A iniciativa surgiu após a difusão do vídeo de uma criança de oito anos que teve a cabeça raspada em um abrigo para menores no 13º distrito de Paris pelos educadores do estabelecimento, que divulgaram as imagens em suas redes sociais.
Em mensagens trocadas em grupo no WhatsApp que vazaram para a imprensa, eles gozam do menino e dizem que ele levou um "castigo", por isso teve a cabeça raspada. A cena aconteceu em fevereiro, e a mãe do garoto, que pediu explicações, ouviu que a criança tinha piolho.
Ela denunciou o caso à Justiça, sem resultado. Mas foi só após reações de várias personalidades políticas e a repercussão na imprensa que a Procuradoria de Paris decidiu abrir uma investigação, na última terça-feira (10).
O texto analisado nesta quinta em primeira leitura pela Assembleia Nacional foi aprovado por 269 deputados e deverá ser incluído na pauta do Senado. Ele não teve nenhum voto contra. "Graças a esta lei, nenhuma criança atravessará sozinha os corredores da Justiça", declarou a deputada socialista autora do texto, Ayda Hadizadeh. "Um advogado verifica, questiona, alerta, dá voz àquilo que, sem ele, permaneceria abafado."
Cerca de 380 mil menores poderão se beneficiar das medidas. As crianças em situação de risco social ou abandono são, por decisão de um juiz, acolhidas em um abrigo ou acompanhadas por um assistente social em suas famílias quando permanecem nela. Na França, o Serviço de Proteção à Infância pode decidir confiar ao Estado a educação de uma criança, mantendo o contato com os pais.
Mas o sistema de proteção à infância na França está à beira do colapso, denunciam associações e profissionais. Vários abrigos receberam denúncias de prostituição de menores, como revelaram Le Monde e outros jornais franceses, além de casos de violências cometidas por educadores.
Na maioria das vezes, os menores não têm o acompanhamento de um advogado, mesmo podendo solicitá-lo quando têm discernimento. O juiz também pode pedir a designação de um advogado "quando o interesse da criança assim exigir". Se essa criança com a cabeça raspada "tivesse tido um advogado, talvez esses covardes não tivessem ousado tocá-la", afirmou a deputada socialista.
"Passar à ação"
A iniciativa socialista teve o apoio do ministro da Justiça, Gérald Darmanin, mas a ministra da Saúde, Stéphanie Rist, fez algumas ressalvas. "Além de um esforço orçamentário importante", o texto exige "a mobilização de recursos humanos que não poderão ser implementados a curto prazo", alertou. "Avançar para uma sistematização direta traz o risco de desorganização e saturação de nossas jurisdições."
A ministra apoiou uma emenda dos deputados do partido de direita Os Republicanos (LR na sigla em francês) - que não foi aprovada - propondo uma fase de testes de dois anos em quatro tribunais judiciais. De acordo com ela, a apresentação de um projeto de lei relativo à proteção da infância está prevista "para o primeiro trimestre de 2026".
Vários deputados destacaram que uma experiência já foi realizada pelo tribunal judicial de Nanterre, perto de Paris. "Uma experiência local bem-sucedida não pode justificar uma generalização imediata", comentou Élisabeth de Maistre (grupo LR), única deputada que optou pela abstenção.
De acordo com ela, o texto tende "a deslocar o foco da proteção da infância para uma lógica estritamente contenciosa". "Não é mais hora de experimentar. É hora de agir", defendeu Perrine Goulet (MoDem), que considerou a aprovação um momento "histórico".
Menores isolados
A Assembleia Nacional francesa também analisou nesta quinta outra proposta socialista sobre a proteção de menores. Ela visa garantir que menores "suspeitos" de serem maiores mantenham acesso aos serviços de proteção à infância quando apresentarem recurso judicial.
"Hoje, crianças e adolescentes dormem sozinhos na rua", afirmou o deputado socialista - e candidato à prefeitura de Paris - Emmanuel Grégoire, autor do texto, que foi rejeitado pela comissão parlamentar. A solução "apresenta riscos de engessamento do sistema e de saturação dos dispositivos de acolhimento", avalia Charlotte Parmentier-Lecocq, ministra encarregada da Autonomia e Pessoas com Deficiência.
Com agências