A carne que comemos faz parte do processo de colonização

O gado não é brasileiro, ele chegou aqui praticamente junto com os primeiros colonizadores portugueses.

20 out 2023 - 12h58
Foto: CanvaPro

Poucas pessoas pensam sobre isso, muitas não fazem a mínima ideia. Mas todos os bovinos que hoje cobrem os pastos na Amazônia e no Cerrado, foram trazidos ao Brasil por colonizadores portugueses. 

Os primeiros bovinos a chegarem à Bahia, no século XVI, eram gados zebuíno (Bos Indicus), proveniente das ilhas de Cabo Verde. Os primeiros registros históricos indicam que o gado chegou ao Brasil em 1534.

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No início da colonização, o gado era utilizado como tração animal para os engenhos de cana-de-açúcar. A primeira monocultura brasileira que se expandiu ao longo do litoral nordestino. Por isso, no começo, o gado tinha maior valor para tração animal do que para produtos de origem animal.

Porém, com o passar do tempo, o rebanho foi aumentando drasticamente, e isso gerou um grande problema para os plantadores de cana, pois o gado ocupava um espaço que era reservado às valiosas plantações de cana-de-açúcar.

Isso acendeu o sinal de alerta na Coroa Portuguesa, que imediatamente emitiu um decreto que proibia a criação de bovinos em uma faixa de terra de 80km, da costa até o interior. 

Como já foi dito, no começo, o gado era utilizado como tração e produção de couro para a agricultura. O consumo e a produção de carne e os demais produtos de origem bovina, suína, entre outros, começaram principalmente nos séculos XVII e XVIII. À medida que a criação de gado se concentrava em todo território brasileiro.

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Antes da chegada dos europeus, os nativos que já estavam aqui, cultivavam milho, feijão, abóbora, batata, amendoim e mandioca. Faziam tortilhas, tamales, mingau, entre outros preparos. 

Coletavam frutas, plantas silvestres, raízes e nozes. Em algumas culturas preparavam alimentos fermentados, como a chicha (uma bebida alcoólica) e peixes fermentados.

Mas também caçavam e pescavam, e essa prática era uma parte crucial na sobrevivência dos povos nativos. Os povos não-brancos que vivem aqui há milhares de anos consumiram e consomem animais.

Contudo, a relação dos povos originários com os animais, é completamente diferente dessa sistematização e consumo europeu (criação de gado). A forma com a qual os povos originários se relacionam com animais de outras espécies, não parte de uma concepção de aprisionamento e reprodução por demanda. O animal não é tratado como mera mercadoria.

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Não existem mega abatedouros em comunidades indígenas, muito menos uma operação industrial de abate de animais. Portanto, até a carne e demais produtos de origem animal que consumimos hoje, tem origem num processo de colonização branco-europeia.

O nosso prato, recheado de animais (bovinos, caprinos, suínos) e derivados, é puramente o reflexo do processo de colonização que o Brasil sofreu. Esses animais não são nativos do país e antes da chegada dos colonizadores nunca tivemos esses animais em território brasileiro.

Num processo de descolonização cultural e intelectual, onde se é pautado a importância da promoção de perspectivas femininas, conhecimentos indígenas, afrodescendentes, e outras comunidades historicamente marginalizadas, não há nada mais importante do que compreender que a carne e os demais produtos de origem animal no nosso prato é parte do processo escravocrata e colonizatório.

Leonardo e Eduardo dos Santos são irmãos gêmeos, nascidos e criados na periferia de Campinas, interior de São Paulo. São midiativistas da Vegano Periférico, um movimento e coletivo que começou como uma conta do Instagram em outubro de 2017. Atuam pelos direitos humanos e direitos animais por meio da luta inclusiva e acessível, e nos seus canais de comunicação abordam temas como autonomia alimentar, reforma agrária, justiça social e meio ambiente.
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