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Suspensão de ajuda humanitária por EUA gera incerteza global

3 fev 2025 - 15h17
(atualizado às 15h39)
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País é o maior provedor de ajuda internacional. Decisão de Trump de congelar repasses e fechar agência ameaça continuidade de projetos na África e Ásia - e põe em risco também iniciativas no Brasil."Foi uma surpresa para a gente", afirma Roshan Pokhrel, secretário do Ministério da Saúde do Nepal. "Nós realmente não esperávamos que todos os programas parassem."

Musk declarou USAID "organização criminosa"
Musk declarou USAID "organização criminosa"
Foto: DW / Deutsche Welle

Pokhrel diz ter sido avisado no fim de janeiro, por telefone, sobre o fim de todos os programas financiados pelos Estados Unidos no Nepal. O corte, segundo ele, afetará principalmente iniciativas de nutrição e saúde materna. "Com certeza é um sinal preocupante para nós."

O novo presidente dos EUA, Donald Trump, baixou em seu primeiro dia no cargo um decreto suspendendo os repasses a projetos de ajuda humanitária no exterior. O congelamento vale por 90 dias, enquanto seu governo avalia se os projetos estão "alinhados" a interesses americanos e tornam o país "mais seguro, mais forte e mais próspero".

No centro da ofensiva está a USAID, agência do governo americano responsável por esses projetos. Centenas de funcionários foram demitidos ou postos em férias compulsórias, e há sinais de uma possível extinção do órgão criado em 1961.

Nesta segunda-feira (03/02), o bilionário Elon Musk, chefe do Departamento de Eficiência Governamental do governo Trump, acusou a USAID de ser uma "organização criminosa" e anunciou seu fechamento: "Não é uma maçã bichada, o que temos é uma bola de bichos. Você tem que, basicamente, jogar fora a coisa inteira. Não dá para consertar."

"América em primeiro lugar"

Conforme a agenda trumpista "America First" (EUA em primeiro lugar), apenas projetos que tornem o país comprovadamente mais seguro e próspero podem receber financiamento.

A secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, acusou o governo anterior, sob Joe Biden, de gastar dinheiro "como marinheiros bêbados", e prometeu que Trump vai gerir melhor as verbas públicas. Segundo ela, o congelamento atende a esse objetivo.

Parceiros estatais e entidades da sociedade civil organizada estão horrorizados e confusos, já que ainda não está claro quais projetos serão afetados no longo prazo. A legalidade do congelamento de verbas pelo governo Trump já foi questionada em tribunais americanos, mas até agora essas queixas não prosperaram.

No fim de janeiro, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, recuou parcialmente, ao isentar do congelamento medidas de ajuda humanitária emergencial "que salvam vidas", como os programas de tratamento de HIV.

Projeto vitamina A para crianças entre os afetados

O Programa Nacional Nepalês de Vitamina A (NVAP) é uma das iniciativas afetadas pelo congelamento de fundos. Ele prevê a administração de vitamina A a mais de 3 milhões de crianças que vivem em áreas de difícil acesso - o país do Sudeste Asiático é atravessado pela cordilheira dos Himalaias.

Estima-se que o programa tenha salvado a vida de 45 mil crianças abaixo dos cinco anos desde a década de 1990. A deficiência de vitamina A pode contribuir para a cegueira, mas também aumenta a suscetibilidade a diarreia e a doenças como o sarampo e a malária.

Outros programas afetados incluem a ajuda a refugiados no norte da Síria, o custeio de próteses para feridos da guerra na Ucrânia e projetos para remoção de minas no Sudão.

Cortes também afetam o Brasil

Algumas medidas ficaram isentas do congelamento, como é o caso da ajuda militar a Israel e ao Egito. Além disso, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, confirmou que seu país segue recebendo verbas americanas.A entrega emergencial de alimentos também não foi afetada.

O cientista político Stephan Klingebiel, do Instituto Alemão para o Desenvolvimento e a Sustentabilidade (Idos), classificou como "massivos" os efeitos do congelamento de ajuda, lembrando que "os Estados Unidos são o maior doador de ajuda externa".

Só em 2023, foram concedidos cerca de 68 bilhões de dólares (R$ 396,9 bilhões). "Se isso tudo de repente é suspenso, então seres humanos estão sendo afetados diretamente." Em 2024, a USAID foi responsável por 42% de toda a ajuda humanitária rastreada pelas Nações Unidas.

Também o Brasil foi afetado pelos cortes. Iniciativas de assistência a refugiados venezuelanos, projetos de fomento à resiliência climática no Nordeste e de assistência econômica a comunidades indígenas do Norte tiveram seus repasses congelados, segundo a imprensa brasileira.

O congelamento de fundos também deve atingir entidades brasileiras que trabalham na preservação do meio ambiente e na defesa de direitos indígenas, desfalcar grupos pró-diversidade, feministas e antirracistas, e prejudicar o combate à desinformação.

"Sentença de morte"

"Estamos num limbo constante", lamenta Nozizwe Ntesang, ativista em Botsuana que trabalha na Legabibo, uma entidade de defesa dos direitos LGBTQ+. "Boa parte do nosso financiamento vem dos EUA, através do Pepfar e de outras agências."

O programa americano de combate à aids Pepfar foi lançado pelo presidente George W. Bush em 2003 e ajudou desde então a salvar cerca de 25 milhões de vidas em todo o mundo mediante a entrega de medicamentos antirretrovirais.

Segundo Ntesang, a Legabibo geralmente distribuía esses medicamentos a 9 mil pacientes por mês. "Hoje foi a primeira vez em anos que não havia ninguém nas clínicas. Há um risco real de saúde quando eles não conseguem acessar o tratamento. Basicamente, é uma sentença de morte."

Segundo Ntesang, a Legabibo procurou o Ministério da Saúde de Botsuana para solicitar a disponibilização de fundos emergenciais.

Oportunidade para a China?

É improvável que governos dos países mais pobres sejam capazes de manter por conta própria os projetos que até então dependiam do apoio americano. E assumir o lugar dos EUA seria difícil mesmo para países ricos como a Alemanha, segunda maior financiadora de projetos do tipo.

"Mesmo se tivesse o dinheiro, a Alemanha não conseguiria dar conta da logística e da infraestrutura num espaço prazo tão curto para compensar", avalia Klingebiel.

O cientista político prevê que essa lacuna pode acabar sendo preenchida no longo prazo pela China. "Países como a China, Rússia e outros adorariam ocupar espaços onde o Ocidente não é tão forte", afirma. "Temos muitas vezes visto isso no continente africano, mas também em outros lugares. Trump está criando novas oportunidades para a China."

O resultado, segundo Klingebiel, seria a perda de influência americana no mundo, já que o fornecimento de ajuda humanitária também era uma forma de influenciar as políticas de outros países para que elas sirvam a seus próprios interesses.

Outros veem nos eventos nos EUA uma chance. "Sejamos autossuficientes", exortou o ex-presidente queniano Uhuru Kenyatta. "Não é seu governo, não é seu país. Ele [Trump] não tem motivos para te dar nada. Você não paga impostos nos EUA. Esse é um chamado à realidade para que você diga: 'Ok, o que vamos fazer para ajudarmos a nós mesmos?'"

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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