de aversão ao risco, os países emergentes, a exemplo do Brasil, têm se beneficiado do maior apetite dos investidores globais. Segundo o Fundo, é uma combinação de boas práticas monetárias e uma pitada de sorte.
A combinação de regras fiscais mais críveis, bancos centrais mais autônomos e mercados de dívida em moeda local mais profundos elevou o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de países emergentes em 0,5 ponto porcentual (pp), calcula o FMI. Por sua vez, a inflação se reduziu em 0,6 pp nas turbulências pós-2008.
"Economias emergentes agora se saem melhor quando os choques ocorrem do que antes da crise financeira global. Boas políticas fazem a diferença", afirmou.
Consolidação fiscal
A diretora-geral do FMI reforçou o alerta à necessidade de países riscos e pobres adotarem reformas que levem à consolidação fiscal.
A dívida pública global está projetada para exceder 100% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial até 2029, liderada por economias avançadas e de mercados emergentes, calcula o organismo, com sede em Washington, nos Estados Unidos. "A consolidação fiscal é necessária em países ricos e pobres. A consolidação é difícil como muitos dos episódios recentes de agitação social mostram", avaliou.
Segundo ela, é possível os países reduzirem os seus déficits de forma significativa com um plano fiscal que seja bem-planejado, comunicado e implementado.
Georgieva também alertou para a necessidade de os governos diminuírem os desequilíbrios de conta corrente. "Esses desequilíbrios podem desencadear uma reação protecionista, e sendo espelhados por fluxos de capital líquido, podem alimentar riscos de estabilidade financeira", avaliou.