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Equipe Mercedes: um império à beira do abismo na Fórmula 1

Mercedes corre o risco de perder sua hegemonia na F1. Seus dois pilares, Toto Wolff e Lewis Hamilton, ainda não têm contrato para 2021

4 nov 2020 - 06h00
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Sete títulos mundiais de construtores: nunca houve uma equipe que venceu tanto dessa forma.
Sete títulos mundiais de construtores: nunca houve uma equipe que venceu tanto dessa forma.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

A equipe Mercedes acaba de conquistar seu sétimo título consecutivo do campeonato mundial de construtores. É o coroamento de um projeto que estabelece a escuderia alemã como a mais bem sucedida de toda a história da Fórmula 1. Na próxima corrida, no dia 15 deste mês de novembro, Lewis Hamilton tem tudo para se sagrar o segundo heptacampeão, igualando o recorde de Michael Schumacher. Mesmo assim, o ambiente em Stuttgart é tenso – não se pode dizer que tudo vai bem.

Os dois pilares desta sucessão de triunfos são o chefe da equipe Toto Wolff, que hoje se ombreia a chefes de equipe mitológicos como Ron Dennis e Frank Williams, e Lewis Hamilton, estatisticamente o melhor piloto de todos os tempos. Em pleno mês de novembro, eles ainda não renovaram seus contratos, que se encerram no dia 31 de dezembro. Não à toa, teme-se pelo que pode ser o fim do império da Mercedes na categoria mais importante do automobilismo mundial.

Lewis Hamilton; por trás do supercampeão, a estrela da Mercdes-Benz.
Lewis Hamilton; por trás do supercampeão, a estrela da Mercdes-Benz.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

Não que seja novidade. Já se comentava às claras a estranheza de Hamilton e Mercedes não terem ainda definido o futuro imediato faltando dois meses para o fim do ano. E Toto Wolff comentava com frequência que a hora de dedicar mais tempo à família chegou. E que estaria sentindo o desgaste de estar presente a todas corridas desde 2012, ano em que se tornou diretor executivo da equipe Williams, da qual era acionista desde 2009.

Mas a luz vermelha se acendeu durante a entrevista à imprensa após o Grande Prêmio de Emilia Romagna, em Imola, no último domingo. Perguntado sobre a função que Toto Wolff exerceria na equipe no próximo ano, Hamilton soltou a bomba: “Nem sei se estarei aqui no ano que vem, então essa não é uma das minhas preocupações neste momento”. 

Não poderia haver pior notícia para a Mercedes. Juntos, Toto Wolff e Lewis Hamilton ergueram um império para a gigantesca montadora alemã. Desde 2013, quando eles se juntaram à escuderia, a Mercedes venceu 103 de 135 corridas, conquistou 115 pole positions e 71 voltas mais rápidas. Isso sem contar os sete títulos do campeonato mundial de pilotos, seis para Hamilton (até agora) e um para Nico Rosberg.

Toto Wolff: presença vitoriosa à frente da Mercedes a ponto de influenciar o futuro de Lewis. Hamilton
Toto Wolff: presença vitoriosa à frente da Mercedes a ponto de influenciar o futuro de Lewis. Hamilton
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

Hamilton dispensa apresentações. Com 93 vitórias, é o recordista absoluto da Fórmula 1. Mais do que em números, é nas pistas que seu domínio se evidencia. Vencer quando Hamilton está no mesmo grid é apenas um sonho distante para os adversários.

Torger Christian Wolff, ou mais simplesmente Toto, ao contrário, mantém sua vida tão discreta quanto possível. Aos 48 anos, ele detém 30% das ações da equipe Mercedes e 5% da Williams. Seu patrimônio líquido é estimado em 600 milhões de dólares, algo como três bilhões e meio de reais. Ex-piloto amador de sucesso mediano, ele começou sua empresa de investimentos em 1998, com foco na tecnologia dedicada à internet. 

Lewis Hamilton corre pela Mercedes desde 2013.
Lewis Hamilton corre pela Mercedes desde 2013.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

Hoje, ele é proprietário de uma rede de lojas que comercializam peças para carros de rali, a BRR Rallye Racing, tem 49% da HWA AG, que faz a preparação dos carros da Mercedes no DTM, o prestigioso campeonato alemão de carros de turismo, e dos GT3 que correm nos campeonatos de Grã-Turismo. E ainda mantém equipes na Fórmula 2 e na Fórmula 3 FIA.

Não satisfeito, ele é também responsável pela equipe da Mercedes na Fórmula E (que estreou na última temporada e já obteve uma vitória) e é sócio do finlandês Mika Hakkinen em uma empresa de marketing esportivo que cuida da carreira de diversos pilotos, entre eles Valtteri Bottas, que corre pela Mercedes na F1, e George Russell, da Williams. 

Seu currículo tem particularidades como a de único chefe de equipe a dominar um Grande Prêmio de Fórmula 1 com nada menos de quatro carros. Foi em seu próprio país, a Áustria, em 2014, quando a Mercedes ocupou os dois primeiros lugares, seguida pelos dois Williams. Em 2018, foi campeão de construtores com a Mercedes, de pilotos com Lewis Hamilton, da Fórmula 2 com George Russell, e da Fórmula 3, com Mick Schumacher, que corria com motor Mercedes.  

Toto Wolff na comemoração com Lewis e Valtteri: alicerce da equipe alemã.
Toto Wolff na comemoração com Lewis e Valtteri: alicerce da equipe alemã.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

O que estaria por trás dessa incômoda situação? Ao ser informado da resposta de Hamilton, Wolff saiu pela tangente. Disse que estavam todos muito cansados, aliviados da ansiedade que antecedeu a conquista do sétimo título mundial de construtores, mas não conseguiu esconder o constrangimento.

São várias as teorias que tentam deslindar o imbróglio. A primeira delas veio de Nico Rosberg, profundo conhecedor da equipe por onde foi campeão da Fórmula 1 em 2016 e não menos da personalidade de Hamilton, com quem dividiu escuderias desde os tempos em que os dois se digladiavam nas provas de kart.

Hamilton já conseguiu 93 vitórias na Fórmula 1, todas com motor da Mercedes.
Hamilton já conseguiu 93 vitórias na Fórmula 1, todas com motor da Mercedes.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

Para o ex-piloto e atual comentarista da TV alemã, Hamilton não vai assinar enquanto não ficar claro o novo organograma da equipe. Toto pretende se manter na escuderia, mas quer mudar a função. Está decidido a dar mais tempo aos filhos Benedict, de 14 anos, Rosa, de 12 (do primeiro casamento), e Jack, de 3, da união com a ex-piloto Susie Wolff, hoje chefe da equipe Venturi, da Fórmula E. 

Seu plano é delegar a chefia a alguém em quem confie – aí parece residir a resistência de Hamilton. Ele quer se certificar de que o novo chefe será alguém com quem poderá manter a relação de grande amizade e confiança absoluta de que desfruta hoje com Toto. O problema é que essa pessoa ainda não está identificada.

Hamilton, 44: até a cor do carro ele conseguiu mudar dentro da Mercedes.
Hamilton, 44: até a cor do carro ele conseguiu mudar dentro da Mercedes.
Foto: Mercedes-AMG / Divulgação

Rosberg vê na recusa de Hamilton de se comprometer o temor de que, sem Toto Wolff, a Mercedes siga a espiral descendente que transformaram gigantes de outras décadas em equipes de medíocres a fracassadas. E cita McLaren e Williams. A primeira quando perdeu Ron Dennis; a segunda, quando Frank Williams deu um passo atrás e entregou as chaves à filha Claire. Ambos se revezaram como dominadores da Fórmula 1 nas décadas de 80 e 90 e nunca tiveram sucessores à altura. 

Das outras hipóteses, há duas que merecem mais credibilidade. Uma diz que Hamilton gostaria de permanecer na escuderia alemã por pelo menos mais dois anos e a Mercedes propõe apenas um; a outra, que ele se sente atraído pela vida ampla que o automobilismo lhe proíbe.

Seja qual for o motivo, a Mercedes sente hoje a pressão da urgência. Sem Toto Wolff como chefe, mas ainda operando nos bastidores, é possível, até provável, que chegue ao oitavo título de construtores. Sem Hamilton, seus carros ainda parecem ter a superioridade que tem lhe dado essa longa hegemonia. Sem um nem outro, o que o destino lhe reservará?

Lewis não sabe se fica para a temporada de 2021: até onde isso é sério?
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Foto: Mercedes-AMG / Divulgação
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