'Juntos' é terror corporal que erra ao trocar o bizarro por excesso de explicações
Filme protagonizado pelo casal Alison Brie e Dave Franco tem seus momentos, mas nunca chega ao ápice prometido
Bem no momento mais frágil do casamento, Tim (Dave Franco) e Millie (Alison Brie) precisam se mudar. Ele não emplacou na música como imaginava e ela precisou aceitar um emprego no interior como professora. Depois que se mudam, a sensação é de que estão cada vez mais afastados e menos casados. É nesse momento que algo estranho começa a acontecer: após um acidente numa trilha, os corpos dos dois começam a grudar. Literalmente.
Essa é a história inusitada de Juntos, terror que chegou aos cinemas nesta quinta, 14. Dirigido e roteirizado pelo estreante Michael Shanks, apenas com curtas no currículo, o filme tem ares inegáveis de David Cronenberg. Assim como fez Julia Ducournau em Titane e Coralie Fargeat em A Substância, o diretor se aproxima do cinema de A Mosca e Gêmeos: Mórbida Semelhança ao colocar esses corpos colando, grudando, entrando um no outro. Tim e Millie tentam se afastar, mas uma força estranha os puxa para perto.
O terror da proximidade
Quando o roteiro corre dessa forma, com os dois personagens tentando entender o que está acontecendo e desesperados com seus corpos grudados, Juntos chega próximo de uma genialidade fresca, típica de quem está só começando no cinema. Franco e Brie, que são um casal na vida real, esbanjam química — necessária mesmo quando são dois personagens que se afastam. Afinal, a dor da separação é ainda maior quando se amam e se respeitam e, de forma desconcertante, eles conseguem colocar isso facilmente na tela.
Assim, você entende o drama dos dois personagens, embarca na proposta e fica aflito. Afinal, mergulhado no body horror, esse subgênero do terror que fala geralmente sobre transformações ou deformidades corporais, Juntos causa um nojo genuíno em várias cenas. Com bom trabalho de efeitos práticos, o longa consegue ficar naquele mesmo espaço de Jeff Goldblum nos estágios mais próximos de uma mosca ou, no exemplo mais recente, nas cenas finais de A Substância. Mais do que um terror de sustos, que são quase ausentes aqui, o filme de Shanks quer gerar uma sensação de desgosto, de nojo ou até de desespero.
É bem óbvia a intenção de Juntos em falar sobre essa separação que nunca acontece, esse fim que é postergado. Os personagens tentam ir embora, mas não conseguem — há uma cena mais óbvia, mas ainda muito boa, em que Millie pega o carro, vai embora e Tim entra em um transe violento, com o corpo inerte batendo na parede, tentando acompanhar a esposa. O body horror funciona, justamente, nos momentos em que se quer falar sobre o desconhecido e sobre aquilo que parece ir contra a natureza humana. Um relacionamento forçado, que já morreu e insiste em existir, se encaixa estranhamente bem nesse cenário.
A comédia involuntária
Uma pena, porém, que falte um bocado da genialidade de Cronenberg nesse primeiro filme de Shanks. O pai do body horror nunca tenta explicar nada em seus filmes. O bizarro acontece — e ponto final. Já em Juntos, o roteiro fica o tempo todo tentando dar conta das explicações. Eles não podem apenas grudar por uma força do além.
Shanks dá respostas demais em um filme que exige, acima de tudo, desprendimento com o real. O vazio de razões palpáveis deixaria tudo mais aterrorizante. As respostas vão minando o horror geral da história e, no final das contas, a transformam em algo quase cômico.
A última cena de Juntos é um exemplo perfeito dessa necessidade desesperada por explicações que simplesmente não funcionam no terror. Sem entrar em detalhes para evitar spoilers, é o momento de maior impacto visual, quando finalmente entendemos as consequências dessa união de corpos.
Ao invés de deixar o bizarro suspenso no ar, permitindo que cada espectador crie sua própria versão do que aconteceu, Shanks resolve entregar tudo mastigado. O resultado é uma das sequências mais involuntariamente cômicas do ano, que deixa o público dividido entre o riso nervoso e a decepção.
Juntos tropeça nas próprias pernas ao ter medo de abraçar completamente o absurdo. Para quem busca entretenimento descompromissado e gosta de ir ao cinema em grupo para se divertir com cenas bizarras e desconfortáveis, certamente cumprirá seu papel.
Mas não espere que se firme como o grande filme de terror do ano — especialmente quando temos Pecadores e A Hora do Mal. Juntos fica como uma experiência menor: você vai dar algumas risadas, sentir nojo em alguns momentos e se lembrar de uma ou duas imagens perturbadoras. Já todas aquelas explicações desnecessárias que tanto incomodaram durante o filme? Essas vão sumir da memória antes mesmo de você chegar em casa.