'Do Começo ao Fim': escolhas confusas reduzem impacto do filme
Quando o trailer do filme Do Começo ao Fim caiu na rede, parecia que o cinema nacional finalmente tinha saído da obviedade e embarcado em tramas profundas - tal qual os grandes cineastas brasileiros que se destacaram antes da retomada do cinema, como Walter Hugo Khouri. Aluizio Abranches, diretor do longa, tinha tudo para conseguir êxito: um roteiro aparentemente conciso, sobre dois irmãos, de pais diferentes, que se envolviam numa relação incestuosa.
Mas, provavelmente devido à montagem - que adiou o lançamento do filme por duas vezes - e um erro grave na composição do roteiro, Do Começo ao Fim entrega bem menos do que promete. É um filme confuso, que perde o fio da meada e se prolonga em cenas extensas, pouco ou nada importantes para o desenrolar da trama.
Na primeira cena, escutamos a narração de Thomás (Rafael Cardoso). Ao nascer, ele demorou duas semanas para abrir os olhos e sua mãe (Julia Lemmertz) não se preocupou. Disse que ele só os abriria quando estivesse preparado. Para Thomás, essa foi a primeira demonstração de seu livre arbítrio.
As cenas que se seguem mostram a convivência do menino com seu irmão mais velho, Francisco, por com quem, a princípio, nutre um amor fraternal (natural entre irmãos), mas que, com o tempo, vai se sexualizando. Alexandre (Fábio Assunção), pai de Thomás, e o argentino Pedro (ator), pai de Francisco, ficam preocupados. Mas, mesmo alertada, a mãe não os reprime.
Toda a primeira parte é construída de modo didático e, apesar de forçada - graças a uma síndrome "Manoel Carlos", que tenta imprimir naturalidade aos diálogos -, consegue prender a atenção do espectador. O problema é que quando o filme toma novos rumos, com os meninos adultos, nada da intensidade inicial se mantém. É impossível vê-los como irmãos assim que os atores João Gabriel Vasconcellos e Rafael Cardoso assumem o papel de Francisco e Thomás, respectivamente. E, com apenas um dos pais convivendo com a dupla, fica difícil relacionar um período para outro. São, portanto, longas diferentes.
Expert em cenas tórridas - marca registrada explorada principalmente em Um Copo de Cólera (1999) -, Aluizio Abranches abusa da beleza dos dois rapazes como recurso estético do filme, conseguindo certo êxito. Não são poupados aos espectadores cenas calorosas de sexo e nudez frontal dos atores. Mas como, quando os garotos estão crescidos, Thomás e Francisco já aparecem morando juntos e agindo como dois namorados, o espectador não atesta que eles transaram pela primeira vez em algum momento. Por mais óbvio que isso possa parecer, num filme como esse tal cena seria imprescindível. No lugar dela, vem a frustração.
No final, Francisco e Thomás vivem uma relação tão verossímil quanto um casal que está junto há duas semanas, não a vida inteira. As tentativas de tornarem o amor visível e aceitável ao público não ajudam em nada.
E quando entra a cena dos dois dançando tango pelados, com fumaça ao fundo, o desejo é de não ter entrado na sala de cinema e ficado só com o trailer.