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Formiga: "Por ser negra, lésbica e nordestina, sabia que ia sofrer preconceito então me fortaleci"

Em entrevista para o Terra NÓS, jogadora falou sobre desafios para se tornar uma das melhores jogadoras do mundo

25 jul 2023 - 05h00
(atualizado em 31/7/2023 às 09h28)
Formiga falou ao Terra NÓS sobre desafios para se tornar uma das melhores jogadoras de futebol do mundo
Formiga falou ao Terra NÓS sobre desafios para se tornar uma das melhores jogadoras de futebol do mundo
Foto: Reprodução/Instagram/@oficial_formiga

Até mesmo a pessoa mais distante do futebol brasileiro já ouviu falar na Formiga, jogadora que, ao lado de Marta e Cristiane, escancarou para o país o poder do futebol feminino nas últimas quase três décadas. 

Registrada como Miraildes Maciel Mota, Formiga é a única atleta de futebol no mundo a participar de sete edições consecutivas dos Jogos Olímpicos, de 1996 a 2020, e de todas as Copas femininas, de 1995 a 2019. Ela se aposentou em 2021, aos 43 anos.  

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Meia campista, Formiga nasceu e cresceu no subúrbio de Salvador, onde, escondida dos irmãos mais velhos, ia tentando cumprir o desejo do pai de ter uma das crias como jogador profissional.

"Desde a minha infância aprendi a lutar, a sobreviver por um sonho, por um desejo a realizar, não só meu, mas também do meu pai, que era um cara que sempre gostou de futebol e gostaria que um dos filhos, ou todos os filhos, na verdade, seguisse a carreira", contou ela, em um papo com a redação do Terra NÓS.  

O pai morreu quando Formiga tinha apenas oito meses e, até hoje, ela tem dúvidas se o desejo dele se extendia à ela, única filha. "Às vezes, por ser mulher, não achou que eu que nasceria com o dom. Não cheguei a conhecê-lo, mas sei da história do desejo dele, então isso foi me fortalecendo".

É, inclusive, em um exercício de pensar o que falaria para si mesma na infância que ela mais se emociona. "Eu diria para mim mesma com 8 ou 9 anos: 'Continue! O seu momento vai chegar, você vai conseguir, vai conquistar. Tantas pessoas apontaram dedo por você chutar bola, por você estar no meio de meninos, mas continue firme e forte, que coisas boas virão'", conta abordando a luta para conquistar seu espaço. 

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Formiga lembra ainda que muitos ofendiam sua mãe, dizendo que a genitora não cuidava direito da filha por ela estar nos campinhos jogando bola.

O machismo nosso de cada dia

Revendo a carreira, Formiga é direta: "olha, a gente sofre machismo todo santo dia, infelizmente, no nosso país", dispara lembrando de uma história em particular que a marcou. 

Anos atrás, jogando em um time paulista, ouviu um diretor dizer que mulher de cabelo curto não tinha espaço no seu clube. Incomodada foi até um salão e falou: "passa a um", referindo-se à maquina de cortar cabelo com um dos pentes mais baixos. 

"O cabelereiro não queria, falou 'oxe, seu cabelo está tão bonito, cabelão enrolado, está da hora', mas eu insisti, cortei mesmo", no dia seguinte, o diretor perguntou o que tinha acontecido. Eu respondi que 'tinha tirado o cabelo no salão e deixado para lavar'. Lógico que ele ficou espantado com aquela atitude, mas não se comenta certos tipos de coisas. Eu ter tomado essa atitude foi um recado para ele", confessa orgulhosa. 

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A situação, como tantas outras, acabou servindo como uma lição. "Tudo que passei me fez entender, mesmo um pouco tarde, que eu tinha uma missão aqui na Terra, que é levantar bandeiras, pular barreiras e enfrentar medos", dispara tão rápida quanto com uma bola no pé.

"Por ser negra, lésbica e nordestina, eu sabia que ia sofrer bastante preconceito então me fortaleci e sou muito grata a Miraildes (seu nome de batismo) por ter segurado a barra porque ela deu vida à Formiga e por eu poder, hoje, ser espelho para tantas outras pessoas", celebra. 

Copa 2023

Aposentada, atualmente Formiga é comentarista na Copa do Mundo feminina e não deixou de falar do mundial durante a conversa. "Agora é a hora de continuar a melhora, de continuar a estruturar o futebol feminino aqui no país, principalmente os clubes, de já pensar em melhorar as suas condições, em ter base", aponta. 

"O que a gente está vendo hoje nessa Copa do Mundo, onde seleções pela primeira vez estão surpreendendo, é reflexo de países que abraçam o futebol feminino", completa.

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Formiga lembra a importância dos aportes também financeiros. "Temos que falar também desses patrocínios que estão surgindo para o futebol feminino, para as atletas, situações individuais, que eu acho bacana e geram públicos, né?", diz a jogadora.

Por fim, ela ressalta a valorização e a visibilidade do esporte em todas as mídias, como TV aberta, fechada e YouTube. "Elas permitem que nossa sociedade esteja por dentro do futebol feminino e isso é algo maravilhoso. Que a gente continue seguindo no crescimento da modalidade no nosso país", fala, esperançosa.

Fonte: Redação Nós
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