Como apresentadora da Globo usou jornalismo para combater feminicídio: 'Falta educar homens para não agredirem'

Ana Paula Araújo também falou ao Terra sobre participação na Flipetrópolis e seu momento no 'Bom Dia Brasil'

26 nov 2025 - 04h59
'A lei dá o norte, ela não faz tudo', diz Ana Paula Araújo sobre combate à violência contra a mulher
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A jornalista Ana Paula Araújo vem se dedicando, nos últimos anos, não somente ao jornalismo e virou voz importante no combate à violência contra a mulher. A apresentadora do Bom Dia Brasil, da TV Globo, avalia que, por mais que o Brasil tenha visto avanços institucionais bastante relevantes — como a Lei Maria da Penha, que dificulta a retirada de denúncias por pressão ou ameaça de agressores —, a principal barreira que impede a segurança feminina continua sendo cultural.

"Ainda há uma cultura que normaliza as agressões contra as mulheres, que acha que é assim mesmo, que isso faz parte, que é desse jeito. Uma cultura machista em que todos nós somos criados relativizando muito a violência contra a mulher", afirma a jornalista ao Terra.

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Ana Paula já vinha observando mais de perto a maneira como episódios de violência moldam a vida das vítimas, tanto com sua atuação no jornalismo como com a literatura. Ao comentar os impactos de seu livro, Abuso: A cultura do estupro no Brasil, de 2020, ela observa que, hoje, existe menos tabu para falar sobre o assunto e um incentivo maior às denúncias. Mesmo com mudanças estruturais lentas, ela comemora transformações individuais: mulheres que, ao lerem suas obras, reconhecem a própria situação de violência e buscam ajuda. Os relatos, segundo ela, renovam sua motivação para continuar escrevendo.

Para Ana Paula, o Festival Literário Internacional de Petrópolis (Flipetrópolis), feira que acontece entre 27 e 30 de novembro de 2025 e conta com uma série de debates, lançamentos de livros e atividades culturais, é um dos espaços ideais para discutir violência contra a mulher com mais proximidade do público. Na próxima sexta-feira, 28, Ana participa da mesa A Voz dos Agredidos: Jornalismo e Literatura como Ferramentas de Conscientização, ao lado do jornalista Jamil Chade e do cientista político e professor Sérgio Abranches. 

Jornalista Ana Paula Araújo participou de Feira Literária de Saquarema este ano; ainda esta semana, ela estará em mesa na Flipetrópolis
Jornalista Ana Paula Araújo participou de Feira Literária de Saquarema este ano; ainda esta semana, ela estará em mesa na Flipetrópolis
Foto: Reprodução/Instagram @appaaraujo

"Acho que os debates têm essa função de fazer a gente olhar para aquilo que está ali presente e que, às vezes, a gente não dá a devida importância, ou não sabe muito como lidar. Às vezes, não sabe nem identificar", avalia.

Mais recentemente, em junho deste ano, a apresentadora do Bom Dia Brasil também lançou Agressão: A escalada da violência doméstica no Brasil pela Globo Livros. Na obra, ela aprofunda temas que acompanha há anos no jornalismo diário e traz depoimentos de vítimas, análises de especialistas, investigações sobre casos emblemáticos e um retrato da violência que segue crescendo no país. 

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"De modo geral, eu sou otimista. Vejo mulheres cada vez mais se informando, tentando sair dessas prisões que muitas vezes deixam uma mulher mantida em situações de violência. Mas, sem dúvida, ainda temos muito a avançar. Eu vejo as mulheres mais conscientes e cobrando um pouco mais esse mínimo de respeito ao qual todos nós temos direito. Mas eu ainda vejo casas em que as famílias criam seus filhos de maneiras muito machistas", afirma Ana Paula. 

Ana Paula Araújo se divide entre autora e jornalista, no 'Bom Dia Brasil'
Foto: Reprodução/Instagram @appaaraujo

Para a mudança comportamental se concretizar de fato, a jornalista aponta a importância da participação masculina, além da também necessidade de formar melhor profissionais como policiais, psicólogos, médicos e assistentes sociais para lidar com mulheres vítimas de violência.

"Está faltando educar os homens para eles não agredirem, para eles não praticarem essas violências, especialmente contra alguém com quem eles têm uma relação de afeto. Geralmente, ali é o marido, é o companheiro, o namorado, ou o ex-companheiro. Um momento de muito perigo para as mulheres é o momento do término dessa relação violenta", avalia.

Ela afirma, ainda, que o trabalho na frente e atrás das câmeras do Bom Dia Brasil a influencia diretamente a dar voz ao combate à violência contra a mulher. Ao lidar com notícias de violência diariamente, Ana Paula tenta orientar a equipe do telejornal sobre os cuidados na abordagem jornalística, humanizando histórias e evitando expressões que reforcem a culpabilização da vítima. 

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A linguagem importa, para Ana: trocar "mulher é agredida" por "homem agride" é uma forma de devolver o foco à ação do agressor. "São pequenas coisas que passam muito essa ideia (machista)".

Ana Paula Araújo aposta em participação em feiras literárias para aproximar público de discussões sobre violência contra a mulhker
Foto: Reprodução/Instagram @appaaraujo

"Eu tenho uma equipe incrível, incrível mesmo, com quem eu gosto muito de trabalhar, ainda bem, porque é uma troca diária e a gente passa ali aquelas situações de redação sempre muito juntos", continua Ana Paula, titular do telejornal matutino desde 2013. 

Questionada sobre como enxerga as mudanças recentes no jornalismo da Globo e se tem vontade de assumir novos projetos na emissora, como foi o caso de William Bonner, que deixou o Jornal Nacional no início de novembro, ela se mostra animada com desafios e contente com o carinho do público que a assiste.

"Eu estou muito feliz, eu tenho um espaço privilegiado de estar ali todos os dias, de segunda a sexta, com uma hora de jornal em que o brasileiro começa as manhãs com a gente. Já vem lá do Hora 1, do jornal local, e vem o Bom Dia Brasil. Depois já entrego para os programas da manhã, da Patrícia Poeta, da Ana Maria Braga. Acho que está bem consolidada essa parceria", diz.

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"O que eu tenho de projeto para o ano que vem é mais um livro que eu vou começar. Ainda não posso dizer o tema, mas vai ser nessa mesma linha e já começo a pesquisar no que vem. É um pouco difícil conciliar as duas coisas (a rotina de TV e a literatura)", revela.

Também para o próximo ano, Ana Paula não esconde a ansiedade com a cobertura da Globo para o carnaval — ainda mais com as histórias divertidas e espontâneas que a data costuma trazer, além da descontração marcante da época, necessária para encarar o restante do ano repleto de trabalhos.

"Já me aconteceu de tudo. Já fui até engolida por uma alegoria quando estava no estúdio Globeleza. Na época, eu ficava ali na apoteose, bem no fim do desfile, tinha um estúdio de vidro, em que eu ficava entrevistando as pessoas entre um desfile e outro. Aí tinha uma comissão de frente da Mocidade, se eu não me engano, que tinha um acrobata com uma sanfona enorme, uma minhoca, uma mistura de sanfona com minhoca. Quando eu fui tentar falar com o acrobata que estava ali dentro, ele me engoliu com aquilo, isso ao vivo. Então eu me divirto demais no carnaval. É um momento que a gente consegue relaxar, todo mundo se une, vamos dar uma retomada no fôlego para o ano. E é uma arte linda", finaliza a jornalista.

Flipetrópolis 

O Festival Literário Internacional de Petrópolis (Flipetrópolis) do qual Ana Paula participa nesta sexta está na sua segunda edição e vai de 27 a 30 de novembro. Neste ano, o autor homenageado é o romancista Antônio Torres, membro da Academia Brasileira de Letras e da Academia Petropolitana de Letras. Os destaques do evento incluem a entrega do Prêmio Juca Pato de Intelectual do Ano para Sueli Carneiro, referência fundamental do pensamento contemporâneo e autora do livro Lélia Gonzalez: Um Retrato

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Fonte: Portal Terra
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