As 3 grandes crises da história da Ferrari na F1

A má fase atual da Ferrari é pequena diante das anteriores: já teve briga com mulher do dono, greve, bate-boca...entenda.

10 jun 2022 - 17h25
(atualizado às 18h01)
Prost rumo à 100ª vitória da Ferrari na F1 em Paul Ricard
Prost rumo à 100ª vitória da Ferrari na F1 em Paul Ricard
Foto: Ferrari / Divulgação

Quem vê hoje a Ferrari de certa forma batendo cabeça não imagina as crises que a equipe já teve anteriormente e que deixaram a um ponto de frangalhos. Embora seja uma gigante, a Ferrari acabava entrando no modelo que se tem do italiano: passional e dramático ao extremo. Vamos recordar algumas delas...

1962 – Apertem os cintos que os técnicos sumiram.

Em 1961, após ter desdenhado com gosto, a Ferrari se rendeu ao motor traseiro e veio com o modelo 156 “Squalo” (Tubarão). O carro veio bem-nascido e os italianos venceram 4 das 8 etapas daquele ano. Tudo indicava que Wolfgang Von Trips venceria aquele campeonato, mas o aparatoso acidente em Monza que levou à morte de vários espectadores e do alemão não levaram a este campo e Phil Hill foi o campeão.

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Campeão em 1961 e retardatário em 1962. Esta foi a sina do 156
Foto: Ferrari / Divulgação

Tudo maravilhoso, correto? Errado.

Ao longo de 1961, as coisas não andavam em bons termos em Maranello. Os títulos nos campeonatos de construtores e de pilotos não ajudaram a desanuviar o clima. Enzo Ferrari não era necessariamente um conciliador, havia ainda uma briga por poder interno e uma interferência da esposa de Enzo, Laura, nos trabalhos da equipe.

Vários técnicos, incluindo o Engenheiro Chefe Carlo Chitti e o Diretor Esportivo Romulo Tavoni, foram se enervando com aquela situação e, no início de 1962, comandaram uma verdadeira revoada da equipe. O 156 acabou sofrendo no seu desenvolvimento e Enzo promove dois jovens ao comando do time: Angelo Bellei e um certo Mauro Forghieri, na época com 26 anos.

O incêndio interno foi resolvido, mas pagou o preço nos resultados, graças também aos grandes avanços dos construtores ingleses. O melhor resultado no ano foi o 2º lugar de Phil Hill em Monaco.

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1973 – O ano do grande sacrilégio

A Ferrari parecia ter voltado aos bons tempos depois de um terrível ano de 1969. Forghieri se debruçou no gabinete de estudos e desenvolveu uma nova linha de carros, tanto para a F1 e os Protótipos. A gênese da série 312B, com o motor 12 cilindros boxer, veio daí. Em 1969, a Fiat oficialmente assume 50% das ações da Ferrari, com ênfase na área de automóveis inicialmente.

O título bateu na trave em 1970 com Jacky Ickx. Mas no fim de 1972, a perda do campeonato de F1 e o mau desempenho nos Protótipos deixaram suas marcas e o inglês Peter Schetty deixa a Direção Esportiva. Forghieri decidiu por desenvolver mais ainda o 312B2, porém mais uma vez foi feito de bode expiatório. O novo Diretor Esportivo, Alessandro Colombo, viu que a Ferrari precisava de mudanças radicais e partiu para a ação...

Com o apoio financeiro da FIAT, que adquiriu o controle total da empresa (10% ficaram ainda com a família), Colombo, aproveitando que a Ferrari sofria com greves na Itália, encomendou chassi revisado para a inglesa TC Prototypes. Era um grande sacrilégio para os italianos.

Entretanto, os resultados ruins cobravam seu preço e esta foi a primeira vez que um F1 da Ferrari teria um apropriado trabalho de túnel de vento, coisa que Forghieri não era um entusiasta. O carro incorporava o motor 12 cilindros boxer e parcialmente a tecnologia de monocoque na construção do chassi (coisa que a Lotus introduziu em 1962).

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Na Espanha, apareceu o 312B3. Inicialmente, este carro foi apelidado de “Spazzaneve” (Limpa neve) por conta de sua frente larga. Mesmo assim, não teve um bom desempenho, muito motivado pela mudança de fornecedor de pneus no meio do ano (de Firestone para Good Year) e o carro teve pelo menos mais 3 versões ao longo do ano. O melhor resultado do ano foram dois 4º lugares.

Ickx e a Ferrari 312B3 "Limpa Neve". Serviu como base para o sucesso da década de 70
Foto: Twitter / divulgação

Mesmo neste quadro, a reestruturação foi à frente, com a chegada de Luca de Montezemolo ao comando do time por força da FIAT, a saída de Colombo e a reabilitação de Forghieri, com o 312B3 servindo de base para a versão 74 (aquela que Leclerc bateu no GP de Monaco histórico este ano), que deixou a Ferrari disputando novamente o campeonato no ano seguinte, e para a série 312T, utilizada pelos italianos de 1975 a 1980.

Lauda e Montezemolo: a dupla que levantou a Ferrari a partir de 1974
Foto: F1 / Divulgação

1986 a 1992 – O período em que tudo parecia perdido

Em 1985, a Ferrari bateu na trave do campeonato, mas a sua torre de babel interna mais uma vez impediu que o desenvolvimento fosse acompanhado e um italiano pudesse ser campeão novamente.   

1986 prometia ser o ano da reestruturação, mas deu errado de novo. FIAT e Phillip Morris, as principais financiadoras do time, concordavam que a equipe precisava de uma nova reorganização. Talvez tenha sido a última grande atuação de Enzo Ferrari à frente de sua empresa.

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Em outubro deste ano, é anunciada a chegada de John Barnard da McLaren, que chega com carta branca para mudar tudo. A equipe foi dividida em dois: Barnard comandaria o longo prazo, para o projeto aspirado e em uma estrutura na Inglaterra. Na Itália, Harvey Postlewhaite seguiria à frente e o carro de 1987 seria tocado por Gustav Brunner e Jean Claude Migeot.

O início foi tenso, mas a segunda parte de 87 foi produtiva, com a Ferrari disputando vitórias a partir do GP da Hungria. E Berger chegou ao ponto mais alto do pódio no GP do Japão, vencendo o GP da Austrália. Os italianos apareciam como favoritos para 1988.

A ideia de Barnard já era fazer 88 com o carro aspirado. Mas os problemas com o V12 não eram poucos e se optou por usar uma versão revisada do F1-87 dentro do novo regulamento. Se apontava a Ferrari como favorita, mas veio a McLaren/Honda e mudou tudo. Para piorar, Postlewhaite, Migeot e Barnard saíram do time. O ano foi terrível, tendo como ponto alto a vitória em Monza, semanas após a morte de Enzo Ferrari.

Alboreto no inicio de 1988 testando o F1-87/88 em Fiorano
Foto: Ferrari / Divulgação

A Ferrari 640 foi apresentada com grande esperança em 1989. Nigel Mansell vinha para o lugar de Michele Alboreto. O carro tinha um perfil muito diferente, com o chamado “bico de pato” e laterais alta. Além do motor 12 cilindros, os italianos apostavam no moderno cambio semiautomático, onde as mudanças eram feitas no volante.

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As mudanças também eram feitas do lado de fora. Após 6 temporadas, Marco Piccininni deixava o comando da equipe e vinha Cesare Fiorio, comandante de sucesso da operação de rali da Lancia. As esperanças não eram muitas, pois o carro não conseguia dar mais do que 3 voltas sem apresentar problemas. Diante deste quadro, a vitória de Nigel Mansell no GP do Brasil chamou a atenção.

Mansell a caminho da vitória no GP do Brasil de 1989.
Foto: Ferrari / Divulgação

O 640 mostrou potencial, mas o time gastou muito tempo para resolver os problemas de confiabilidade do câmbio. Mesmo assim, o carro se mostrou capaz de se bater com as McLaren nos circuitos mistos, com Mansell vencendo o GP da Hungria. Só que o estilo de Barnard confrontou o sistema italiano e o inglês saiu no meio do ano, com a estrutura montada na Inglaterra sendo desmontada.

Para 1990, a visão foi a seguinte: o carro tem potencial e vamos usar a base. O argentino Enrique Scalabroni veio para desenvolver o carro, com a posterior chegada de Steve Nichols da McLaren. Alain Prost vinha para o lugar de Berger e a esperança de um título voltava a bater. O 641/2 era trabalhado em detalhes e o V12 foi bem trabalhado.

Prost e Mansell na apresentação do 641/2 em 1990
Foto: Ferrari / Divulgação

No meio da temporada, a Ferrari conseguiu uma ótima fase, calhando com uma estagnação técnica da McLaren. Prost chegou a liderar o campeonato após o GP da Grã-Bretanha, obtendo 4 vitórias até então. Só que mais uma vez o fator interno cobra sua fatura: Scalabroni saiu, juntamente com o principal nome da Aerodinâmica, Henri Durand (foi para a McLaren). Na fase mais crítica do campeonato, a Ferrari piscou.

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Por outro lado, a McLaren juntamente com a Honda conseguiu recuperar terreno e se impôs nos críticos GPs da Bélgica e Itália com Senna.  Prost ainda respeitou com a vitória na Espanha, mas o clima dentro do time já era difícil, com o francês reclamando que Mansell não o ajudava. No fim, Senna e Prost bateram no Japão e o título ficou nas mãos do brasileiro.

1991 era o ano em que se julgava que iria. Mais uma vez, o time usou o carro do ano anterior como base: Steve Nichols comandou o desenvolvimento do 642. A equipe de motores incorporou uma série de melhorias no V12 e a pré-temporada deu motivos para esperar por tempos melhores. Jean Alesi vinha para substituir Mansell.

Mas a temporada começou e a McLaren mostrou um ritmo muito à frente, além da Williams ter vindo com um FW14 com bastante potencial. Só que a parte interna já estava muito ruim. A parte de motores mudou a gestão eletrônica dos carros sem avisar os pilotos e Alain Prost se reportava diretamente à cúpula da FIAT, deixando Cesare Fiorio totalmente para trás.

O caldeirão explodiu em San Marino:  Prost rodou na volta de apresentação e Alesi saiu logo no início. Antes da 5ª volta, as Ferrari estavam fora da prova. Monaco foi o ponto mais alto da briga Fiorio x Prost e o chefe de equipe foi demitido neste fim de semana. Nichols também saiu do time e Jean Claude Migeot voltava para desenvolver um novo carro. O responsável pelos motores, Claudio Lombardi, assumia o comando juntamente com Francesco Longanesi, então homem de imprensa da FISA.

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A toque de caixa, Migeot altera o 642 e cria o 643, mais próximo da tendência geral de bico alto. O carro mostra potencial em sua estreia no GP da França, mas não passa disso. As reclamações eram enormes, culminando na comparação feita por Prost após o GP do Japão do seu carro com um caminhão. O contrato foi rescindido e o francês nem correu o GP da Austrália...

Prost e a 643: um inicio esperançoso, mas um final terrível
Foto: Ferrari / Divulgação

No fim de 1991, Luca de Montezemolo, o homem que trouxe a Ferrari às vitórias na década de 70, é trazido pela FIAT para comandar toda a operação. E um projeto radical é trazido para 1992, o F92A. Comandado por Jean Claude Migeot, o carro tinha um fundo duplo para tentar aumentar a carga aerodinâmica. Só que o projeto não deu certo e a Ferrari teve um dos seus piores anos..., mas serviu para levar a equipe para os novos patamares na década de 90...

Ferrari F92A: a revolução que não deu certo
Foto: Ferrari / Divulgação
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