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O Natal de Martim Lutero

7 nov 2017 - 12h00

Muitas das celebrações e costumes de hoje vieram de tempos muito antigos, remotos, cujas raízes perdem-se em tempos pretéritos. Assim dá-se com a data de 25 de dezembro, o nosso Natal, celebrada no Oriente Médio bem antes do nascimento de Jesus. Todavia o costume de ter-se na sala da casa um pinheiro decorado com bolas, estrelas e luzes de enfeite, é relativamente recente. Supõe-se que originou nos tempos da Reforma Protestante, no século 16, ocasião em que Martim Lutero, o monge alemão que se rebelara contra Roma, celebrou o Natal com um galho de pinheiro decorado por ele e seus filhos.

Martim Lutero
Martim Lutero
Foto: Divulgação

O catolicismo,  herdeiro de Roma

“Não quero que se recorra para defender o evangelho às armas e à carnificina. Foi pela palavra que o mundo foi vencido; foi pela palavra que a igreja foi salva; será também pala palavra que ela há de ser restabelecida.”  - Martim Lutero, 1520.

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O catolicismo herdou do império romano não só o latim mas o gosto pela magnificência pública, amando a arquitetura grandiosa, a estatuária e a pintura mural. Os imensos estádios do romanos, como o Coliseu - templo erguido ao divertimento cruel -,  foram substituídos pela catedrais gigantescas cuja torres queriam alcançar os céus, erigidas para o êxtase e a veneração de Deus. Enquanto o papa assumia as vezes do imperador, as procissões religiosas tendo o bispo à frente apagaram para sempre as  marchas triunfais dos cônsules e dos generais romanos de outrora. O espaço  das igrejas, das abadias e dos mosteiros, foi entregue a artistas de gênio para que os ocupassem com figuras de santos e santas, como os afrescos de Cimabue e Giotto na Basílica da Assis, ou com passagens bíblicas como a Santa Ceia de Leonardo da Vinci  ou a Criação do Mundo que Miguel Ângelo pintou nos altos da Capela Sixtina. O catolicismo ganhava os seus conversos pelo catecismo sim mas também pela imponência dos seus cortejos e cerimônias litúrgicas, pela exuberância da sua arte pública, por colocar o talento de um Brunelleschi, de Bramante ou de Alberti a seu serviço, ação que fez da Itália o lugar com a maior concetração de obras-primas que se conhece no mundo todo. 

A conversão de S.Paulo ( Lucas Cranach)
Foto: Divulgação

A presença de Deus

Ao adentrar-se numa nave de uma igreja ou de uma catedral, inundada nos dias de sol pelos reflexos das inúmeras cores fortes dos vitrais, tendo ao fundo o som harmônico das vozes dos monges, ao sentir-se aquele êxtase, onde o construtor, o pintor e o cantor cristão deram o melhor de si para torná-la um recinto divino, como não acreditar que o próprio Deus ali não estava presente? Como o monge Martim Lutero ousou desafiar aquilo tudo? Pois foi exatamente aquela suntuosidade herdada do império pagão desaparecido que o teólogo alemão acreditou ser insuportável aos que diziam seguir Jesus Cristo marceneiro, um homem pobre martirizado na cruz. 

A volta às origens cristãs

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Para Lutero, o cristianismo fora uma notável revolução dos cordeiros, da gente humilde da antigüidade que se insurgira contra as injustiças do mundo pagão. Porém, com o passar do tempo, ainda que vitoriosos, eles viram-se usurpados pela casta sacerdotal, sucessora da burocracia imperial em decadência, fazendo com que o pároco substituísse o pretor romano. Concentrando toda a autoridade ao redor do trono papal, os altos eclesiastas esvaziaram as comunidades cristãs da sua primitiva autonomia, inclusive do direito de escolherem seus próprios pastores,  como antes, nos primórdios, fizeram os cristãos ao elegeram bispos a Agostinho e a Ambrósio. Pior ainda, como ele expôs no Manifesto à Nobreza Alemã, de 24 de julho de 1520, fizeram do papa “Senhor do Mundo”, quando o próprio Jesus Cristo insistira que o seu reino era o Reino do Outro Mundo. Aquela riqueza artística que se concentrava em Roma, a monumental Igreja de São Pedro que se erguia naquele momento, era fruto ilegítimo das arrecadações que o papado ordenara extrair da Alemanha em troca de favores a serem alcançados no mundo sobrenatural. Era com o ouro das Indulgências surripiado dos beatos alemães que erguiam-se os templos e mantinha-se o luxo em Roma.

Um Cristo modesto (tela de Lucas Cranach, 1472-1553)
Foto: Divulgação

A Reforma e a música

Os cristãos, portanto, com a Reforma por ele liderada, deviam retomar o que era seu, reconquistando o seu império perdido. A Bíblia ele tratou de traduzir para o alemão afim de que os crentes pudessem por si mesmos, ao lê-la, saber qual era a vontade e os ensinamentos de Deus. Novos hinos, diferentes dos latinos, deviam ser compostos por gente do povo. Lutero lançou-se à obra. Rompido com Roma, casou-se e fez do seu lar uma celebração diária a Deus. Cada cristão deveria seguir caminho igual, compor seus próprios oratórios, tornar a sua casa uma capela, fazer da  sua família um coral, rejubilando-se pela boa vida e pela liberdade alcançada. Por toda a Alemanha, desde então, surgiram músicos, organistas ou pianistas, consagrando a vida às partituras e aos instrumentos. É Lutero quem está por detrás de Bach, de Haendel, de Haydin  e de Beethoven. Se a Reforma Protestante empobreceu as igrejas, esvaziando os templos de santos e de outras pinturas decorativas, deixando-os enxutos, sóbrios, enriqueceu o espaço privado e público com o intenso som harmônico da música e das cantorias, consagrando a Alemanha como a moderna pátria dos grandes compositores.

O lar, a capela do cristão (A família sagrada de L. Cranach)
Foto: Divulgação

Nasce a árvore de Natal

Seguindo seus próprios conselhos, ele casou-se em junho de 1525 com Katharina von Bora, uma freira que, desertado do convento de Nimbsch,  procurara refúgio em Wittemberg, tendo com ela seis filhos O lar para Lutero, o privado, passou a ser a verdadeiro templo do cristão reformado. Era ali que davam-se as Tischreden, as conversas ao redor da mesa, que faziam as vezes da comunhão. Mas faltava-lhe algo que pudesse contrapor à missa do galo dos católicos. Certa vez, numa daqueles terríveis noites geladas da Alemanha,  nas proximidades do Natal, ao retornar para casa Lutero encantou-se com a paisagem. Olhando para o céu através de uns pinheiros que cercavam a trilha, viu-o intensamente estrelado, pareceu-lhe infinitos diamantes encimando a copa das árvores. Tomado pela beleza daquilo, decidiu arrancar um galho  para levar para casa. Lá chegando, entusiasmado, colocou-o num vaso com terra e, chamando a esposa e os filhos, decorou-o com pequenas velas acesas afincadas nas pontas dos ramos. Em seguida, arrumou uns papeluchos coloridos para enfeitá-lo um pouco mais. Pronto, era aquilo que ele virá lá fora. Todos se afastaram e ficaram pasmos ao verem aquela árvore iluminada a quem parecia terem dado vida. Nascia assim a árvore de Natal.        

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Fonte: Especial para Terra
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