Doze pessoas formam a primeira turma da Escola de Fotógrafos Cegos, projeto em andamento no Espírito Santo. Entre os alunos está o jornalista, radialista e youtuber Manoel Peçanha Nascimento, 53 anos.
"Eu escolho um local e um objeto. O professor que está me acompanhando desenha, com a ponta dos dedos, nas minhas costas a cena que está na minha frente. Assim eu vou construindo na mente o que quero fotografar", explica ele, que é cego de nascença.
O desenhar nas costas é um dos recursos usados pela equipe de seis professores, entre os quais está a encenadora, cineasta e videoartista Rejane Arruda, que criou a metodologia do projeto.
Descrição e tato
"A gente descreve tudo para eles. Na aula de hoje, estava tentando transmitir o que é uma imagem borrada. Pedi que eles que imaginassem minha mão ocupando diferentes posições no ar, e essas posições se unindo por um traço. Aí expliquei que o diafragma da câmera abre e fecha em velocidade mais lenta", conta Rejane, que já havia trabalhado com cegos em teatro e dublagem.
Para transmitir o conceito de zoom, Rejane providenciou uma moldura de quadro, para representar o quadro da máquina fotográfica, e posicionou, no centro dela, uma echarpe sua toda enrolada, como se fosse um ponto. Daí colocou os alunos para sentirem onde estava o objeto e todo o espaço livre em volta dele. Depois desenrolou a echarpe de maneira a ocupar mais espaço na moldura. Conseguiu assim explicar o conceito de abrir e fechar o zoom.
Aulas teóricas e práticas
O curso da Escola de Fotógrafos Cegos é dividido em oito módulos, com aulas teóricas e práticas. Nessas, eles fotografam na escola com orientação da equipe de professores. Os estudantes também podem levar o equipamento para casa para praticar.
O curso será encerrado com uma exposição de 32 fotografias no Parque Moscoso, em Vitória, em maio de 2023. Patrocinado pela ES Gás, empresa de gás do Espírito Santos, o projeto obteve financiamento via Lei de Incentivo à Cultura Capixaba.
Foto de passarinho
Manoel já tem duas ideias de fotos que quer fazer até o final do curso. Fotografar enquanto anda de bicicleta (sim, ele aprendeu escondido do pai, depois de alguns tombos) e registrar um passarinho no quintal da sua casa, com quem se comunica via assobios (no dia desta entrevista, feita por telefone, a repórter pôde ouvir a ave respondendo a um assobio do radialista).
"Eu vou conseguir tirar foto dele. Esse é meu objetivo. Quando isso vai acontecer? Não estou preocupado com isso. Quando você faz algo que ninguém fez, você está criando", finaliza ele.