'Brasil vive democracia para ricos', diz 1ª negra pré-candidata a presidente em 2022

Em entrevista, Vera Lúcia faz um contraponto aos dois nomes que lideram as pesquisas de intenção de voto ao criticar os desmontes de direitos sociais no governo de Jair Bolsonaro (PL) e a falta de reformas estruturantes nas gestões de Lula (PT)

8 abr 2022 - 18h04
(atualizado em 11/4/2022 às 09h16)
Mulher negra, Vera Lúcia pretende concorrer à Presidência
Mulher negra, Vera Lúcia pretende concorrer à Presidência
Foto: Imagem: Romerito Pontes/Divulgação / Alma Preta

Vera Lúcia Salgado, do PSTU, é a primeira mulher negra confirmada por um partido como pré-candidata à Presidência para as eleições de 2022. Ela também disputou o pleito em 2018 e concorreu à Prefeitura de São Paulo em 2020.

Atualmente com 54 anos, a pré-candidata nasceu em Inajá, cidade do interior de Pernambuco. Depois de trabalhar como faxineira, garçonete e operária em uma fábrica de calçados  - período em que iniciou na militância política e sindical, Vera Lúcia estudou e se formou em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Sergipe (UFS).

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Para o Brasil, ela propõe uma mudança radical no modelo político e o protagonismo da luta antirracismo. Aumento de salários e redução da jornada de trabalho estão entre suas promessas de campanha.

Vera Lúcia também faz um contraponto aos dois nomes que lideram as pesquisas de intenção de voto ao criticar os desmontes de direitos sociais no governo de Jair Bolsonaro (PL) e a falta de reformas estruturantes nas gestões de Lula (PT). Confira a entrevista:

Alma Preta Jornalismo: Quais mudanças a senhora propõe nos ministérios do atual governo?

Vera Lúcia: É preciso sempre dizer que o Estado é organizado para garantir os interesses da burguesia. Essa é a razão de ser do Executivo, do Judiciário e do Legislativo. A composição dos ministérios em todos os governos brasileiros até agora obedeceram os interesses do grande empresariado, dos latifundiários e do imperialismo.

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Por isso, colocam no comando do Ministério da Educação inimigos da Educação Pública; colocam no Ministério da Saúde representantes dos planos privados de saúde etc. Nós queremos romper com tudo isso e construir um governo dos trabalhadores apoiado em Conselhos Populares, com representantes da nossa classe que democraticamente decidirão e executarão as medidas em prol dos trabalhadores e do povo pobre.

Você nomearia negros e mulheres para os seus ministérios e para o primeiro escalão do governo?

Nós do PSTU somos o partido que há muitos anos apresenta o maior número de candidaturas negras e femininas nas eleições. Em 2018, eu tive a satisfação de compor, com Hertz Dias de vice, a primeira chapa presidencial 100% negra na história das eleições deste país. Para nós, isso é parte da luta que travamos contra o racismo e contra o machismo que reina em nosso país.

Como a pessoa que ocupa o cargo de presidente do país pode combater o racismo?

A luta contra o racismo é parte indissociável do programa e da história do PSTU. A maior parte da população brasileira é negra e somos nós, negros e negras, as maiores vítimas do desemprego, fome e da violência. Isso é um legado de quatro séculos de escravidão e do capitalismo, sistema econômico responsável pela escravização de nossos antepassados e que ainda segue de pé se aproveitando do racismo para nos dividir e super explorar.

Nós queremos atacar todos esses males que se abatem sobre a nossa classe e o nosso povo, e defenderemos um conjunto de políticas de reparações aos negros que respondam às necessidades imediatas e às demandas históricas do povo negro deste país, tais como a defesa de salário igual para todos os trabalhadores, defesa e ampliação de cotas étnico-raciais em todos os concursos públicos, derrubada da Lei Antidrogas de 2006 aprovada por Lula, titulação de terras quilombolas, reforma urbana e agrária e desmilitarização das polícias militares.

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Em um cenário de crise como o atual, na sua avaliação quais as mudanças mais urgentes?

Não há nada mais urgente hoje do que acabar com a fome e o desemprego em nosso país. Dois males que se abatem vorazmente sobre a nossa classe e o povo negro e pobre. Por isso defenderemos um Plano de Obras Públicas e um conjunto de medidas econômicas que garantam emprego e renda para a nossa classe. Ao contrário de Lula e do PT, que diziam que governavam para todos, enquanto na verdade governavam para os ricos e poderosos, nós dizemos claramente que nosso governo tem apenas um lado: o dos trabalhadores. Mostraremos na prática que um governo apoiado em Conselhos Populares dos trabalhadores é muito superior e muito mais democrático do que essa democracia dos ricos que hoje vigora em nosso país.

Quais as principais metas e programas do seu governo?

A principal meta é governar para a classe trabalhadora. Por isso, queremos acabar com o desemprego, com a precarização do trabalho e aumentar os salários. Nós propomos reverter a lógica capitalista. A sociedade deve estar organizada para garantir aos trabalhadores boas condições para comer, vestir, morar, ter saúde e educação gratuitos e de qualidade e uma vida cultural livre e rica. Para isso, o primeiro ponto é garantir empregos e salários decentes para todos os trabalhadores. É preciso atacar a propriedade e o lucro das grandes empresas.

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Quais as propostas para a econômica e recuperação do emprego?

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O Brasil está sendo recolonizado, agora, pelo imperialismo estadunidense e europeu. E falamos em recolonização porque literalmente estamos nos tornando uma colônia que produz e exporta matérias-primas para os países ricos e para a China e compra suas mercadorias industrializadas a preços exorbitantes. Nosso país está se desindustrializando e se tornando um vasto campo de produção de commodities que exaurem nosso solo, secam nossos aquíferos e destroem nossa flora e nossa fauna às custas do enriquecimento de um punhado de agro empresários.

Nós precisamos romper com essa subordinação estrangeira e atacar também os privilégios e as grandes propriedades dos meios de produção que estão nas mãos da burguesia. Para gerar emprego para todos os trabalhadores faremos um grande plano de obras públicas para construir casas populares (e assim suprir o grande déficit habitacional), saneamento básico, hospitais, escolas, creches, espaços culturais, estradas e metrôs. Reduziremos a jornada de trabalho no país para seis horas diárias, sem redução de salários.

Com essa redução na jornada, poderemos absorver um maior número de trabalhadores em postos de trabalho. Além disso, implementaremos um auxílio emergencial de um salário mínimo para todos os desempregados como uma medida transitória enquanto o Plano de Obras Públicas não empregue a todos.

Você implantaria ações afirmativas para reparar a população negra brasileira?

Nós implementaremos um conjunto de políticas de reparações históricas aos negros e negras deste país. O Brasil aboliu a escravidão sem nenhuma política de reparações aos nossos antepassados e isso explica muito a desigualdade social e racial em nosso país. E, infelizmente, boa parte do movimento negro em nosso país abandonou as bandeiras das Reparações quando optou por orbitar em torno dos governos petistas e subordinar as necessidades históricas dos negros aos interesses do imperialismo, como vimos na Conferência de Durban, em 2001, que não só retirou de sua declaração a necessidade de reparações aos negros e aos países africanos, como também retirou a exigência de suspensão da dívida externa desses países historicamente pilhados e explorados pelos países imperialistas.

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Nós do PSTU defenderemos a ampliação de cotas étnico-raciais em todos os concursos públicos, mas também atacaremos as estruturas econômicas e jurídicas que dão sustentação ao racismo em nosso país, expropriando a propriedade dos meios de produção que hoje estão em suas mãos. A classe dominante brasileira tem sangue de negros e indígenas em suas mãos. Sua riqueza remonta à escravidão e se perpetua na exploração do nosso povo nas fábricas, canteiros de obras, no comércio e toda sorte de serviços.

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