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Doação privada garante mais 1,2 mil hectare de Mata Atlântica em parque estadual de SP

Área equivale a 1.500 campos de futebol; antigo proprietário obteve em troca créditos para compensação de reserva legal

9 jun 2022 - 10h10
(atualizado às 10h23)
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SOROCABA - A doação feita por um proprietário privado para obtenção de cotas de reserva legal está permitindo um acréscimo de 1,2 mil hectare, área equivalente a 1.500 campos de futebol, a uma das mais preservadas unidades de conservação da Mata Atlântica no Estado de São Paulo. O governo paulista acaba de incorporar a Fazenda Ribeirão da Serra ao Parque Estadual Carlos Botelho, que se estende de São Miguel Arcanjo, no sudoeste paulista, a Sete Barras, no Vale do Ribeira. Com o acréscimo da nova área, o parque passa a ter 38,8 mil hectares de mata com alto grau de preservação.

O ganho ambiental acontece em um momento em que se anuncia que a Mata Atlântica, um dos ecossistemas mais ameaçados do planeta, perdeu o equivalente a 20 mil campos de futebol entre 2020 e 2021. Um total de 21,6 mil hectares da floresta sucumbiu, o que representa crescimento de 66% no desmatamento do bioma quando comparado com o registrado entre 2019 e 2020, segundo dados do Atlas da Mata Atlântica. Análise anual da Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostra que em 15 dos 17 Estados que compõem o bioma houve aumento no desmatamento.

Matas preservadas e rios da fazenda Ribeirão da Serra estão sendo incorporadas ao Parque Estadual  Carlos Botelho, entre São Miguel Arcanjo e Sete Barras, no interior de São Paulo
Matas preservadas e rios da fazenda Ribeirão da Serra estão sendo incorporadas ao Parque Estadual Carlos Botelho, entre São Miguel Arcanjo e Sete Barras, no interior de São Paulo
Foto: Sima / Divulgação / Estadão

O acréscimo da fazenda ao parque foi feito por decreto do governo estadual publicado na terça-feira, 7. A doação foi realizada sem custo para os cofres estaduais, com base no Código Florestal do Brasil, que permite gerar créditos para compensação de reserva legal mediante a cessão de áreas no entorno de unidades de conservação. Ou seja, ao fazer a cessão ao Estado, o dono da área fica com créditos para compensar em propriedades de terceiros que precisam ampliar as reservas legais. "Este é um mecanismo inovador, que nos dá capacidade de criar ou aumentar unidades de conservação com a situação fundiária resolvida, sem nenhum custo para o Estado. É um precedente importante para a conservação da biodiversidade", disse o secretário Fernando Chucre, de Infraestrutura e Meio Ambiente.

Ciclo sustentável

O projeto de preservação da Fazenda Ribeirão da Serra começou quando o engenheiro agrônomo José Augusto de Souza se aposentou do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e deu início ao sonho de prestar serviços que conseguissem alinhar os lados econômicos, sociais e ambientais. Em 1997, ele criou a empresa Mata Nativa do Brasil que, em um primeiro momento, produzia mudas de essências nativas para pequenos reflorestamentos em áreas de preservação permanente de Ribeirão Preto, no interior paulista.

Nos anos seguintes, a empresa passou também a dar consultoria em licenciamentos ambientais. Em 2009, com a entrada em vigor da nova legislação de compensação ambiental, a empresa passou a atuar em projetos compensatórios focados na Mata Atlântica. Com a promulgação da lei do Código Florestal em 2012, a empresa adquiriu a fazenda contígua ao Parque Carlos Botelho, já com a intenção de preservar a área e fazer a doação ao Estado, obtendo créditos para investir em reservas nas propriedades de terceiros. Com isso, a empresa fechou o ciclo de um procedimento sustentável.

No Estado de São Paulo, a legislação estabelece que, para ampliar uma unidade de conservação já instituída, é preciso seguir o mesmo rito da criação da unidade. O processo, que envolveu todos os órgãos técnicos da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, teve o formato jurídico inédito concebido pela Procuradoria-Geral do Estado. O trabalho envolveu levantamento de avifauna, realizado por equipes técnicas da secretaria, com apoio de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), câmpus de Sorocaba, e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), câmpus de Registro.

Das 79 espécies de mamíferos registradas no parque, 12 foram encontradas na fazenda, entre elas de animais ameaçados, como onça-pintada, anta, cachorro-do-mato e tatu-galinha. Já das 197 espécies de aves registradas recentemente no Carlos Botelho, 99 foram avistadas também na fazenda, como o tucano-do-bico-preto, o macuco, a jacutinga e o gavião-pega-macaco. Na flora, o destaque é a boa quantidade de palmeiras juçaras - árvore que produz o palmito, por isso está ameaçada de extinção -, além de orquídeas e bromélias raras. A fazenda é cortada pelo Ribeirão da Serra, seu mais importante manancial.

São Paulo possui 4 milhões de hectares de áreas estaduais protegidas em 119 Unidades de Conservação que preservam a fauna e a flora da Mata Atlântica e do Cerrado. Destas, o Parque Estadual Carlos Botelho é uma das mais relevantes, tanto pelo bom estado de conservação da Mata Atlântica, quanto pela diversidade da flora e fauna. É o principal refúgio do macaco muriqui, ou mono-carvoeiro, no Estado. Aberto à visitação com monitores, o parque é cortado por uma estrada-parque de 33 km, calçada com bloquetes de cimento, com passagens de fauna e velocidade controlada.

A unidade se conecta a outros parques estaduais, como o Intervales, o Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira e outras reservas ecológicas, formando a maior área contínua de Mata Atlântica do Brasil.O maciço faz parte da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, reconhecida como Sítio do Patrimônio Natural Mundial pela Unesco. O Estado de São Paulo possui também mais de 100 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs).

Estadão
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