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Livro alvo de críticas no RS atinge ápice de buscas no Google após ameaças de censura

Uma diretora criticou o que chamou de linguagem de "baixo nível" do livro 'O Avesso da Pele', ganhador de um Prêmio Jabuti

5 mar 2024 - 22h19
(atualizado às 23h45)
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Resumo
O romance 'O Avesso da Pele' alcançou o maior índice de buscas no Google na semana passada, devido a uma controvérsia em volta do livro, provocada por uma diretora de ensino do Rio Grande do Sul que o considerou 'vulgar'. O autor Jeferson Tenório comentou o caso e obteve apoio de personalidades artísticas.
Capa do livro 'O Avesso da Pele', que faz crítica ao racismo no Brasil.
Capa do livro 'O Avesso da Pele', que faz crítica ao racismo no Brasil.
Foto: Reprodução/Companhia das Letras

O romance literário O Avesso da Pele atingiu o seu ápice de buscas no Google na semana passada. O livro foi alvo de críticas por uma diretora da rede de ensino do Rio Grande do Sul, que pediu a sua exclusão do cronograma destinado a alunos do ensino médio por causa de uma suposta linguagem de "baixo nível".

Do autor Jeferson Tenório, a obra foi ganhadora de uma das categorias do Prêmio Jabuti, em 2021, e no ano seguinte foi incluída no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), ainda na gestão Bolsonaro.

O livro foi publicado em 10 de agosto de 2020, mas a maior quantidade de pesquisas sobre a publicação aconteceu no intervalo de 25 de fevereiro a 2 de março deste ano. Segundo o Google Trends, nesta semana, o título aparece com o número 100 ao lado - o que, de acordo com a plataforma, "representa o pico de popularidade de um termo".

O Estado do Rio Grande do Sul, inclusive, é onde a busca pelo livro foi maior, marcando, numa escala de 0 a 100, o maior nível de interesse pelo termo. Em seguida aparecem Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Bahia e Rio de Janeiro. De todas as unidades federativas, apenas o Tocantins não registrou grande aumento de buscas pelo livro.

Gráfico de nível de interesse pelo termo 'O Avesso da Pele' desde a data de lançamento do livro
Gráfico de nível de interesse pelo termo 'O Avesso da Pele' desde a data de lançamento do livro
Foto: Reprodução/Google Trends

Nem mesmo nas semanas seguintes ao Prêmio Jabuti, mais tradicional premiação literária do Brasil, houve tamanho interesse pelo livro. As buscas no cenário nacional marcaram o valor de 40, segundo maior momento de interesse, na semana de 2 a 8 de janeiro de 2022.

Acusação de censura

A diretora da Escola Ernesto Alves, Janaína Venzon, publicou um vídeo criticando o livro O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório, julgando a obra inadequada para estudantes do ensino médio. A publicação gerou grande repercussão, e a diretora foi acusada de censura.

"Lamentável o governo federal, através do MEC [Ministério da Educação] adquirir esta obra literária e enviar para as escolas com vocabulários de tão baixo nível para serem trabalhados com estudantes do ensino médio. Solicito ao Ministério da Educação buscar os 200 exemplares enviados para a escola. Prezamos pela educação dos nossos estudantes e não pela vulgaridade", afirmou a diretora.

Ela ainda acrescentou que os professores não escolheram a obra, tampouco a escola. O MEC, no entanto, nega que as escolas sejam obrigadas a adotar o livro.

Em nota, a pasta afirmou que o PNLD é uma relevante política do Ministério da Educação, com mais de 85 anos de existência e adesão de mais de 95% das redes de ensino do Brasil. A permanência no programa é voluntária, de acordo com a legislação, em atendimento a um dos princípios basilares do PNLD, que é o respeito à autonomia das redes e escolas.

"A aquisição das obras se dá por meio de um chamamento público, de forma isonômica e transparente. Essas obras são avaliadas por professores, mestres e doutores que tenham se inscrito no banco de avaliadores do MEC. Os livros aprovados passam a compor um catálogo no qual as escolas podem escolher, de forma democrática, os materiais que mais se adequam à sua realidade pedagógica, tendo como diretriz o respeito ao pluralismo de concepções pedagógicas", diz a nota enviada pela pasta.

Autor comentou o caso

O autor da obra comentou sobre o vídeo que a diretora publicou. Em nota, Tenório destacou que o livro foi avaliado pelo governo federal em 2021, ainda no governo Bolsonaro, e a própria diretora assinou a ata de escolha do livro.

"O Avesso da pele já foi adotado em centenas de escolas pelo Brasil, venceu o prêmio Jabuti, foi finalistas de outros prêmios, teve direitos de publicação vendidos para mais de 10 países, foi adaptado para o teatro. Além disso, o livro foi avaliado pelo PNLD, em 2021, ainda no governo Bolsonaro. A própria diretora assinou a ata de escolha do livro. As distorções e fake news são estratégias de uma extrema direita que promove a desinformação. O mais curioso é que as palavras de 'baixo calão' e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras", disse Jeferson Tenório, autor de 'O Avesso da Pele'.

Em suas redes sociais, a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz criticou o que a diretora afirmou com relação à obra e recebeu o apoio de personalidades como Patricia Pillar. A atriz afirmou que recolher os livros era "algo absurdo".

Companhia das Letras emitiu nota de repúdio

A Companhia das Letras, editora que publicou o livro O Avesso da Pele, manifestou indignação diante da repercussão do vídeo feito pela diretora. Em nota, a editora informou que a obra foi aprovada por uma banca de educadores, especialistas e mestres, junto a outros 530 livros.

A editora ainda destacou que, para chegar ao colégio, a obra precisou passar por aprovação da própria diretora, que assinou o documento de "ata de escolha" do livro e agora contesta seu conteúdo do livro. "Esses dados são transparentes e públicos", disse em nota.

"Como consequência, a 6ª Corregedoria Regional de Educação mandou recolher a obra das escolas até uma resposta do governo federal. [...] A retirada de exemplares de um livro, baseada em uma interpretação distorcida e descontextualizada de trechos isolados, é um ato que viola os princípios fundamentais da educação e da democracia, empobrece o debate cultural e mina a capacidade dos estudantes de desenvolverem pensamento crítico e reflexivo".

A Companhia das Letras ainda afirmou que repudia veementemente qualquer ato de censura que limite o acesso dos estudantes a obras literárias, sob pretexto de protegê-los de conteúdos considerados "inadequados" por opiniões pessoais e leituras de trechos fora de contexto.

"O que se destaca em O Avesso da Pele não é uma cena, tampouco a linguagem, mas sim a contundente denúncia do racismo que se imiscui em todas as nossas relações, até as mais íntimas", conclui o texto emitido pela editora.

O que diz a Seduc do Rio Grande do Sul

Em nota enviada ao Terra, a Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande do Sul informou que não orientou que a obra O Avesso da Pele, integrante do PNLD do Ministério da Educação, fosse retirada de bibliotecas da rede estadual de ensino. Ainda segundo a pasta, a 6ª Coordenadoria Regional de Educação seguirá a orientação da secretaria e providenciar que as escolas da região usem adequadamente as obras.

Fonte: Redação Terra
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