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Alicerces do teto

Para 2020, governo decidiu priorizar as reformas cujo objetivo é reduzir os gastos obrigatórios

18 jan 2020 - 05h10
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O ano de 2019 foi bastante favorável para a aprovação de reformas importantes para a economia brasileira. Seguindo uma tendência que teve início no segundo semestre de 2016, foram aprovadas em 2019, entre outras reformas, a Lei da Liberdade Econômica, o Cadastro Positivo, a Cessão Onerosa, os novos marcos regulatórios das Telecomunicações, da Aviação Civil e do Saneamento (na Câmara dos Deputados), culminando com a aprovação de uma excelente reforma da Previdência.

A aprovação da reforma previdenciária foi particularmente importante. Ao gerar uma economia de mais de R$ 800 bilhões em dez anos - se não houver aumento real dos salários dos funcionários públicos e do salário mínimo -, ela reduz substancialmente o crescimento dos gastos com previdência e assistência social como proporção dos gastos totais do governo federal. Essa reforma é o primeiro passo na direção de tornar o teto para o crescimento do gasto público sustentável.

Quando o teto foi aprovado, em dezembro de 2016, a expectativa era de que a reforma da Previdência seria aprovada em meados de 2017. Entretanto, isso somente aconteceu em novembro de 2019. O resultado foi que durante estes dois anos e meio os gastos com previdência e assistência social aumentaram mais de 15% em termos reais, comprimindo os gastos discricionários do governo federal. Hoje, 93% dos gastos totais do governo federal são obrigatórios, o que torna o Orçamento totalmente rígido.

Por outro lado, os gastos obrigatórios aumentam vegetativamente todos os anos, em razão de promoções automáticas do funcionalismo público, aumento de gastos com aposentadorias e pensões, etc. Como resultado, em pouco mais de dois anos o teto se tornará insustentável, gerando perda de credibilidade no ajuste fiscal e uma inversão da trajetória de queda das taxas de juros vista nos últimos anos (ver Os juros do futuro, Estado, 4/1/2020, B2).

Diante desta realidade, o governo decidiu não apenas manter a postura agressiva adotada em 2019 em relação às reformas, mas também priorizar aquelas cujo objetivo é reduzir os gastos obrigatórios. As Propostas de Emenda Constitucional (PECs) enviadas ao Congresso no final de 2019 apontam nessa direção. A PEC Emergencial, a PEC dos Fundos Públicos e a PEC do Pacto Federativo, em conjunto com a PEC da Regra de Ouro, têm por objetivos criar gatilhos, acionados automaticamente, para reduzir gastos obrigatórios sempre que o equilíbrio fiscal estiver próximo de ser rompido (como hoje), eliminar fundos federais, desvincular seus recursos e utilizá-los de forma mais eficiente, permitindo redução da dívida e racionalização dos gastos, fundir municípios fiscalmente insustentáveis, reduzir à metade os subsídios fiscais no Orçamento, entre outras medidas. Enfim, criar os alicerces para o teto dos gastos.

Como o teto impõe um limite superior para os gastos, as únicas formas de liberar gastos discricionários - dos quais as emendas parlamentares são um dos principais componentes - e continuar respeitando o teto são reduzir gastos obrigatórios e liberar recursos vinculados dos fundos federais, que, em geral, favorecem parlamentares ligados a grupos específicos. Ou seja, como ocorreu em 2019, os incentivos apontam na direção de que as propostas têm uma alta probabilidade de serem, em grande parte, aprovadas pelo Congresso Nacional.

Estas são propostas ambiciosas que vão exigir muita negociação no Congresso. Vale a pena não misturar a discussão de redução dos gastos obrigatórios com a reforma tributária, uma reforma complexa que deverá gerar muita polêmica. Uma vez aprovadas essas PECs, o País terá feito grande parte do ajuste fiscal pelo lado dos gastos, faltando a reforma administrativa. Terá dado passos decisivos, e indispensáveis, para que a economia possa conviver com juros baixos, crescimento de longo prazo e estabilidade de preços. Neste momento, a reforma tributária passará a ser prioritária. Estamos chegando lá!

* PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA CHEFE DA GENIAL INVESTIMENTOS

Estadão
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