Por que queda de Kharkiv seria um duro golpe para Ucrânia

14 mai 2024 - 10h18

Rússia avança em ofensiva para tomar a segunda maior cidade ucraniana, que é um importante centro industrial e científico. Batalha por localidade símbolo de resistência pode se tornar a mais sangrenta do conflito.Dois anos após a fracassada tentativa de tomar Kharkiv, a Rússia volta a avançar sobre a segunda maior cidade da Ucrânia. Até recentemente, especialistas afirmavam que as operações russas na região de Kharkiv seriam mais uma campanha de propaganda do Kremlin, e que Moscou não teria capacidade militar para tomar a cidade.

Contudo, no início de maio, o Exército russo conseguiu tomar com rapidez vários vilarejos ao norte da região de Kharkiv, aumentando as preocupações sobre segurança da cidade.

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Para Kiev, há muito mais em jogo do que uma perda de território. Kharkiv é de fundamental importância para o país por vários motivos, seja como polo cultural e econômico ou como um dos símbolos da resistência ucraniana à invasão russa.

Segunda maior cidade da Ucrânia

Kharkiv já era uma cidade grande na época do Império Russo. Entre 1919 e 1934, foi a primeira capital da Ucrânia soviética. Apesar da predominância do idioma russo, a cultura ucraniana floresceu em Kharkiv entre as décadas de 1920 e 1930, quando as personalidades locais foram vítimas do terror imposto pelo ditador soviético Josef Stálin. Os nomes de muitos escritores e poetas dessa geração voltaram a ser conhecidos somente após a Ucrânia se tornar um Estado independente.

Durante o regime soviético, Kharkiv se tornou um centro industrial, científico e de transportes. A cidade herdou da União Soviética um polo industrial de alta tecnologia e importantes instituições acadêmicas, incluindo a Universidade Nacional Karasin, a Universidades de Direito e o único instituto de aviação do país. Nos anos 1930, a primeira divisão atômica ocorrida na União Soviética foi realizada em um instituto de ciências de Kharkiv.

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A cidade está localizada a 40 quilômetros da fronteira com a Rússia, na intersecção de rodovias estratégicas do leste a oeste e do norte para o sul, incluindo a rota de Moscou para a Península da Crimeia a partir da região russa de Rostov.

Até recentemente, Kharkiv produzia componentes para usinas nucleares, hidrelétricas e térmicas, além de aviões, tratores e tanques. O maior mercado da Ucrânia, o Barabashovo, está localizado no centro da cidade.

Símbolo de resistência

Devido aos bombardeios russos e à consequente falta de energia elétrica, muitas das empresas não conseguem continuar operando normalmente. É improvável que a Ucrânia possa transferir todas elas para regiões mais seguras, pois essa transferência exige tempo, muito dinheiro e trens de carga - ou seja, coisas que estão em falta no país.

Algumas pequenas empresas se mudaram para o oeste da Ucrânia em 2022. Em abril, a imprensa ucraniana divulgou os planos de duas indústrias de grande porte, que se fundiram pouco antes da invasão russa, de estabelecerem filiais no oeste ucraniano.

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A Rússia jamais escondeu o desejo de capturar Kharkiv. O ex-presidente russo Dmitry Medvedev anunciou abertamente que a área se tornaria a quinta região da Ucrânia a ser anexada pela Rússia no segundo semestre de 2022.

Entretanto, uma bem-sucedida contraofensiva ucraniana frustrou os planos de Moscou. Kharkiv ficou marcada como a região de onde o Exército russo literalmente fugiu, deixando para trás equipamentos e munição.

Analistas não tinham dúvidas de que a Rússia tentaria se vingar. A queda de Kharkiv e da região seria um duro golpe para a segurança energética da Ucrânia. As consequências econômicas seriam muito mais graves do que as perdas de Donetsk ou Mariupol.

Importância econômica

Segundo estatísticas do governo, a região de Kharkiv foi a terceira que mais contribuiu para o Produto Interno Bruto (PIB) ucraniano em 2019 (6,3%), atrás de Kiev e Dnipropetrovsk. Além disso, a região possui a maior reserva de gás natural do país, capaz de cobrir praticamente toda a demanda nacional.

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Uma possível batalha por Kharkiv tem potencial para se transformar na mais sangrenta da guerra até agora. Isso se deve às dimensões da cidade, com 350 quilômetros quadrados, e seus atuais 1,3 milhão de habitantes -aproximadamente do tamanho de Munique, na Alemanha.

O número de habitantes de Kharkiv é praticamente o mesmo de antes da invasão russa. Apesar de muitos moradores terem deixado a cidade, centenas de milhares se abrigaram em Kharkiv fugindo da região do Donbass - em grande parte ocupada pela Rússia - e de outras partes do país onde o conflito começou mais cedo.

Em 2014, as tentativas de grupos de insurgentes pró-Rússia de tomar cidades no leste da Ucrânia, com a colaboração de serviços de segurança de Moscou, deram certo em Donetsk e Lugansk. Já em Kharkiv, eles foram rapidamente expulsos do edifício da administração local.

Linhas de defesa

Quando a guerra começou no Donbass, no mesmo ano, Kharkiv se tornou um hub do Exército ucraniano e um dos pontos centrais do movimento de voluntários. Ali eram feitos os reparos de equipamentos militares e os feridos podiam receber tratamento médico. Várias instalações militares da era soviética permaneceram na região, incluindo um depósito de armas e um campo de aviação militar.

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A ofensiva russa no nordeste do país não pegou os ucranianos de surpresa. Várias linhas de defesa foram construídas ao redor de Kharkiv, o que não ocorreu nas áreas rurais que a cercam. A Rússia, porém, possui a vantagem estratégica de conseguir bombardear a cidade a partir de seu território.

A Ucrânia consegue retaliar somente com seus próprios mísseis de curto alcance, e não com os de longo alcance do Ocidente, devido a restrições ocidentais impostas ao país para uso desses armamentos. O Reino Unido declarou recentemente que pretende mudar isso. Entretanto, muitos países ocidentais ainda resistem à ideia de que a Ucrânia use as armas fornecidas pelos aliados para atingir alvos na Rússia.

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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