A lição de Tony Bennett: como a alimentação e o estilo de vida podem proteger a memória e o cérebro
Especialista comenta que o segredo para envelhecer com lucidez está na combinação entre boa alimentação, sono reparador e equilíbrio emocional
Mesmo diagnosticado com Alzheimer, o cantor norte-americano Tony Bennett (falecido em 2023) manteve a lucidez emocional e o vínculo com a música até seus últimos shows. O caso chamou atenção do mundo e levantou uma pergunta essencial: até que ponto hábitos saudáveis, como alimentação equilibrada, sono de qualidade e estímulos cognitivos podem retardar o envelhecimento cerebral e preservar a memória?
Segundo Afonso Salgado, especialista em saúde integrativa e medicina do envelhecimento, os macronutrientes (proteínas, carboidratos e lipídios) formam a base do equilíbrio metabólico que sustenta a memória e o processamento cognitivo. Já os micronutrientes, como minerais e vitaminas, têm funções específicas na neuroproteção e na plasticidade cerebral. Ele aponta que o ômega-3, presente em peixes e castanhas, é um importante aliado da memória. "Os ácidos graxos DHA e EPA fortalecem as membranas neuronais, facilitam a sinapse e melhoram a velocidade de processamento do cérebro", diz.
Outros alimentos destacados pelo especialista são as oleaginosas e os polifenóis, encontrados em nozes, amêndoas e sementes, que reduzem a inflamação e combatem o estresse oxidativo. Já os ovos se sobressaem pelo teor de colina, nutriente essencial para a produção de acetilcolina, que é o neurotransmissor da memória. Os carotenoides, como o licopeno do tomate e o betacaroteno da cenoura e da abóbora, também "desenferrujam" o cérebro, reduzindo inflamações e prevenindo danos oxidativos. "Além disso, óleos vegetais ricos em polifenóis, como o azeite de oliva e o óleo de abacate, ajudam a reduzir o acúmulo de beta-amiloide, proteína associada ao Alzheimer", acrescenta.
O chá verde e o café, quando consumidos com moderação, melhoram a atenção graças à combinação de L-teanina e cafeína. A cúrcuma, por sua vez, atravessa a barreira hematoencefálica e estimula o BDNF, fator neurotrófico que melhora a memória e o humor. Como lembra Afonso, a água é um elemento que costuma ser esquecido. "A desidratação é uma das principais causas de queda de atenção e falhas de memória em idosos. Por isso, é importante manter boa hidratação e consumir alimentos ricos em água, como frutas e vegetais frescos", ressalta.
O que envelhece o cérebro?
O grande vilão é o padrão alimentar inflamatório, típico da dieta moderna. O especialista alerta que fast foods, alimentos ultraprocessados, açúcares e embutidos são extremamente prejudiciais ao cérebro. De acordo com ele, esses alimentos aumentam a glicemia e os índices oxidativos, provocando o chamado "enferrujamento" do corpo. O resultado é a síndrome metabólica, caracterizada por hipertensão, diabetes tipo 2 e alterações nos níveis de gordura no sangue (fatores que comprometem diretamente o tecido cerebral).
Outro erro comum é a monotonia alimentar. "Comer sempre os mesmos alimentos, sem variedade de cores e nutrientes, empobrece o prato e o cérebro. A diversidade é um dos segredos da longevidade cognitiva", afirma.
Sono, exercício e equilíbrio emocional são os outros pilares da mente saudável
Além da nutrição, sono e atividade física são pilares fundamentais da saúde cerebral. O especialista esclarece que durante o sono, principalmente nas fases REM e profunda, o cérebro consolida memórias e processa informações. Portanto, dormir mal acelera o declínio cognitivo e aumenta o risco cardíaco.
A prática regular de exercícios físicos tem impacto direto sobre a memória. Afonso pontua que atividades aeróbicas e musculação combinadas podem aumentar em até cinco vezes o volume do hipocampo, região responsável pela memória.
O equilíbrio emocional é outro fator decisivo, pois o estresse eleva o cortisol e provoca inflamação cerebral. "Controlar emoções, reduzir sobrecargas e manter uma rotina mais leve são medidas que preservam o cérebro tanto quanto uma boa dieta", salienta. O especialista também pondera que é primordial manter o equilíbrio hormonal, especialmente na menopausa e na andropausa, pois ajuda na vitalidade cerebral e retarda o envelhecimento cognitivo.
Dietas e estratégias de proteção cerebral
Dentre os padrões alimentares mais benéficos, Afonso cita a dieta mediterrânea e a dieta anti-inflamatória, ambas ricas em frutas, verduras, azeite, peixes e grãos integrais. Elas oferecem alta densidade nutricional, polifenóis, antioxidantes e ômega-3, substâncias que reduzem a inflamação e protegem as células cerebrais. Ademais, como chama atenção o especialista, o jejum intermitente, quando bem-orientado, pode trazer benefícios, estimulando mecanismos de regeneração celular.
Fatores ambientais e cognitivos
Conforme Afonso, o estresse, a poluição, a falta de sono e o sedentarismo estão entre os principais inimigos do cérebro. Ele observa que a poluição (atmosférica, sonora, eletromagnética e até alimentar) contribui para o acúmulo de toxinas e desequilíbrios hormonais. Já o excesso de telas e a falta de estímulo cognitivo prejudicam a plasticidade cerebral. "Ler, aprender coisas novas e manter a curiosidade viva são exercícios poderosos para o cérebro. O estímulo cognitivo é uma das melhores formas de prevenir o declínio da memória", reforça.
Terapias integrativas e medicina preventiva
O especialista explica que algumas abordagens da saúde integrativa podem complementar os cuidados com o cérebro. A naturopatia, por exemplo, quando associada a uma boa alimentação, sono de qualidade e exercícios, é uma ferramenta valiosa na prevenção do declínio cognitivo. Além dessa, Afonso enfatiza que existem terapias com comprovação científica, como a fotobiomodulação transcraniana — aplicação de luz em áreas específicas do cérebro — e a neuromodulação do nervo vago, que melhora a função neuronal e o equilíbrio emocional.
Para pessoas com histórico familiar de demência, Afonso recomenda acompanhamento regular com neurologista, exames de imagem e testes genéticos, porque as doenças neurodegenerativas se instalam de forma lenta e silenciosa. Por isso, a prevenção é o caminho mais eficaz.
Contudo, o especialista acredita que rejuvenescer o cérebro é possível. "Quando cuidamos do sono, da alimentação, do corpo e da mente, ativamos mecanismos de regeneração que retardam o envelhecimento", conclui.
Especialista
Afonso Salgado é referência em saúde integrativa, unindo ciência e práticas complementares em uma abordagem inovadora e humanizada. Formado em Fisioterapia, Nutrição e Osteopatia, possui especialização pela International Waterlily & Water Gardening Society (França). Ele é mestre em Medicina pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), doutor em Engenharia Biomédica pela Universidade Camilo Castelo Branco (Unicastelo-SP) e pós-doutor em Neurociência pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul).
Autor de cinco livros e coautor da obra Photobiomodulation in the Brain, em parceria com pesquisadores da Harvard University, nos Estados Unidos. Professor de mestrado na Florida Christian University, atua também em terapia manual, medicina funcional, naturopatia e osteopatia. É PHD Alternative Medical Practitioner e Holistic Health Practitioner, além de membro do Institute of Functional Medicine.