O novo tratamento que salva vidas na luta contra a leucemia

Um tratamento contra leucemia está chamando a atenção da comunidade científica por transformar células de defesa do próprio organismo em um tipo de "medicamento vivo". Saiba mais!

12 dez 2025 - 19h00

Um tratamento contra leucemia está chamando a atenção da comunidade científica por transformar células de defesa do próprio organismo em um tipo de "medicamento vivo". A abordagem combina imunoterapia com edição genética de alta precisão, voltada principalmente para casos de leucemia linfoblástica aguda de células T em situação crítica. Nestes casos, terapias tradicionais deixam de surtir efeito. Em alguns pacientes, o câncer se torna indetectável após o procedimento, permitindo que retomem a rotina com acompanhamento periódico.

Esse tipo de leucemia afeta as chamadas células T, uma classe de glóbulos brancos responsável por identificar e eliminar ameaças, como vírus e células alteradas. Na doença, essas células passam a se multiplicar de forma descontrolada, ocupando a medula óssea e prejudicando a produção normal do sangue. Por isso, para muitas pessoas em estágio avançado, quimioterapia em alta dose e transplante de medula óssea não são suficientes. Isso leva equipes médicas a buscar alternativas com inovações advindas da engenharia genética.

Publicidade
Esse tipo de leucemia afeta as chamadas células T, uma classe de glóbulos brancos responsável por identificar e eliminar ameaças, como vírus e células alteradas – depositphotos.com / forfour
Esse tipo de leucemia afeta as chamadas células T, uma classe de glóbulos brancos responsável por identificar e eliminar ameaças, como vírus e células alteradas – depositphotos.com / forfour
Foto: Giro 10

O que é a terapia com células T editadas para leucemia linfoblástica aguda?

A palavra-chave central nesse novo tratamento é leucemia linfoblástica aguda de células T, uma forma agressiva de câncer no sangue que costuma avançar rapidamente. A terapia experimental utiliza células T saudáveis de um doador, que passam por um processo de edição de bases, técnica capaz de alterar letras específicas do DNA. Assim, em vez de simplesmente adicionar ou remover grandes trechos de código genético, os pesquisadores ajustam de forma minuciosa apenas determinadas bases químicas, como se corrigissem um caractere em um texto muito longo.

Essa precisão permite programar as células T para reconhecer e atacar células com características típicas da leucemia de células T. Assim, o alvo principal costuma ser o marcador CD7, presente na superfície dessas células doentes. Ao final, o objetivo é criar um exército de células T modificadas, capazes de circular pelo organismo, localizar qualquer célula que carregue esse marcador e destruí-la. Portanto, tudo isso é pensado para que o novo sistema de defesa atue com força contra o câncer, reduzindo a chance de danificar outros tecidos.

Como funciona a edição de bases no tratamento da leucemia linfoblástica aguda?

A técnica de base editing empregada nesse contexto parte de um princípio simples: o DNA é formado por quatro bases principais — adenina, citosina, guanina e timina. Pequenas mudanças em uma dessas letras podem alterar o comportamento de uma célula. Em laboratório, especialistas aplicam um conjunto de ferramentas moleculares que "enxergam" o ponto desejado no genoma e fazem uma troca química específica, sem cortar a dupla hélice por completo. Isso reduz o risco de danos colaterais em comparação com métodos mais antigos de edição genética.

No caso da leucemia linfoblástica aguda de células T, a terapia passa por várias etapas de modificação das células T doadas. Entre as etapas descritas em estudos recentes, destacam-se:

Publicidade
  • Desativação do alvo natural das células T, para que não ataquem tecidos saudáveis do receptor;
  • Remoção do marcador CD7 das próprias células modificadas, evitando que se destruam mutuamente;
  • Criação de uma espécie de proteção contra determinados quimioterápicos usados no processo;
  • Programação final para atacar qualquer célula que apresente CD7 na superfície.

Após a infusão, essas células editadas passam a eliminar praticamente todo o conjunto de células T do organismo, tanto saudáveis quanto malignas. Depois que o câncer se torna indetectável, o paciente recebe um transplante de medula óssea para reconstruir o sistema imunológico com uma nova base.

Quais são os riscos, benefícios e desafios desse "medicamento vivo" contra a leucemia?

A terapia com células T geneticamente modificadas é descrita como intensa. Antes da infusão, o sistema imunológico precisa ser praticamente "desmontado", o que deixa o paciente altamente vulnerável a infecções. Durante esse período, cuidados de isolamento e monitorização constante são essenciais. Em alguns casos, o câncer também pode desenvolver mecanismos de escape, perdendo marcadores como o CD7 e se tornando mais difícil de ser detectado pelas células editadas.

Por outro lado, estudos clínicos envolvendo um pequeno grupo de pessoas com leucemia linfoblástica aguda de células T refratária demonstram taxas consideráveis de remissão. Em parte dos pacientes, o câncer não é mais encontrado após o tratamento, permitindo o transplante de medula e a retomada da rotina com exames periódicos. Esses resultados chamam a atenção porque muitos desses indivíduos tinham poucas opções terapêuticas restantes, com prognóstico bastante limitado antes de ingressar na pesquisa.

Especialistas em hematologia e transplante destacam alguns pontos que ainda precisam ser avaliados com mais profundidade:

  1. Duração da resposta: acompanhar por vários anos para saber por quanto tempo a doença permanece afastada;
  2. Segurança a longo prazo: monitorar possíveis efeitos tardios da edição genética;
  3. Escalabilidade: verificar se essa terapia pode ser oferecida em larga escala e em diferentes países;
  4. Custo e acesso: analisar formas de tornar o tratamento viável em sistemas públicos e privados de saúde.
Estudos clínicos envolvendo um pequeno grupo de pessoas com leucemia linfoblástica aguda de células T refratária demonstram taxas consideráveis de remissão – depositphotos.com / MattLphotography
Foto: Giro 10

Qual o impacto dessa abordagem para o futuro do tratamento da leucemia?

Os resultados iniciais com esse "medicamento vivo" sugerem uma mudança importante na forma de encarar a leucemia linfoblástica aguda de células T em estágios avançados. Em vez de confiar apenas em drogas que circulam de forma passiva pelo organismo, a proposta é treinar o próprio sistema imunológico — ainda que reconstruído a partir de um doador — para agir com maior precisão contra o câncer. Pesquisas em andamento analisam se variações dessa estratégia podem ser aplicadas a outros tipos de leucemia e até a tumores sólidos.

Publicidade

Até o momento, trata-se de uma ferramenta disponível apenas em centros altamente especializados e no contexto de estudos clínicos, com acompanhamento rigoroso e critérios específicos de seleção. À medida que mais dados surgirem, será possível compreender melhor quais perfis de pacientes se beneficiam mais, quais ajustes ainda são necessários e como essa forma de imunoterapia poderá ser integrada a protocolos padrão. Para famílias e profissionais de saúde que lidam com casos de difícil controle, o avanço dessa técnica representa uma via concreta de investigação, com potencial para ampliar as alternativas terapêuticas nos próximos anos.

Curtiu? Fique por dentro das principais notícias através do nosso ZAP
Inscreva-se