Compreenda a formação do pensamento político de Hitler

O líder nazista sempre manifestou clara aversão ao intelectualismo, dando ênfase ao primado da vontade e da ação

4 fev 2016 - 12h37
(atualizado às 12h39)
Adolf Hitler
Adolf Hitler
Foto: Getty Images

Acostumou-se a pensar ter sido Adolf Hitler, morto em 1945, uma vergonha dentro da Civilização Ocidental e Cristã, espécie de excrescência política sem raízes em nossa tradição. A indução a esse tipo de erro deve-se, em parte, à conceituação de ser essa Civilização apresentada como um monopólio identificado com os princípios do humanismo, do liberalismo e da tolerância, omitindo-se discretamente sua latência colonialista, racista e agressiva, que germinava na cultura ocidental. 

Antes de apresentarmos os argumentos necessários a refutar as considerações iniciais, acreditamos ser necessário alertar para as dificuldades que se antepõem àqueles que pretendem rastrear sua ideologia. Em primeiro lugar, Hitler sempre manifestou clara ojeriza ao intelectualismo, dando ênfase ao primado da vontade e da ação. Em segundo lugar, a totalidade da sua obra política ainda não foi reunida. Ele próprio empenhou-se em evitar uma edição dos seus discursos.

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A razão disso é muito simples. Todo e qualquer político de massas, como ele foi, é obrigado a realizar pronunciamentos muitas vezes contraditórios, oscilando suas opiniões conforme o momento ou o público. Sendo crente no principio da infalibilidade da liderança – o Fuhrerprinzip – Hitler não admitia que encontrassem em seus pronunciamentos, incoerências ou idiossincrasias que causassem dúvidas ou lançassem sombras sobre sua integridade ideológica.

Portanto, enquanto não for realizado o levantamento completo de seus discursos, em que boa parte deles se encontram transcritos no órgão oficial do partido nacional-socialista – o Völkischer Beobachter – devemos nos contentar com o Mein Kampf publicado em 1925, ou com as anotações feitas nas Tischgespraechen e, ainda, com o Adolf Hitler in Franken.

Análises sobre Hitler

O papel de Adolf Hitler gerou uma bibliografia verdadeiramente pródiga e, em geral, de excelente nível, tais como as de Ernst Noite, Der Faschismus in seiner Epoche; a de Karl D. Bracher, Die deutsche Diktatur; a do historiador britânico Alan Bullock, Hitler: a study of a tirany e o mais recente trabalho de Joachim Fest, Hitler, que anteriormente já se havia consagrado com a notável Das Gesicht des Dritten Reiches. Devemos lembrar, ainda, o livro do professor J.P. Stern, Hitler: the Führer and the people, editado a pouco menos de sete anos, caracterizado pelo seu esforço de síntese e brilho intelectual. Merecendo um especial destaque a imensa obra de Ian Kershaw, editada em dois tomos: Hitler, 1889-1936 Hubris; Hitler, 1936-1945 Nemesis, aparecidas em 1998 e 2000 e traduzidas para o português Hitler, Companhia das Letras, 2009).

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 Quase todos esses trabalhos foram sob o prisma da interpretação liberal ou social-democrática, corrente que até agora se mostraram mais ativas na sua tentativa de compreensão do nacional-socialismo. Deve-se igualmente alertar que a personalidade de Hitler tem sido minuciosamente averiguada pelos adeptos da psico-história. No entanto, basta passar os olhos sobre esse tipo de literatura para ficar em dúvida sobre a sanidade, não de Hitler, mas a de seus psico-interpretes.

Hitler segundo o marxismo

Não deixa de parecer estranho que até nos dias atuais o pensamento marxista foi incapaz de produzir um trabalho clássico sobre o seu principal e formidável inimigo, aquele que desejava exterminá-lo. A literatura marxista não tem sido feliz em suas análises demonstrando uma impotência teórica abrumadora: repetem ad nauseam ( insistentemente) os conhecidos ditos de ter sido Hitler o representante máximo da “ditadura do capital financeiro” ou o “tirano do capitalismo monopolista”, terminando por reduzir o nazismo a um epifenômeno da economia, não apresentando razões mais contundente para as massas germânicas terem aderido às suas propostas.

Por outro lado, essa impotência é reveladora do porque de sua derrota nos anos vinte e trinta frente ao nazi-fascismo. Um esforço recente foi aquele realizado pelo neomarxista Nicos Poulantzas Fascisme et Dictadure, mas que deixou muito a desejar na medida em que encontrou muito mais preso à metodologia estruturalista do que ao maior legado de Marx, que foi a história.

O caminho prussiano

Enquanto os jacobinos e girondinos franceses destroçavam as amarras do Ancien Regime por meio de um processo revolucionário que sepultou a nobreza feudal, aos intelectuais alemães coube realizar uma “revolução pelo espírito”, que produziu apenas excelentes tratados filosóficos. Não está longe da verdade a imagem de terem os pensadores alemães se debruçado sobre as margens orientais do Reno e assistido embevecidos às façanhas irreverentes de seus vizinhos.

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Alguns mantiveram esperanças que o “espírito da razão” atravessasse a braçadas o rio e emancipasse a nação alemã. Mas não foi o “espírito” e sim o Grande Exército napoleônico que se apossou da nação alemã. Não foram os argumentos iluministas os mais convincentes, mas, sim, a artilharia francesa. Assim, na Alemanha, o liberalismo vinculou-se inarredavelmente ao exército de ocupação – algo estranho a ser rejeitado pelos “verdadeiros alemães”. E quando se deu o desabamento do império napoleônico, a vitória coube às forças conservadoras feudais da Santa Aliança, coligação tradicionalista e aristocrática que continuou a gozar de prestígio junto à população alemã.

Na medida em que se considerava impotente para derrubar o poderoso Estado militar-feudal prussiano sediado em Berlim, a burguesia alemã resignou-se escolhendo a  capitulação. Ainda em 1848/1849, na chamada Revolta dos Poetas, tentou inutilmente impor suas diretrizes de cunho liberal, mas fracassaram. O medo que o populacho pudesse avançar politicamente refreou-lhe o desejo de emancipação.

Deste modo, frustrada a solução da unificação nacional pela via liberal, só restou ao capitão da progressista região do Reno seguir o junker, o guerreiro feudal e comandante das armas do exército prussiano. O resultado disso foi  a ascensão do II Reich, fundado por Otto von Bismarck, o estadista prusssiano que consolidou o poder autoritário sobre o restante da Alemanha às custas de guerras.

A burguesia alemã submete-se ao Estado Feudal

Bem antes, o filósofo Hegel havia traçado o perfil desse peculiar acordo entre a burguesia alemã e o aparelho feudal-prussiano.

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“O Estado”, disse ele “é o espírito como vontade substancial revelada clara para si mesma, que se conhece e se pensa e realiza o que sabe e porque (...) enquanto o individuo obtém sua liberdade substancial da sua atividade”.

Quer dizer, a liberdade não se dá como ocorreu entre a burguesia inglesa e francesa, isto é contra o Estado, limitando-lhe o poder e a autoridade, mas sim por meio dele e sob atenta proteção dele. Friedrich Engels, o companheiro de Karl Marx, furibundo sintetizou tal situação de conformismo afirmando que as pessoas de classe média alemã, estreita de pensamento, deixará a aristocracia prussiana no leme do Estado com quanto pudesse ganhar dinheiro.

Portanto, todo o roteiro de transformações que a Alemanha passou no século XIX (basicamente sua unificação nacional e acelerada industrialização) se deu dentro dos “quadros de ferro” do estado feudal-militar com seu culto à disciplina e à ordem e com escassa tolerância para com a dissidência política, consagrando o dito “Gegen demokraen helfen nur soldaten”, contra democratas só adianta soldados.

Esta contradição histórica e social, onde encontramos os meios de produção nas mãos de burgueses e as instituições políticas ocupadas pela casta militar dos junker, terminou mais tarde por conduzir o país à camisa-de-força do nacional-socialismo. A dolorosa gravidez da burguesia alemã não produziu um nascituro democrático e sim um tirano expressionista.

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O Social-Darwinismo

 Hitler não se abeberou somente do passado nacional alemão com seu culto ao militarismo e ao Estado todo-poderoso. O social-darwinismo, extremamente difundido a partir da publicação da obra de Charles Darwin em 1859, teve um peso inequívoco em sua concepção ideológica.

A idéia básica dessa teoria era que, como na selva, os destinos dos povos e a evolução geral da sociedade eram regidos por fatores de ordem biológica. As mesmas leis que existiam na selva e nas savanas imperavam na sociedade humana.

No plano político, a ideologia social-darwinista conduzia a fazer uma apologia dos mais fortes, daqueles que conseguiam se impor perante o rebanho. Seriam eles, os ricos, poderosos, proprietários, condutores naturais da sociedade humana da mesma forma que os leões se impõem sobre os demais animais da floresta.

Segundo esse raciocínio, qualquer idéia que propusesse a igualdade entre os homens não estaria apenas propagando uma quimera como,, igualmente, cometendo um atentado contra a natureza.

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Os social-darwinistas propunham um processo de seleção rigorosa por meio da eugenia, operação que exigia ao mesmo tempo a eliminação e a procriação de certos tipos humanos – quer dizer, um controle biológico qualitativo, que permitiria a supremacia de alguns sobre os demais.

Radicalizando-se com o tempo, defendiam a eliminação dos desajustados, o apelo ao dirigismo técnico para a política de colonização, o internamento forçado em silos e a esterilização dos elementos tidos como inferiores.

Essa doutrina trazia em bojo uma categórica rejeição tanto ao socialismo como à democracia na medida em que, tanto um como o outro, se opõe ao domínio do mais forte e ao sucesso do mais apto e capaz, como era aceito pelos social-darwinistas.(*)

Não existe igualdade na selva e nem se dá a partilha equitativa dos recursos materiais. Os leões não são iguais aos cordeiros e nem eleitos por esses. Eles simplesmente se  impõem aos demais. Como facilmente se observa, todo o programa nacional-socialista já se encontrava previamente esboçado nessas teorias, que tinham ampla difusão e aceitação por toda Europa “respeitável” no período anterior à Primeira Guerra Mundial. Já Mussolini bradava a respeito do Movimento Fascista, "Noi il leone!" (Nós os leões!).

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(*) o termo social-darwinismo surgiu em 1879 por obra de um artigo publicado na revista Popular Science, por Oscar Schmidt. Seus antecedentes ideológicos prestam tributo ao demógrafo e economista inglês Thomas Malthus, ao sociólogo Herbert Spence, ao sobrinho de Darwin Francis Galton  e  ao biologista alemão Ernst Haeckel.

Líder nazista Adolf Hitler
Foto: Reprodução

 A visão conflitiva da humanidade

Em sua visão universal ( Weltanchauung) havia uma luta permante entre dois tipos de humanidade. Uma - a desprezada por ele - a que denominou de ‘humanidade individualista’, guiava-se por sentimentos de fraternidade e espírito de colaboração influenciada por princípios morais religiosos ou inspirada em filosofias sociais que visavam a contenção dos instintos e da agressividade humana.

A outra, a qual ele se alinhava, era a 'humanidade natural’, que se aproximava com mais fidelidade das leis mais primárias que justamente são as que ‘destroem a debilidade para dar lugar a força’. Esta celebra a coragem, o destemor, deixando-se levar pelos impulsos originais mais chãos que lhe permitem a superação dos desafios e o empenho na liquidação dos mais débeis.

Este conflito entre estas duas humanidades se estende para os povos e países. Dada a perspectiva de escassez futura das possibilidades materiais de reprodução da vida - visto que está em curso uma implacável disputa por espaço, - somente aquele ‘mais forte em coragem e em zelo’, o que 'possui a energia de o conquistar e o cuidado de o cultivar’, é que receberá ‘o prêmio da existência’, que sempre contempla o mais resistente. A natureza ‘não conhece limites políticos’.

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 Assim, somente a ‘cegueira pacifista’ de certos povos faz com que desistam das conquistas necessárias à reprodução e ampliação das raças fortes. E, se fazem isto, incorrendo no erro, contribuem para limitar-se e debilitar-se e, por isso mesmo, condenando-se a desaparecer do cenário da vida.

Duas ordens disputam o futuro da humanidade. A primeira esta baseada na presença do número, regida pelo espírito da democracia que teima em representar e promover as inúmeras raças mais fracas, cuja vitória representaria, fatalmente, o sucesso da anemia e da covardia, projetando o definhamento geral da humanidade, e a outra, ao contrário, é aquela em que as leis da ‘ordem natural’ estarão no comando.

O conflito filosófico claramente se dava entre o ideário iluminista, repudiado por ele, e o darwinista do qual se julgava intérprete e seguidor. Este embate não se dava pela luta de classes como os marxistas supunham, mas pela luta entre raças, um choque titânico pelo controle do mundo.

Neste caso, os reais vencedores serão ‘os povos de vontade brutal’, aqueles que não exigirão nenhum limite dos seus, nem aos seus instintos naturais e nem ao desejo de expansão e conquista.

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Esta luta fenomenal pela existência que cobre o planeta inteiro fará desaparecer as inibições inerentes ‘ao espírito de humanidade’ composto, segundo Hitler, por ‘palermice, covardia e pretensa sabedoria’, visto que o ‘instinto de conservação’ é imensamente superior a tudo e não se deixa prender por considerações de ordem ética ou moral. Tudo se move ‘numa luta perpétua, a paz eterna pô-la-á [a humanidade] no túmulo’. (Ver Adolf Hitler – ‘Minha Luta’, cap.IV).

Simultaneamente, embebido pela concepção heróica da história que ele absorvera de Thomas Carlyle (**), viu o choque entre as nações como embate entre seus líderes. Eram os super-homens ou titãs modernos que entravam na liça e venciam a parada. As massas apenas os seguiam obedientes e fiéis. A guerra era sempre uma atividade de gênios ou de gigantes, de personalidades excepcionais que saiam-se bem, devido a sua férrea vontade e vocação para o sucesso.

Hitler tinha total confiança na sua estrela, porque acreditava que o clarão da vitória iluminava aquele que tivesse a vontade de poder e seguisse a preponderância do mais forte e não pelos que dispunham de quantidades materiais.

Era a personalidade e não o número que importava (mentalidade que de certa forma explica o desatino dele em, confiando nos alemães serem uma super-raça, manter guerras simultâneas contra o Império Britânico, contra a URSS e contra os EUA).

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(**) Ele se impressionara com o famoso livro de Carlyle sobre a biografia de Frederico o Grande, publicado entre 1858/1868, em que ele defende o primado do herói sobre tudo.

O racismo

Outra poderosa vertente que fluirá para o caudal da ideologia nacional-socialista estava armazenada no pensamento racista do século XIX. Deve-se observar que as teorias racistas apresentavam em comum um “lamento aristocrático”, um fatalismo da nobreza européia que, apesar de ainda granjear respeito, sentia-se cada vez mais marginalizada do poder político pelo processo histórico.

Incapazes em poder explicar seu declínio social por meios racionais, diziam que a “decadência da raça aristocrática” resultara de uma irresponsável miscigenação com grupos inferiores.

Justificaram o declínio da nobreza pela degradação biológica de sua espécie. Seu principal representante foi o francês José Artur, conde Gobineau,  autor do Essai sur I’inégalle dès races humanes ("Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas"), de 1853-1855, que determinou não só a superioridade da raça branca sobre os demais, como explicava as distinções sociais entre nobreza, burguesia e povo de acordo com sua maior ou menor participação no sangue ariano (raça superior mitológica, formadora da aristocracia européia e dos brancos “puros” em geral).

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Coube a outro francês, o antropólogo Vacher de Lapouge, autor do L’ Arien, son role social, ("O ariano e seu papel social”), levar o naturalismo às últimas consequências. Na medida em que o homem não é a imagem de Deus, só são válidas as leis do reino animal. O Ariano  – rocher de bronze – que apresenta estabilidade do sangue, é o motor do progresso e da civilização humana e se encontra socialmente representado na classe dominante. 

Por último, lembramos aquele que interpretou toda a história da humanidade sobre o prisma racista – o inglês Houston S. Chamberlain, autor do famoso ensaio Die Grundlagen des Neunzehnten Jahrhunderts, Os Fundamentos do Século XIX, aparecido em 1899, onde acentua à luta entre as raças, interpretando a história como um conflito entre elas.

Ele considerava os alemães como os últimos portadores de elementos sanguíneos puros na medida em que, graças à sua situação geográfica, não foram contaminados nem pelo decadentismo latino, nem pela barbárie asiática, como ocorrera com os eslavos. Esta crença na Supremacia Teutônica lhe foi inculcada pela convivência com o compositor Richard Wagner, de quem se tornou genro quando passou a ser um integrante do Círculo Bayereuth, composto por escritores e intelectuais ultra-nacionalistas. 

Quando foi apresentado a Hitler, então no início de sua carreira, afirmou “o fato de que a Alemanha tivesse dado à luz um Hitler, na hora de sua maior desgraça, demonstrava sua vitalidade como nação.”

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O antissemitismo

        Se a difusão das idéias racistas poderia parecer uma novidade no contexto cultural europeu, o mesmo não se pode dizer em relação ao anti-semitismo (*), cujas origens datam no tempo das Cruzadas. Deve-se observar, no entanto, uma radical modificação nos argumentos dos antissemitas. Até o século XVIII, o preconceito contra os judeus se fundamentava em razões de ordem religiosa ou teológica.

            No século XIX, com o enorme desenvolvimento das ciências naturais e positivas, os argumentos cristãos caíram em desuso. O moderno antissemitismo então vai se abeberar na corrente naturalista, dando o surgimento de um anti-semitismo secular, que retira seus argumentos da fisiologia, da biologia, da genética e da bacteorologia. 

A partir de então a literatura reacionária é pródiga na utilização de termos como “vírus judaico”, “bactérias nocivas”,... Aos quais contrapõe a política da eugenia da preservação da raça branca ariana. Mas o anti-semitismo redobra suas forças não só pelos argumentos obtidos junto aos naturalistas. 

O século XIX, é o século do nacionalismo burguês, perante o qual o judeu foi visto como um elemento não assimilável, um cosmopolita incorrigível, um apátrida incapaz de aderir ou compreender o conceito de nação. Fato explicitado pelo famoso Caso Dreyfuss, ocorrido na França no final daquele século.

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O mesmo tema, da impossibilidade de adaptação do judeu a uma outra cultura, foi abordado pelo famoso historiador Heinrich Treitchke, símbolo maior da Alemanha “respeitável”, num ensaio de grandes repercussões publicado em 1879. Um dos seus discípulos foi o professor Hans Gunther, autor da Pequena Etnologia do Povo Alemão, aparecido em 1929, em que ele celebrou o Ariano Nórdico como a vanguarda da civilização, condenando com veemência a “introdução de sangue estrangeiro” na Europa.

Além disso o anti-semitismo tomou impulso, segundo o historiador Robert Seltzer, por ser uma reação ao sucesso dos judeus emancipados em meio à sociedade européia do século XIX. Situação que passou a causar mais temor ainda do que a imagem do antigo judeu de gueto que somente, de vez em quando, era assolado por violências e pogroms.

Por fim, sob o ponto de vista da direita feudal, a ascensão social dos judeus é a prova inconteste da decadência ocidental da sociedade capitalista, responsável pela extirpação dos valores aristocráticos.

(*) A expressão anti-semita ou anti-semitismo foi cunhada em 1873  por Wilhelm Marr, um escritor alemão, autor do O caminho da  vitória do Germanismo sobre o Judaísmo que teve larga difusão por todo o país.

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Facilmente verifica-se que a formação do pensamento político de Hitler deitava raízes firmes no passado recente europeu, nas novas doutrinas anti-democráticas e anti-socialistas que não paravam de emergir num cenário de rivalidade intensa entre as potências e de expansão do domínio do homem branco sobre o restante do planeta. Doutrinas que eram aceitas e difundidas por intelectuais respeitáveis.

Natural que, depois da Segunda Guerra Mundial, desejassem apresentá-lo como uma aberração, uma exceção, como se não houvesse racismo nos Estados Unidos, ou que a política de eugenia (a seleção dos racialmente melhores) fosse praticada somente na Alemanha nazista, quando ela era praxe em muitos países europeus (na Suíça e na Escandinávia) e mesmo em 25 estados da América do Norte. O que não exime em nenhum momento da responsabilidade de Hitler tê-las adotado como política do estado alemão, com terríveis consequências para a humanidade.  

Bibliografia

Fischer, Klaus P.-  Nazi Germany: A New History (1995).

Friedlander, Saul -  Nazi Germany and the Jews (1997). 

Kershaw, Yan – Hitler, 1889-1933,  Hubris,(2001)

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Maltitz, Horst von -  The Evolution of Hitler's Germany (1973);

Milfull, John (editor) - Why Germany: National Socialist Anti-Semitism and the European Context (1993);  

Seltzer, Robert M. Jewish People, Jewish Thought: The Jewish Experience in History (1980);

Tuchman, Barbara – A Torre do Orgulho (1966).

Fonte: Especial para o Terra
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