Formatos estrangeiros ganham espaço na busca pela audiência
- Arcângela Mota
Originalidade é uma palavra que não se aplica bem à TV. E, muito antes de Chacrinha alardear a famosa frase "Na televisão nada se cria, tudo se copia", nos anos 70, a assimilação de programas feitos no exterior já era comum por aqui. Com o passar dos anos, a adaptação de "enlatados" se tornou cada vez mais frequente - e bem sucedida - na TV brasileira. Agora, reality shows com prêmios milionários, disputas para se tornar o novo ídolo, competições de dança e programas jornalísticos e de humor com estilos inusitados - todos idealizados em outros países - fazem sucesso em território nacional. E viram uma espécie de trunfo das emissoras na hora de definir a programação, já que são uma aposta bem menos arriscada para conquistar a audiência. "Comprar formatos é uma maneira de usar algo que deu certo em algum lugar. As emissoras precisam de referências antes de investir. Mas adaptar não é um processo automático", ponderou Marcelo Tas, apresentador do CQC, versão nacional do argentino Caiga Quien Caiga, um dos programas de maior audiência da Band.
O sucesso no exterior, no entanto, não é garantia de que o formato irá agradar o público brasileiro. E é por isso que, antes de levar as produções ao ar, as equipes se empenham em fazer modificações para dar uma identidade nacional aos programas. Foi o que aconteceu com o Ídolos, da Record, versão brasileira do reality britânico Idols, exibido em mais de 40 países e famoso por sua versão norte-americana, o American Idol. "No início ainda seguíamos um estilo mais parecido com o original, mas na medida em que o programa foi se consolidando tivemos mais liberdade para ousar e fazer um programa com a cara do povo brasileiro", lembrou Fernanda Telles, diretora artística do Ídolos, destacando que a maior particularidade do programa são os participantes. "Os americanos são mais competitivos enquanto os brasileiros são mais solidários. Existe uma emotividade maior aqui", comparou.
E esse lado mais emotivo dos brasileiros raramente passa em branco na hora de adaptar os programas. Seja em reality shows ou dramaturgia, os dilemas pessoais costumam ganhar dimensões maiores aqui do que nos Estados Unidos e Europa, berço da maioria dos formatos de sucesso. Até mesmo quando os modelos são os famosos seriados policiais norte-americanos, marcados pela frieza e pragmatismo dos personagens. "Aqui há um interesse maior pelas relações humanas, decepções e amores interrompidos. Só ação não basta", argumentou Wolf Maya, diretor do seriado Na Forma da Lei, da Globo, que, apesar das semelhanças estruturais com Law & Order, não é uma versão brasileira da consagrada série norte-americana. "Sou aficionado por seriados e me inspirei em vários. É uma linguagem de comunicação muito contemporânea. Estamos aplicando uma dramaturgia mais concentrada", contou.
O sucesso dos formatos estrangeiros no Brasil, além de se justificar pelos custos e riscos menores, se intensificou há pouco mais de uma década com o surgimento de produtoras especializadas em reality shows, um dos gêneros de maior sucesso atualmente. É o caso da holandesa Endemol, que vende os direitos de exibição de uma série de produtos que fazem sucesso na TV aberta brasileira, como o Big Brother Brasil, os quadros Lata Velha e Lar Doce Lar do Caldeirão do Huck, o Um Contra Cem, do SBT, e o Busão do Brasil, da Band. "A Endemol dá liberdade para que cada produção local customize e adapte o produto à realidade do país. É um dos segredos do sucesso", explicou a diretora de produção da Endemol Brasil, Paula Cavalcanti.
Mas não é raro que programas nacionais com premissas parecidas com a de formatos estrangeiros sejam feitos aqui sem passar por uma produtora. É o caso do Qual é o Seu Talento?, do SBT, que, apesar das inúmeras semelhanças com o Britain's Got Talent, não é definido pelo diretor do programa como uma versão brasileira do show de talentos britânico. "O QST é um formato original, criado com base no Show de Calouros e outros quadros e competições do gênero. Não é um formato comprado e, por isso, não seguimos regras ou padrões internacionais", defendeu o diretor Ricardo Mantoanelli.
Tempero local
Acrescentar elementos novos aos formatos estrangeiros é um processo trabalhoso para as equipes dos programas. Para produzir o reality Busão do Brasil, por exemplo, a Band conta com uma equipe de 60 pessoas que viajam pelo país acompanhando o ônibus onde os participantes estão confinados. Tudo porque, ao contrário das outras edições ao redor do mundo, a brasileira traz um diferencial: todas as provas executadas pelos jogadores envolvem alguma ação social. "Aqui os participantes agem com as comunidades e tomam atitudes que fazem a diferença. Esse foi um dos principais motivos para investirmos no programa", idealizou Hélio Vargas, diretor de programação da Band.
Para diferenciar o Ídolos da versão original, a Record também investe em algumas inovações na dinâmica e na edição dos episódios. E, para isso, busca inspiração nas diversas edições do programa exibidas mundialmente. "O original é a nossa grande referência, mas não é tudo. Assistimos a todas as adaptações e inventamos episódios aqui no Brasil. É uma conjunção de forças", explicou a diretora artística Fernanda Telles.
Instantâneas
# O Dança dos Famosos, quadro de maior sucesso do Domingão do Faustão, é a versão brasileira do reality Dancing with The Stars, exibido desde 2005 na TV norte-americana.
# Para selecionar os jurados de Ídolos, a equipe do programa fez testes com mais de 50 personalidades do mundo da música. Mas não houve a exigência de encontrar um júri parecido com o do formato original. "A única exigência era ter jurados que se complementassem e que fossem proeminentes na música", contou a diretora Fernanda Telles.
# A Band aposta nos formatos da produtora argentina Cuatro Cabezas - a mesma de CQC, A Liga, O Formigueiro e Busão do Brasil - para mudar a imagem do canal. "Buscamos rejuvenescer e diversificar a programação. Esses programas caem como uma luva", disse Marcelo Mainardi, diretor executivo comercial da emissora.
# O sucesso do Esquadrão da Moda, versão brasileira do norte-americano What Not To Wear, fez com que o programa garantisse um lugar no horário nobre do SBT, passando a ser exibido todas às terças, às 21h15.