O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu em sessão nesta terça-feira o poder de investigação criminal do Ministério Público (MP). Os ministros chegaram a este entendimento ao indeferir, por votação unânime, o pedido de habeas-corpus do agente da Polícia Civil do Distrito Federal Emanoel Loureiro Ferreira, condenado pelo crime de tortura, que pleiteava a anulação do processo desde seu início, alegando que ele fora baseado exclusivamente em investigação criminal conduzida pelo MP.
De acordo com os ministros do STF, o MP tem competência para realizar, por sua iniciativa e sob sua presidência, investigação criminal para formar sua convicção sobre determinado crime, desde que respeitadas as garantias constitucionais asseguradas a qualquer investigado. A polícia não tem o monopólio da investigação criminal, e o inquérito policial pode ser dispensado pelo MP no oferecimento de sua denúncia à Justiça.
Entretanto, o inquérito policial sempre será comandado por um delegado de polícia. Segundo os magistrados, o MP poderá, na investigação policial, requerer investigações, audiência de testemunhas e outras providências em busca da apuração da verdade e da identificação do autor de determinado crime.
O ministro Celso de Mello, relator do processo, ressaltou em seu voto que este poder investigatório do MP é ainda mais necessário em um caso como o de tortura, praticada pela polícia para forçar uma confissão, desrespeitando o mais elementar direito humano. De acordo com Mello, a polícia não costuma colaborar com a investigação daqueles que pertencem aos seus próprios quadros.
"O inquérito policial não se revela imprescindível ao oferecimento da denúncia, podendo o MP deduzir a pretensão punitiva do Estado", afirmou o ministro Celso de Mello, citando precedentes em que o STF também considerou dispensável, para oferecimento da denúncia, o inquérito policial, desde que haja indícios concretos de autoria.
"Na posse de todos os elementos, o MP pode oferecer a denúncia", completou. "O MP tem a plena faculdade de obter elementos de convicção de outras fontes, inclusive procedimento investigativo de sua iniciativa e por ele presidido."
Constitucionalidade
Contrariando a alegação da defesa de que a vedação de o MP conduzir investigação criminal estaria contida no artigo 144, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição, segundo o qual caberia à Polícia Federal (PF) exercer, "com exclusividade, as funções de Polícia Judiciária da União" - o que excluiria o MP -, todos os ministros presentes à sessão seguiram o argumento do relator.
Segundo Celso de Mello, a mencionada "exclusividade" pretende, apenas, distinguir a competência da PF das funções das demais polícias. Foi esse também o entendimento manifestado pelo subprocurador-geral da República, Wagner Gonçalves, presente ao julgamento.
O relator argumentou que o poder investigatório do Ministério Público está claramente definido no artigo 129 da Constituição que, ao definir as funções institucionais do MP, estabelece, em seu inciso I, a de "promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei".
O ministro ressaltou que o poder investigatório do Ministério Público é subsidiário ao da Polícia, mas não exclui a possibilidade de o MP colaborar no próprio inquérito policial, solicitando diligências e medidas que possam ajudá-lo a formar sua convicção sobre determinado crime, como também empreender investigação por sua própria iniciativa e sob seu comando, com este mesmo objetivo.