Como surgiu o Comando Vermelho: das celas da Ilha Grande ao comando do tráfico no Rio

Uma das maiores facções criminosas do Brasil surgiu a partir da interação entre presos políticos e comuns na ditadura

29 out 2025 - 06h59
Resumo
O Comando Vermelho surgiu nas prisões da ditadura militar brasileira, na interação entre presos políticos e comuns, evoluindo de um coletivo assistencial para uma facção criminosa ligada ao tráfico, influenciada por condições carcerárias e pela exploração econômica.
Comando Vermelho proíbe roubos em Belém (PA). Facção de origem carioca domina periferias da capital paraense.
Comando Vermelho proíbe roubos em Belém (PA). Facção de origem carioca domina periferias da capital paraense.
Foto: Reprodução

Alvo da megaoperação da polícia carioca, o Comando Vermelho -- hoje sinônimo de tráfico e poder paralelo no Rio de Janeiro -- tem suas raízes em um momento específico da história brasileira: as prisões do regime militar. Pesquisas acadêmicas e relatórios oficiais convergem para uma origem que mistura convívio forçado entre presos comuns e presos políticos, condições carcerárias degradantes e estratégias coletivas de sobrevivência que evoluíram para organização criminosa.

No final da década de 1970, o Instituto Penal Cândido Mendes, presídio da Ilha Grande, em Angra dos Reis, abrigava detentos considerados perigosos e presos políticos. O contato diário entre grupos com trajetórias distintas -- militantes políticos encarcerados por opor-se ao regime e presos comuns -- favoreceu a circulação de estratégias organizacionais, de disciplina e de resistência, contribuindo para o pertencimento e autogestão.

Publicidade

A primeira configuração conhecida do grupo teve caráter coletivo e, em parte, assistencial. Relatos acadêmicos descrevem a criação de mecanismos internos como um "caixa comum", destinado a financiar fugas, melhorar condições no presídio e amparar familiares, medidas que geraram prestígio e autoridade entre os encarcerados. Esse aspecto de assistência, combinado à imposição de regras internas, ajudou o movimento a consolidar-se como mediador dentro do sistema prisional.

Embora a presença de militantes tenha influenciado técnicas de organização, a facção nasceu na confluência de fatores --violência institucional, ausência de políticas penitenciárias eficazes e a possibilidade de exploração econômica do tráfico.

Entre os fundadores, três nomes se destacam. William da Silva Lima, conhecido como Professor, chegou à Ilha Grande em 1971. "Não havia regras de comportamento naquela época nos presídios. Um preso desrespeitava o outro. Imagina um pai de família sendo violentado, estuprado. Ou um detento que tinha seus pertences roubados, algo que a mãe trazia numa visita para o filho e, quando ela ia embora, outro pegava. A Falange Vermelha veio para criar leis de convivência, um código de conduta, pedir respeito ao preso, isso era necessário", disse ele em entrevista ao Globo, em 2017. Condenado a mais de 95 anos de prisão, William morreu em 2019, em regime aberto.

Outro fundador, José Carlos dos Reis Encina, o Escadinha, começou no crime ainda jovem e ganhou notoriedade por sua fuga espetacular de helicóptero da Ilha Grande, em 31 de dezembro de 1985. Já Rogério Lemgruber, o Bagulhão ou Marechal, organizou assaltos a banco antes de ser preso em 1972 e se tornar um dos pilares da facção.

Publicidade

A transição de um grupo de proteção e autogestão para uma facção com fortes vínculos com o tráfico ocorreu, majoritariamente, na virada para os anos 1980. A expansão do mercado ilegal de drogas nas favelas fluminenses criou oportunidades econômicas que a organização passou a explorar, transformando recursos originalmente destinados à sobrevivência em fonte de poder territorial e logístico fora das prisões. 

Fonte: Portal Terra
Curtiu? Fique por dentro das principais notícias através do nosso ZAP
Inscreva-se